sábado, setembro 21, 2024
InícioCinemaCrítica do filme Inverno da Alma

Crítica do filme Inverno da Alma

Ao traçar o perfil de uma moça de 17 anos, de caráter firme e determinado, que, ante o desaparecimento do pai, se vê forçada não só a procurá-lo, mas a assumir também a responsabilidade pela sobrevivência da mãe ensandecida e de dois irmãos menores, Debra Granik pinta, ao mesmo tempo, em Inverno da Alma, um quadro estarrecedor da miséria no meio rural americano sob o domínio de traficantes de droga.

O roteiro, escrito por Granik em colaboração com Anne Rosellini, é baseado no romance Winter´s Bone, de Daniel Woodrell, que, ao que consta, não tem a atmosfera opressiva da película, só atenuada, de quando em vez, pela inserção de música country, que compõe a trilha sonora de Dickon Hinchliffe. De fato, desde os primeiros instantes da narrativa, o cenário que se descortina das montanhas Ozarks, no Missouri – região central dos EUA –, é de total desolação. Em primeiro plano, avistam-se taperas imundas, que abrigam uma gente estranha, faminta e desorientada, vivendo em péssimas condições. Em volta, há um cemitério de automóveis e de trailers abandonados.

`A porta de um de uma das taperas, surge o rosto jovem, mas sofrido, de Ree Dolly ( Jennifer Lawrence), para atender ao chamado do policial Satterfield (Tate Taylor), assistente do xerife da localidade. Ele lhe comunica o desaparecimento de seu pai, Jessup Dolly, que saiu da cadeia sob fiança. O dinheiro foi obtido com a penhora da casa, que, segundo explica, terá de ser entregue pela família dentro de uma semana, caso ele não apareça para cobrir o débito. Disposta a encontrar o pai, vivo ou morto, ela sai no seu encalço pelos lugares mais ermos e sórdidos no meio das montanhas congeladas, sendo sempre aconselhada a desistir do seu intento.

Até mesmo o tio Teardrop Dolly (John Hawkes), um drogado, magro e barbudo, que a trata mal, de início, mas se desculpa depois, lhe diz que muito provavelmente Jessup tenha sido assassinado. Mostra-lhe então o barraco incendiado, que lhe servia de laboratório para o processamento da metanfetamina (droga estimulante do sistema nervoso central), em cujos destroços, segundo afirma, pode estar o corpo dele. Ree não aceita, porém, a versão do tio. Ao saber, mais tarde, pelo xerife Baskin (Garret Dillahunt), que precisa provar a morte do pai para não perder a casa, ela decide enfrentar o desafio de ir falar ao poderoso chefão do tráfico Thump Milton (Ronnie Hall), com quem os Dolly têm algum parentesco.

Não se sabe qual é a ideologia de Debra Granik – realizadora do filme aclamadíssimo pela crítica internacional, desde que conquistou, em 2010, o Grande Prêmio do Júri do Festival Sundance e dois prêmios do Festival de Berlim – , nem por qual credo ela reza. Ou não reza. O certo, porém, é que, pela sua linguagem – principalmente pela significativa cena final – a protagonista, Ree Dolly, encontra sua força no poder da esperança, mais perigoso do que o desespero, como observaria um poeta inglês, tal como ensinam as grandes mulheres do Antigo Testamento: Esther, Judite e Raquel. Em outras palavras, Ree só não é trágica porque não se deixa ser aniquilada pelo que ela tem de melhor em sua formação: esperança, fé e amor.

Para interpretar essa personagem, Granik teve a sorte de encontrar Jennifer Lawrence, jovem, bonita, de muito talento, que se criou no ambiente em que transcorre a ação, isto é, nas montanhas do Missouri. Talvez a beleza da atriz não tenha contribuído para a caracterização da personagem, o que ela procurou compensar por uma articulação dos músculos faciais que lhe dá uma expressividade magnífica dentro da linha imposta pela direção. Observem-se, por exemplo, o rosto duro e a expressão sofrida de Lawrence, quando Ree ouve dos irmãos a preocupação de que ela se aliste no exército para obter o dinheiro necessário ao resgate da casa e, assim, se afaste deles. Ela lhes responde: – Eu não sei se conseguiria continuar vivendo sem ter o peso de vocês nas minhas costas!… Outra grande atuação é a de John Hawkes, que, no papel do tio Teardrop, trata a figura com muito desvelo e cuidado nas suas inesperadas mutações de humor, causadas ora por consumir droga, ora por saber que, como o irmão, está também ameaçado de morte.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
www.theresacatharinacampos.com
www.arteculturanews.com
www.noticiasculturais.com
www.politicaparapoliticos.com.br
www.cafenapolitica.com.br
FICHA TÉCNICA
INVERNO DA ALMA
WINTER´S BONE
EUA / 2010
Duração – 100 minutos
Direção – Debra Granik
Roteiro – Debra Granik e Anne Rosellini, com base na novela Winter´s Bone, de Daniel Woodrell
Produção – Anne Rosellini e Alix Madigan
Fotografia – Michael McDonough
Trilha Sonora – Dickon Hinchliffe
Edição – Jennifer Lawrence (Ree Dolly), John Hawkes (Teadrop Dolly), Tate Taylor (Satterfield), Garret Dillahunt (xerife Baskin), Ronnie Hall ( Thump Milton).

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
RELATED ARTICLES

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Most Popular

Recent Comments

PAULO ROBERTO DOS ANJOS OLIVEIRA on Próximo factoide: a prisão do Lula
cleonice pompilio ferreira on Golpe de 64: quando Kennedy chamou os militares
José rainha stedile lula da Silva Chávez on Projeto ditatorial de Macri já é emparedado nas ruas
maria teresa gonzalez perez on Crise e impasse institucional
maria teresa gonzalez perez on La Plata: formando um novo tipo de jornalista
maria teresa gonzalez perez on Maduro prepara Venezuela para a guerra civil
maria teresa gonzalez perez on Momentos emocionantes da apuração do 2o. turno
Pia Torres on Crítica do filme Argo
n_a_oliveira@hotmail.com on O que disse Lula a Mino Carta, meus destaques
José Gilbert Arruda Martins on Privatizações, novo filme de Sílvio Tendler
Maria Amélia dos Santos on Governador denuncia golpe em eleição
Prada outlet uk online on Kennedy e seu assassinato há 50 anos
http://www.barakaventures.com/buy-cheap-nba-indiana-pacers-iphone-5s-5-case-online/ on Oliver Stone em dois documentários sobre Chávez
marcos andré seraphini barcellos on Videoentrevista: Calos Lupi fala do “Volta Lula”
carlos gonçalves trez on Crítica do filme O Artista
miriam bigio on E o Brasil descobre o Oman
Rosana Gualda Sanches on Dez anos sem Darcy Ribeiro
leitefo on O Blogueiro
Suzana Munhoz on O Blogueiro
hamid amini on As razões do Irã
leitefo on O Blogueiro
JOSÉ CARLOS WERNECK on O Blogueiro
emidio cavalcanti on Entrevista com Hermano Alves
Sergio Rubem Coutinho Corrêa on El Caudillo – Biografia de Leonel Brizola
Stephanie - Editora Saraiva on Lançamento: Existe vida sem poesia?
Mércia Fabiana Regis Dias on Entrevista: Deputada Luciana Genro
Nielsen Nunes de Carvalho on Entrevista: Deputada Luciana Genro
Rosivaldo Alves Pereira on El Caudillo – Biografia de Leonel Brizola
filadelfo borges de lima on El Caudillo – Biografia de Leonel Brizola