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Crítica do filme "A Duquesa"

(Publicado originalmente em Seg, 24 de Novembro de 2008 21:00)

A Duquesa, de Saul Dibb, narra a história de uma mulher que, tendo aceitado, na juventude, o quê lhe impôs a sociedade patriarcal inglesa, se vê obrigada, mais tarde, a se sacrificar a fim de manter as aparências de dignidade da nobreza num momento de ebulição política, marcado pela Revolução Francesa e pela Independência dos EUA.

A Duquesa, de Saul Dibb, narra a história de uma mulher que, tendo aceitado, na juventude, o quê lhe impôs a sociedade patriarcal inglesa, se vê obrigada, mais tarde, a se sacrificar a fim de manter as aparências de dignidade da nobreza num momento de ebulição política, marcado pela Revolução Francesa e pela Independência dos EUA.

O filme faz implícito paralelismo entre Georgiana Cavendish (1757-1806), Duquesa de Devonshire e Diana Frances Spencer (1961-1997), Princesa de Gales, como é óbvio, até porque são ambas integrantes da mesma linhagem familiar. O roteiro, bem elaborado pelo próprio Dibb, em colaboração com Jeffrey Hatcher e Anders Thomas Jensen, é baseado no livro Georgiana: Duchess of Devonshire de Amanda Foreman.

Pelo belo tratamento cinematográfico dado por Dibb às seqüências iniciais – concomitantes à exibição dos créditos – tem-se a impressão de que não se está assistindo a um mero filme de época, mas a um trabalho de fôlego e de originalidade tanto no que diz respeito à ambientação, à beleza do figurino, à justeza das interpretações e principalmente à eficiente composição de cenas e de planos fotográficos.

Pois, enquanto Georgiana (Keira Knightley) se diverte nos jardins de sua residência com amigos, entre os quais se encontra o jovem Charles Grey (Dominic Cooper), seu flerte casual, sua mãe Lady Spencer (Charlotte Rampling), num dos salões de recepção da propriedade, trata, como era costume na sociedade patriarcal inglesa, de seu casamento com um homem mais velho do que ela, o Duque de Devonshire (Ralph Fiennes).

Concluídos os acertos pré-matrimoniais, o Duque parte sem ter contato com Georgiana. Esta, deixando os amigos no jardim, atende ao chamado da mãe para, no salão, receber dela, com agrado, a notícia de seu noivado. Meio sonsa, ela indaga à mãe: – Então o Duque gosta de mim?… Mas ele só me viu uma vez! Porém orgulhosa, já se sentindo como futura Duquesa de Devonshire, Georgiana faz expressiva caminhada em direção à sacada da residência para assim sugerir a despedida aos amigos. E, na cena seguinte, ela caminha em sentido contrário, ingressando na igreja para a solenidade do casamento.

Pena que a promessa fique nisso, ou melhor, que sejam apenas nesses breves momentos iniciais que Dibb acerte na condução de sua narrativa, de certo charme e agilidade. A partir de então, seu trabalho mergulha no convencional, arrastando temas por demais explorados em filmes do gênero como a exigência do marido de a esposa ter filho varão para perpetuar o nome da família ou a obrigação dela de aceitar a criar uma criança, nascida de antiga relação dele com uma empregada, já morta naturalmente.

De qualquer forma, porém, o cineasta não deixa cair o ritmo, apoiando-se para tanto num bom trabalho de edição de Masahiro Hirakubo, na fotografia esmerada de Gyvia Pados, no apropriado comentário musical de Rachel Portman e principalmente nas primorosas interpretações do elenco, em que se destaca naturalmente o trabalho de Ralph Fiennes, digno de elogios.

O Duque de Devonshire, segundo a máscara que lhe empresta Fiennes, ganha uma dimensão humana que certamente o roteiro, escrito para destacar as desventuras da personagem-título, a Duquesa, não lhe atribui. No papel, o Duque não deve passar de um déspota, machista, autoritário e inflexível em suas decisões, que traz num cortado a pobre esposa, obrigada sempre a cumprir estritamente suas vontades. Mas não é esta a figura que Fiennes encarna. Ele sabe transmitir a sutil compreensão de que o Duque aprecia e valoriza a atuação política da Duquesa – um século antes de ser concedido o direito de voto às mulheres inglesas -, a qual, como a princesa Diana, conseguiu atrair para si grande prestígio em meio aos seus súditos.

Fiennes esmera-se ainda na percepção de que ele continua amando e admirando a esposa, mãe de seus filhos, embora as circunstâncias – criadas, na verdade, pela própria Duquesa – o levem a se tornar amante de Bess Foster (Hayley Atwell), também moradora em sua residência. E, por outro lado, a sensível reação do Duque ao saber que a Duquesa traz no ventre um filho que não é seu, pela forma com que a exterioriza a personagem, consagra realmente o trabalho de um grande ator.

Quanto a Keira Knightley, fica evidente por essa sua atuação que, apesar de ter rosto bonito, boa presença em cena, como intérprete, ela se repete muito. Em alguns momentos, como Duquesa, ela está muito bem. Mas em outros poderia, com certeza, explorar mais as oportunidades. Charlotte Rampling e Hayley Atwell apresentam excelentes interpretações, o mesmo acontecendo com o novo e promissor talento do cinema britânico, Dominic Cooper, que, dado o seu inegável preparo técnico, vem sendo apontado, nos meios cinematográficos da Inglaterra, como provável sucessor de Daniel Craig na série do Agente 0007, James Bond.

FICHA TÉCNICA
A DUQUESA
THE DUCHESS

Reino Unido, Itália, França / 2008
Duração – 110 minutos
Direção – Saul Dibb
Roteiro – Jeffrey Hatcher, Anders Thomas Jensen, Saul Dibb, com base no livro Georgiana: Duchess of Devonshire, de Amanda Foreman
Produção – Alexandre Arlango, Carolyn Marks Blackwood e Amanda Foreman
Fotografia – Gyvia Pados
Música Original – Rachel Portman
Edição – Masahiro Hirakubo

Elenco – Keira Knightley (Duquesa de Devonshire), Ralph Fiennes (Duque de Devonshire), Charlotte Rampling (Lady Spencer), Dominic Cooper (Charles Grey), Hayley Atwell (Bess Foster), Simon McBurney (Charles Fox), Aiden McArdle (Richard Brinsley Sheridan).

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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