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A MÍDIA QUE SEMEIA O GOLPE – Neofascismo em construção

(Comunicação, a mãe de todas as batalhas).

Geniberto Paiva Campos – (*) – Brasília, 09 de abril, 2016

Há exatos 13 anos, desde que o Partido dos Trabalhadores assumiu o poder, o Brasil assiste, impávido, leniente, a tessitura golpista da chamada grande imprensa. Fica cada vez mais evidente o inconformismo impaciente da mídia – a mais legítima e confiável representante da elite brasileira – com o projeto político do PT: soberania nacional; política externa independente; inclusão social; ações e programas voltados para as minorias; juros baixos; acesso à  casa própria; erradicação da fome;  educação de todos os níveis, mas principalmente do nível superior (desde o princípio dos tempos reservada aos filhos da elite, jamais para negros e pobres e aos que cursaram escolas públicas nos ciclos básicos da sua formação educacional). Estes são apenas alguns exemplos dos anátemas e heresias políticas inaceitáveis para os padrões neoliberais, colocadas em prática pelo Partido dos Trabalhadores, desde que foi eleito para o seu primeiro mandato presidencial em 2002.E com vitórias em 3 eleições subsequentes.

Como seria impossível do ponto de vista político fazer o contraditório aberto e direto a um projeto de tal envergadura e alcance social, a grande imprensa decidiu retomar o seu sórdido, mal disfarçado programa: derrubar governos progressistas, tidos como contrários aos interesses conservadores. Caracterizada pelas mais convenientes e grosseiras falácias, fabricando fatos, não importando se verídicos, sequer verossímeis. E factoides. Facilmente assimiláveis de forma acrítica por uma classe média dúctil, carente de “verdades” mesmo as que ainda não aconteceram ou que jamais acontecerão. E, na esfera política, considerando-se totalmente dispensada de elaborar pensamentos próprios. Desde que sabedora que alguém (a mídia) cuida – com todo desvelo – desses temas, e os transmite didática e pacientemente. E isso constitui os fundamentos da sua ideologia. Ponto.

A grande mídia colocou em marcha um dos seus projetos mais importantes: a criação da Escola Preparatória de Analfabetismo Político, destinada a formar cidadãos crédulos, ingênuos incuráveis, robotizados. Capazes de acreditar em qualquer palavra de ordem política emitida por seus confiáveis órgãos de comunicação – jornais, revistas, rádios, TVs – e mais recentemente, pelas redes sociais. Uma espécie de seita de obedientes vassalos. Militantes zumbis de um partido oculto. Que em resposta à ideias e conceitos emitidos pelos “inimigos” batem panelas, acionam as buzinas dos seus carros e emitem sons e grunhidos inteligíveis. Podendo reagir com o emprego de violência, se necessário.

Sobre essa estranha tribo a mídia executa um trabalho de profissionais. Sem qualquer preocupação com a verdade factual nem com sutilezas ou requintes. Tudo se passa e é divulgado de forma bruta. E direta. Na mais completa grossura. Pois segundo alguns dos seus expoentes, o público que sem perceber, se torna discípulo dessa escola, absorve, feliz, tal como novos Homer Simpson, todos os conteúdos que lhe são carinhosamente repassados. E aprecia a crueza da verdade.  E entre esses aplicados discípulos há os falsos ingênuos, que passaram a integrar, docemente constrangidos, o vasto rebanho dos crédulos impenitentes, e que irão engrossar as fileiras neofascistas. Sempre com bons motivos. Ou pretextos. Por exemplo: – “já votei no Lula, mas tenho agora indignação moral com os erros do PT”.

Não há qualquer preocupação, da parte dos formuladores desse estranho projeto midiático (criação de uma sociedade de tolos) com as possíveis e nefastas consequências que poderão advir para a consolidação de uma sociedade civilizada e democrática. Eles foram convencidos que essa é a única forma de arrebatar o poder de mãos impuras: demonizar e criminalizar o Partido dos Trabalhadores. Para depois, liquidá-lo. Definitivamente. Não importando futuras consequências. Já que se tornou aparentemente impossível vencê-lo pelo voto.

