quinta-feira, novembro 14, 2024
InícioAmérica LatinaPapel Prensa e a conexão com as ditaduras militares

Papel Prensa e a conexão com as ditaduras militares

O que está acontecendo na Argentina vai fatalmente se desdobrar aqui no Brasil. Trata-se de revelar, como agora demonstra a questão da fábrica Papel Prensa (papel-jornal), a promiscuidade dos grandes meios de comunicação com as ditaduras militares, as quais, tanto lá, como aqui e no resto da América Latina. foram gestadas e cevadas nas direções dos chamados jornalões.

A Papel Prensa, cujo controle governamental foi assumido pelo governo da presidenta Cristina Kirchner, com a aprovação, na tarde de ontem, da respectiva lei, pelo Congresso, é um monopólio entregue pelos militares, em 1977, aos grupos “Clarín” e “La Nación”, dois arautos da ditadura, em prejuízo dos outros jornais do país. Segundo o atual governo democrático, a posse do Papel-Prensa, antes pertencente a um banqueiro, David Graiver, morto misteriosamente num acidente de avião, em Chilpacingo, no México, em 1976, foi extorquida através de expedientes vis, como ameaças de assassinato, sequestro, prisão e tortura da viúva de Graiver, Lidia Papaleo.

A operação envolveu a participação do governo, que entrou com 27% do capital, mas só para constar, já que quem dá as cartas é o “Clarín”, o grupo mais forte, que açambarcou 49%. O grupo “La Nación”, proprietário do jornal do mesmo nome, se contentou com 22%. Desde então, a fábrica passou a produzir papel-jornal, isento de imposto, somente para estes dois jornais, enquanto o restante dos outros periódicos, inclusive revistas como “Noticias”, foram obrigadas a se virar com importação e outros encargos.

Lídia Papaleo Graiver disse, em depoimento, ter sido torturada a mando do Clarín
Agora, com a lei aprovada pelo Congresso, a fábrica, considerada de interesse público, será obrigada a fornecer papel a todos os jornais, indistintamente, a um preço fixo, estabelecido pelo Ministério da Economia. Não obstante, a medida vem sendo taxada como atentatória à liberdade de imprensa pelo cartel dos grande conglomerados jornalísticos, SIP (Sociedade Interamericana de Prensa), que congrega os donos de três mil jornais das três Américas, com sede em Miami, e o Grupo Diarios de América (GDA), integrado pelos jornais “La Nación” (Argentina), O GLOBO (Brasil), “El Mercurio” (Chile), “El Tiempo” (Colômbia), “La Nación” (Costa Rica), “El Comercio” (Equador), “El Universal” (México), “El Comercio” (Peru), “El Nuevo Día” (Porto Rico), “El País” (Uruguai) e “El Nacional” (Venezuela).

Contudo, é o proprietário de um grande grupo midiático argentino, Jorge Fontevecchia, que edita o jornal “Perfil”, e as revistas “Caras” e “Notícias”, quem diz, numa entrevista à Folha de S. Paulo, de ontem: “O tamanho do “Clarín” é excessivo e um problema para o bom exercício do jornalismo. Para comparar com Brasil, o Grupo Clarín corresponderia ao poder da TV Globo, mais a Folha, mais o jornal “O Globo” e o UOL, sem contar o serviço de banda larga”.

Opositor acérrimo do governo, Fontevecchia reconhece, porém, que a lei é justa, quando afirma: “Aqui é preciso esclarecer o seguinte. O papel nacional custa US$ 750 a tonelada. “Clarín” e “Nación” dizem que não afetam a ninguém porque o papel importado custa US$ 680.
Só que eles estão mentindo. A US$ 680 a tonelada só podem comprar os grandes compradores como o “Clarín”, “La Nación” e “Perfil”, porque para sair com esse preço é preciso comprar 5 mil toneladas. Os pequenos jornais do interior não podem fazer isso. Então compram de um revendedor, que por sua vez compra as 5 mil toneladas e revende em partes menores para os jornais pequenos. Com isso, óbvio, acaba vendendo mais caro, a US$ 800, US$ 900. Há um 25% de intermediação. Um pequeno consumidor não pode comprar o importado mais barato que o nacional. Só as grandes empresas conseguem porque têm como arcar com os custos e possuem grandes depósitos. Agora, há necessidade de distribuir mais papel. Nesse sentido, o governo parte de um ponto justo”.

