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Crítica do filme As Bem Amadas

Como se fora um conto de fadas moderno, que não dispensa os sapatinhos de cristal, Christophe Honoré narra, na comédia dramática As Bem-Amadas (Les Bien-Aimées), a história dos amores e das desventuras de duas mulheres – mãe e filha -, cobrindo o período entre a invasão da Tchecoslováquia pelas forças comunistas e o ataque terrorista às torres gêmeas do World Trade Center de Nova York.
Implícita está no argumento, escrito e dirigido por Honoré, a observação, de ordem moral, de que a juventude de hoje, talvez porque criada sob um excessivo desvelo, se mostra mais vulnerável aos duros embates da vida – procurando, por exemplo, o escapismo da droga ou até mesmo o suicídio – do que a geração sofrida, vinda do pós-guerra ou da Guerra Fria. É como se Honoré, ao longo de seu sermão, advertisse: – Olhem bem o reflexo de que disso se forma!…
Sob esse aspecto, percebe-se que, na primeira fase da película, a linguagem, impulsionada pela força da ilusão do amor, seja viva e espontânea, e as canções de Alex Beaupain, que pontuam as sequências , sejam melódicas, de charme e de encanto, como Prague e Les chiens ne font pas des chats. Além disso, os dois intérpretes – Ludivine Sagnier (Madeleine, jovem) e Radivoje Bukvic ( Jaromil, jovem) – são de aparência vistosa, cantam e atuam com bastante desenvoltura, na linha imposta pela direção.
Na segunda fase, o brilho da narrativa de Honoré já não é o mesmo, pela dramaticidade em que se dá o desenvolvimento da temática, a do desgaste físico e amoroso das criaturas Decrescem nela também o ritmo e o vigor, enquanto a música ganha um tom melancólico, como J´en passerai, Jeunesse se passe ou Je ne peux vivre sans t´aimer. O agravamento vem com a posterior substituição dos intérpretes, quando do envelhecimento das personagens.
Naturalmente, isso poderia ser evitado pelo uso da maquiagem, que opera, nos dias de hoje, verdadeiros milagres na mudança de fisionomias. Mas, se esse recurso fosse posto em prática, não haveria a possibilidade de Catherine Deneuve (Madeleine) contracenar com a filha Chiara Mastroianni (Vera), o que foi o objetivo mais do que claro do filme. Os que chegam em cena, trazendo diferentes estilos de atuação – como o do realizador tcheco Milos Forman (Jaromil ), criador de Amadeus (1984) e de outras obras memoráveis, – não se ajustam ao ideal criativo de Honoré.
A exceção, nesse ponto, talvez seja a do ator americano Paul Schneider (O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford, 2007), que encarna Henderson, um baterista homossexual – mais tarde, soropositivo -, que Vera conhece, na noite londrina, e por ele se apaixona. Que se passa em seguida?… Para superar a falta de ajuste das interpretações, Honoré lança mão de eficiente recurso teatral. Ele reproduz, ao final da película, a cena do passado, quando principiou o romance entre Madeleine e Jaromil, um sedutor médico tcheco, que estava, em Paris, participando de um congresso de Medicina. Com isso, ele traz de volta os dois atores do início.
Anteriormente, em flashback, Honoré mostra que Jaromil, então casado com Madeleine, fora localizado por ela, na noite em que houve a sangrenta ocupação de Praga pelos soviéticos, cometendo adultério. Madeleine se separa dele e volta a Paris, com a filha, ainda criança. Ela conhece François Gouriot (Gillaume Denaiffe), um militar, com quem passa a viver, mas sem deixar de ter encontros esporádicos e fortuitos com Jaromil.
Depois, mais tarde, após a morte da filha, no cemitério de Reims, cidade onde passou a residir, ainda em companhia de François (Michel Delpech), que lhe faz todas as vontades, Madeleine diz para Clément (Louis Garrel), amante de Vera: – O melhor presente que ela lhe deu foi a negativa de se casar com você. Só por isso o seu amor por ela dura até hoje. Nada há que destrua o amor, como a vida em comum!…
Em termos estéticos, o trabalho de Honoré é, como sempre, marcado por sua inegável intenção de aproximar ao máximo a cena dramática da pintura, ou melhor dizendo , da pintura teatral, seguindo, naturalmente a linha de Jacques Démy, impulsionador do musical francês, na década de sessenta.. E ele o faz, dessa vez, pelas magníficas imagens de Rémy Chavrin. Foi Demy quem dirigiu La Deneuve, contracenando com a irmã Françoise Dorléac em Les Demoiselles de Rochefort,( 1967). Mas é de outra obra dele, anterior, também interpretada por Deneuve, que Honoré faz, como tributo, ligeira citação, Os Guarda-chuvas do Amor (1964). Nos créditos finais, Honoré presta ainda homenagem à memória de Marie-France Pisier (Beijos Roubados ,1968), encontrada morta, em abril do ano passado, na piscina de sua residência, em Saint-Cyr-sur-Mer.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasilia, Revista
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www.arteculturanews.com
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FICHA TECNICA
AS BEM-AMADAS
LES BIEN-AIMÉES
França – Reino Unido – República Tcheca/ 2011
Duração – 139 minutos
Direção – Christophe Honoré
Roteiro – Christophe Honoré
Produção – Pascal Cocheteux
Fotografia –Rémy Chavrin
Trilha Musical – Alex Beaupin
Edição – Chantal Hymans
Elenco – Chiara Mastroianni (Vera Passer), Catherine Deneuve (Madeleine) Ludivine Sagnier (Madeleine, jovem), Louis Garrel (Clément), Milos Forman (Jaromil Passer), Paul Schneider (Henderson), Rdivoje Bukvic (Jaromil, jovem), Michel Delpech (François Gouriot), Guillaume Denaiffe (François, jovem), Clara Couste (Vera, adolescente)

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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