  • OS CÚMPLICES DO GOLPISMO

Dispondo da base ideológica do projeto, fiéis seguidores diplomados pela EPAP – leia-se indivíduos firmemente convencidos de que o Partido dos Trabalhadores se constitui numa espécie de demônio a ser exorcizado –  tornou-se urgente e necessária a criação do apoio operacional, indispensável para a realização plena do seu objetivo: liquidar o inimigo. Que há muito deixou de ser um mero adversário político, composto por seres humanos (lembra judeus, ciganos, bolcheviques escolhidos pelos nazistas? Coincidência?). Como há tempos recomendava um ex-senador catarinense: – “temos que acabar com essa raça”. Sendo, portanto, permitidos todas as ações, lícitas ou não, legais ou ilegais, para dar um fim a “essa organização criminosa”. Sempre com o apoio cúmplice dos seus fiéis, manipuláveis e distraídos leitores.

Iniciou-se, então, a fase decisiva: angariar apoio para a transcendente tarefa. Partidos políticos, integrantes dos poderes judiciário e do legislativo sensíveis à pregação anti-PT, simpatizantes da causa. Gastou-se apenas o tempo necessário para o convencimento e a adesão dos novos participantes do rebanho midiático para a nobre empreitada.

Antes de completar o segundo ano do governo inaugural do PT (2003/2006), tiveram início os trabalhos de desmonte. Em sequência claramente identificável vieram as “operações” destinadas a desalojar o Partido dos Trabalhadores do poder. Sempre com o pretexto da prática de delitos morais, que na pia batismal midiática recebeu o nome de “corrupção”. Ficando previamente definido que corrupção é um rótulo que se atribuiu, e se colou para sempre, no Partido dos Trabalhadores. E ficou também combinado que os partidos oposicionistas podem praticar os mesmos atos – e até mesmo alguns deslizes muito mais graves e comprovados – sem que incorram em qualquer tipo de infração legal. Esse rótulo e o título especial de “corrupto  é aplicável somente ao PT.

Dessa forma, e utilizando estes critérios, foi montada a primeira operação destinada à demonização/criminalização do PT. Um provável ou suspeito “CAIXA 2” recebeu o apelido midiático de MENSALÃO. E a partir desse momento, ficou estabelecido que para condenar o PT  (em processos criminais!) não seria necessária a obtenção de provas. Na falta destas, poderia ser utilizada pela excelsa corte a “literatura jurídica”. Ou ainda a “teoria do domínio do fato”. E nos últimos nebulosos tempos, a “delação premiada”. Tudo isso sem causar espanto, indignação ou sequer rubor nos aplicados alunos da graduação ou pós-graduados da EPAP. Afinal, trata-se da penalização – sempre justa, com ou sem provas – do Partido dos Trabalhadores. Estranhos tempos estes de “macarthismo tupiniquim” e de uma nova caça às bruxas.

E a consciência jurídica brasileira fingindo dormir. Inocente e pura. Ajustando a venda nos olhos para não ver melhor.

É bastante provável, no futuro, que o julgamento do “Mensalão” – e seus desdobramentos – venha a ser reconhecido como a maior fraude jurídica de uma nação em tempos democráticos.

  • COMO A SITUAÇÃO CHEGOU A ESSE PONTO?

A perigosa e surpreendente omissão e alheamento de pessoas e instituições, vitais para a manutenção da Democracia e do Estado de Direito, levou o Brasil a essa difícil situação. Por outro lado, ampliou-se o já desmedido espaço de atuação da mídia, que se viu livre para de maneira irresponsável, desencadear ações convocatórias de segmentos populacionais sob sua esfera direta de influência, a classe média, para vir às ruas com o objetivo de desalojar a presidente da república do seu cargo e “salvar o país”. Com essa simplificação política grosseira e tosca e as permanentes notícias negativas sobre a situação do país e a evolução da crise, foi criado artificialmente o caldo de cultura para alimentar o caos. E o Golpe.

