Por FC Leite Filho
Num surpreendente decreto, o presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, dissolveu a agência de notícias RIA-Novosti (RIA-Notícias), de capital estatal e com uma equipe de 2.500 jornalistas, com correspondentes em mais de cem países, criando em seu lugar a Rossiva Segódnia (Rússia hoje).
Na verdade, a nova agência, que já tem como diretor Dimitri Kisiliov, de tendência antineoliberal e defensor da política nacionalista de Putin, leva o nome da rede internacional de TV Russian Today, depois simplificada para RT (ou rt.com, como é conhecida na internet). A RT ocupa hoje o primeiro lugar entre as TVs estrangeiras no Youtube, onde se tornou, em 2013, o primeiro canal televisivo de notícias a alcançar um bilhão de acessos, superando inclusive a BBC, de Londres, o segundo nas redes forâneas de cabo.
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Julian Assange, do Wikileaks, entrevista Noam Chomnsky e Tariq Ali para o RT
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A medida, que coincide com a recente cris instalada com a decisão da Ucrânia de rejeitar um acordo com a União Europeia e reforçar seus antigos laços com a Rússia, faz parte da ofensiva de Putin de intensificar o uso da internet e da alta tecnologia para divulgar a nova Rússia equidistante das potências ocidentais. Como se sabe, este recurso à internet é responsável pelo retumbante sucesso da RT, com transmissões em inglês, árabe e espanhol.
Com efeito, a RT, fundada em 2005 como subsidiária da agora ex-RIA Novosti, forma, juntamente com a Telesur, da Venezuela, a France24, da França, e, ultimamente, a HispanTV, do Irã, os canais estatais que se impuseram para se contrapor às grandes redes americanas e inglesas. Tais canais, até ali, dominavam o noticiário e a programação cultural com o seu viés neoliberal, articulando o fatídico pensamento único, tanto na política, como na economia e na cultura dos povos.
A RT transmite em 24 horas notícias, boletins, documentários, talk-shows e debates, assim como comentários esportivos e programas culturais. Seu sinal é levado ao ar por 22 satélitets e 230 operadoras, o que permite a audiência de cerca de 630 milhões de pessoas em mais de 100 países. A RT, fundada em 2005, é dirigida pela jovem russo-armênia Margarita Simonyan, hoje com 33 anos, há oito no cargo de editora-chefe.
Os canais estatais da Rússia e Venezuela têm em comum o uso intensivo da internet, com sua programação rica em vídeos, textos fotos e transmissão streaming (direta) para PCs, smartphones e tablets. A rede France 24 horas, por exemplo, uma realização do último presidente declaradamente gaullista Jacques Chirac, que recusava o domínio da informação pela BBC ou CNN, começou suas transmissões, em 2006, sem dinheiro para pagar as transmissões via cabo em alguns países. Por isso, centrou sua prioridade na internet para transmissão ao vivo, a partir de seu site de notícias, o france24.fr, com transmissão em francês, árabe e inglês. Nos seus sete anos de existência, o canal francês orgulha-se em dizer que, no primeiro semestre de 2013, alcançou uma média de 14 milhões de visitas por mês e mais de 40 milhões de páginas acessadas, além de comunidades de 2,5 milhões no Facebook e de 1,5 milhão no Twitter. Já a HispanTV, filiada à PressTV, holing iraniana que transmite em inglês e árabe, foi implantada em 2011, com foco nos países latino-americanos e hispânicos, inclusive 30% da população norte-americana, com o mesmo propósito de contrabalançar o noticiário faccioso e anti-Irã das cadeias de TV ocidentais.
Mas, voltando ao decreto de Putin criando a nova Rússia Hoje ou a super RT, o que transparece é a vitória dos profissionais nacionalistas, que se debatiam com os jornalistas de linha mais anódina, na verdade pró-ocidentais ou economias dominadas pelo mercado, propensos a uma mídia estatal menos engajada políticamente, em nome de uma suposta neutralidade ou equidistância da luta política.
Tal postura parecia insustentável nesta fase de reemergência da Rússia, que, depois de Putin, libertou-se dos grilhões de Wahington e Londres, e procura recuperar sua antiga estatura, refazendo seus antigos exército, sua tecnologia, e agora unificando sua comunicação para não confundi-la nem deixá-la refém dos ditames hegemônicos da Europa e dos Estados Unidos, agora em nova ofensiva para dominar e sujeitar a Ucrânia.
Neste contexto, o presidente Valdimir Putin, ao que parece, estaria insatisfeito com a diretora da RIA-Novosti, a holding que congrega a RT, Svetlana Mironiuk. Svetlana, indicada pelo ex-presidente Dimitri Medvedev, atual primeiro ministro, e procedente do “Media Most” (fundado pelo oligarca Vladimir Gusinski, atualmente no exilio), não escondia suas tendências pró-ocidentais, inclusive na cobertura das manifestações ucranianas anti-russas.
O jornal espanhol El País relatou, a propósito, que a RIA-Nóvosti cobriu o “Euromaidán” com notícias e vídeos gravados na praça Independencia de Kiev, incluindo uma entrevista com o ex-presidente da Georgia, Mijaíl Saakashvili, exortando todos os antigos países soviéticos a unir-se e evitar a reconstrução do império russo.
Ainda segundo El País, o diretor da nova RT, Dimitri Kisiliov, é conhecido por sua tendência antiliberal, tendo deixado claro, desde o princípio, qual será sua missão de “restabelecer uma relação justa com a Rússia como um importante país do mundo com boas intenções. Dimitri, também da cidade de Putin, San Petersburgo, é diplomado em filologia pela Universidade de Leningrado, em 1978 e trabalhou, entre 1978 e 1988no Comitê de Rádio e TV da URSS. Em 2002, passou uma temporada na Ucrânia, como diretor do canal televisivo ICTV
Finalente, El país ressalta opinião dos comentaristas russos, para os quais, “Kisiliov é o homem dos novos tempos, que exigem personagens dispostos a levar uma cruzada contra o Ocidente”. Esta seria a posição da atual diretora da rt.com, Margarita Simony, que, ao assumir o canal com apenas 25 anos de idade, imprimiu não só uma orientação com vista às nova tecnologias, como a dinamização da notícia com um viés mais russo que ocidental.
(Com informações de El País, Urgente24.com e Wikipedia)