O editor do “Perfil” ainda lembra que a Papel Prensa, teve como primeiro dono César Cívita, tio de Roberto Cívita, dono da Editora Abril, que edita a “Veja”, e que, no Brasil, “O Estado de S. Paulo” e “O Globo” também tiveram sua fábrica de papel-jornal, a Pisa, que depois venderam:
“Talvez uma coisa interessante para o leitor brasileiro entender o imbróglio seja lembrar que quem fundou a Papel Prensa foi a Abril. César Civita, tio de Roberto Civita, criou a Papel Prensa para alimentar as revistas da Abril aqui na Argentina.
Só que a violência que havia nos anos 70 o assustou. Havia ameaças de bomba nas redações e tentaram sequestrar sua filha. Ele se cansou e vendeu o negócio.
A segunda conexão com o Brasil são os pontos de contato entre a história da Papel Prensa e da fábrica Pisa, da qual eram donos “O Estado de S.Paulo” e “O Globo”.
A maior multinacional de papel norueguesa, a Norske, comprou a Pisa desses dois jornais brasileiros. A Norske também era dona, no Chile, da maior fábrica de papel chilena, que se chama Bio Bio”.
(continua daqui a pouco)

Veja também:
Vídeo entrevista: Leandro Fortes fala sobre a mídia brasileira

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
RELATED ARTICLES

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Most Popular

Recent Comments

PAULO ROBERTO DOS ANJOS OLIVEIRA on Próximo factoide: a prisão do Lula
cleonice pompilio ferreira on Golpe de 64: quando Kennedy chamou os militares
José rainha stedile lula da Silva Chávez on Projeto ditatorial de Macri já é emparedado nas ruas
maria teresa gonzalez perez on Crise e impasse institucional
maria teresa gonzalez perez on La Plata: formando um novo tipo de jornalista
maria teresa gonzalez perez on Maduro prepara Venezuela para a guerra civil
maria teresa gonzalez perez on Momentos emocionantes da apuração do 2o. turno
Pia Torres on Crítica do filme Argo
n_a_oliveira@hotmail.com on O que disse Lula a Mino Carta, meus destaques
José Gilbert Arruda Martins on Privatizações, novo filme de Sílvio Tendler
Maria Amélia dos Santos on Governador denuncia golpe em eleição
Prada outlet uk online on Kennedy e seu assassinato há 50 anos
http://www.barakaventures.com/buy-cheap-nba-indiana-pacers-iphone-5s-5-case-online/ on Oliver Stone em dois documentários sobre Chávez
marcos andré seraphini barcellos on Videoentrevista: Calos Lupi fala do “Volta Lula”
carlos gonçalves trez on Crítica do filme O Artista
miriam bigio on E o Brasil descobre o Oman
Rosana Gualda Sanches on Dez anos sem Darcy Ribeiro
leitefo on O Blogueiro
Suzana Munhoz on O Blogueiro
hamid amini on As razões do Irã
leitefo on O Blogueiro
JOSÉ CARLOS WERNECK on O Blogueiro
emidio cavalcanti on Entrevista com Hermano Alves
Sergio Rubem Coutinho Corrêa on El Caudillo – Biografia de Leonel Brizola
Stephanie - Editora Saraiva on Lançamento: Existe vida sem poesia?
Mércia Fabiana Regis Dias on Entrevista: Deputada Luciana Genro
Nielsen Nunes de Carvalho on Entrevista: Deputada Luciana Genro
Rosivaldo Alves Pereira on El Caudillo – Biografia de Leonel Brizola
filadelfo borges de lima on El Caudillo – Biografia de Leonel Brizola