A ausência da leitura correta de um processo político tão complexo e de tão rápida evolução – facilitada pelo estranho silêncio e a indiferença da classe política, juízes e advogados com a transcendente tarefa de defender a Lei e a Constituição e outras organizações da sociedade brasileira – permitiu o avanço dos golpistas. Que se sentiram à vontade para colocar em prática, em crescendo, todo o elenco de ilegalidades, necessárias para corroer sutilmente, ou de forma escancarada, o Estado de Direito e a Democracia.

Omissão e leniência que se revelaram cúmplices, e fatais, para a impedir a manutenção e a ampliação dos avanços sociais e a conquista de novos direitos, essenciais para fazer o país atingir a condição de sociedade livre e civilizada.

Com o retrocesso bem visível no horizonte, é possível que o Brasil venha a encerrar um ciclo de Democracia plena, vivenciado durante curtos 35 anos, agora sob grave ameaça de erráticos movimentos neofascistas, dirigidos, irresponsavelmente, por neófitos do jogo político. Comandados pelo “partido da mídia”. O qual dirige o país sem precisar de votos ou do escrutínio periódico da cidadania. Com a permanente omissão desta, silente e cúmplice, por medo ou disfarçado apoio.

  • DESFECHOS: ABRE-SE, ENFIM, O GOLPE MIDIÁTICO – JUDICIAL

A adesão do Congresso Nacional ao esquema golpista, articulado pela mídia e parte do judiciário, fechou o cerco ao atual governo e à Democracia.

Começa pela percepção dos partidos oposicionistas sobre a necessidade inadiável de romper a aliança (ou a coalizão) PT/PMDB, a qual, de alguma maneira vinha permitindo a governabilidade, melhor seria dizer, a sobrevivência política do atual governo. Somada à eleição do representante carioca, (PMDB/RJ), para a presidência da Câmara, peemedebista de posicionamento fortemente contrário à coalizão do seu partido com o PT, trazendo em seu currículo gravíssimas acusações, colocou novos e radicais desafios ao governo da presidente Dilma Roussef, no âmbito do Congresso Nacional.

O polêmico, recém- eleito, presidente da Câmara trazia características peculiares ao cargo e ao jogo político, por ter disponível uma espécie de “bancada” com um número significativo de deputados, eleitos de forma discutível, com generosos recursos privados, internos e externos, dispostos a seguir a sua orientação, fechada em suas decisões, praticamente em todas as questões relevantes da pauta política. Afinal foram eleitos com essa finalidade. E mais ainda, todos com declarada, ferrenha, oposição ao governo federal. Este viu tolhidas as suas iniciativas políticas e administrativas e tendo, ainda, que enfrentar as “pautas bomba” armadas pelo Congresso Nacional. (Alguns congressistas aproveitando-se da situação para apresentar projetos definitivamente contrários aos interesses estratégicos do país).

Este quadro foi complementado – e agravado – com as pressões sobre o vice-  presidente no exercício do cargo, dirigente máximo do PMDB, e, naturalmente, situado na linha sucessória direta da presidente. O qual acabou cedendo a essas pressões e decidiu desembarcar do governo, levando, pelo menos formalmente, o seu partido. Dessa forma, colocando mais lenha na fogueira da crise. E sérias dificuldades para o governo. Estava, portanto, desenhado o Golpe.

E, também, concluída a armação política para o pedido de “impeachment” presidencial, faltando, apenas, os motivos, a serem claramente provados, para justificar o pedido. E “impeachment” sem dolo comprovado é GOLPE, responderam os integrantes da coalizão governamental.

A partir desse ponto o jogo político se complica e acentua-se a radicalização, criando-se uma situação de conflito, aparentemente insolúvel, entre os grupos favoráveis e contrários ao “impeachment” e que, literalmente dividiu o país. E agravou a sensação de paralisia em setores vitais da nação. (Esta divisão simbólica – “um país dividido”- assume contornos físicos no espaço público, com a construção de uma cerca, erguida na Esplanada dos Ministérios, para separar os litigantes. Criativa ideia de algum gênio da segurança pública).

Estes são graves sintomas da radicalização da luta política. Com imensos riscos, repetimos, para a sobrevivência da Democracia e do Estado de Direito.

A acentuação do já intenso grau de intolerância e ódio político indisfarçados dos grupos políticos oposicionistas que querem, a qualquer custo, cassar o mandato da presidente, veio a colocar o Brasil, novamente, nas fronteiras de um regime de exceção.

Direitos de cidadania, liberdades públicas, livre associação e expressão, mobilização popular, além de importantes conquistas sociais, estão claramente em risco, ameaçadas pelo conluio neofascista, o qual já mostra as suas garras, no âmbito do Congresso Nacional, nas ruas, nas universidades, com o beneplácito de alguns juízes que partidarizam suas togas.

O que restaria fazer para deter essa marcha da insensatez? Haverá ainda, espaço – mínimo que seja –  para o diálogo e o entendimento?

Seria suficiente, para se chegar à pacificação, aguardar o desfecho da decisão no Congresso Nacional sobre o “impeachment” presidencial, admitido pelos deputados integrantes da Comissão Especial da Câmara, em tumultuada votação, que mais parecia uma assembleia estudantil de mal- comportados alunos de ginásio?

Difícil fazer regredir em seu ímpeto, trazendo-os de volta à razão, este grupo de políticos e cidadãos, alguns simulando absoluta indignação, pintados para a guerra, sedentos de sangue, habilmente manipulados por uma mídia irracional e sem escrúpulos. Praticamente impossível sequer falar em diálogo e negociação política, em tal situação.

  • POSSÍVEIS CONSEQUÊNCIAS DO GOLPE

O Brasil foi, finalmente, trazido a fórceps para o 3º turno das eleições presidenciais de 2014. O custo para as instituições, para a normalidade e continuidade constitucional, traduzido em garantia de direitos, duramente conquistados nas últimas décadas, será muito elevado.

A vitória dessa trama – amadora, primitiva – da mídia golpista irá cobrar o seu preço, a partir do momento em que venha a se consolidar. Regras básicas e sagradas do jogo político, mesmo as não escritas, foram conspurcadas. Violentadas. A proibição, ditada pelos Donos do Poder, da continuidade de um governo eleito legitimamente, cujo programa atua em sentido contrário aos seus interesses (bem distantes dos interesses do país, diga-se) evidencia a prática violenta de um jogo bruto. Feito de manipulações grosseiras dos poderes constituídos e de nefastas consequências. Comprometendo o futuro do país dentro da normalidade constitucional e das liberdades públicas. Se engana, lamentavelmente, quem imagina que as ações e as ambições golpistas teriam como limite o impedimento do atual governo. Vai bem mais longe. É o que veremos, se o Golpe vier a triunfar. Caso a mobilização popular não seja suficiente para contê-lo.

Que Deus permita a sobrevivência da Democracia a mais este grave desafio. As forças progressistas, talvez por descuido ou por não terem feito a avaliação correta, perderam a guerra da Comunicação. Fica a lição para o futuro: COMUNICAÇÃO, A MÃE DE TODAS AS BATALHAS.

Frente a qualquer resultado da crise atual, para os tempos que virão, é importante para as forças progressistas construir e manter a unidade em torno do seu projeto. Sem descuidar de nenhum setor estratégico. A LUTA (POLÍTICA) CONTINUA!

(*) Do Instituto Lampião – Reflexão e Debate sobre a Conjuntura

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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