Por Reynaldo Domingos Ferreira
Ganhador do Prêmio Especial do Júri do Festival de Veneza (2009), Soul Kitchen, de Fatih Akin, mostra, por abordagem de comédia erótico-sensual, as desventuras de um dono de restaurante, em Hamburgo, na Alemanha, descendente de imigrantes, que não sabe se vai ao encontro da namorada na China, ou se cuida de seus negócios, ameaçados de ruir pelo descuro do irmão.
O roteiro, de muita verve e insinuações de ordem político-social, foi escrito pelo próprio Akin, em colaboração com o ator Adam Bousdouskos, também intérprete do protagonista, Zinos Kazantsakis, um descendente de gregos, cujo restaurante fica na região portuária, de degradação imobiliária. Apesar da precariedade das instalações e da qualidade da comida servida – à base de muita fritura -, o Soul Kitchen vai sendo tocado de forma razoável por Zinos, que tem uma ajudante eficiente, Lucia Faust (Anna Bederke).
Ao início do filme, Zinos está às voltas com dois problemas: primeiro, a namorada, Nadine Krüger (Pheline Roggan), que está de partida para Shangai, onde vai exercer, como correspondente, a profissão de jornalista e, segundo, o irmão Illias Kazantsakis (Moritz Bleibtreu), que precisa obter dele um emprego fixo para sair da cadeia e acabar de cumprir a pena em regime semiaberto. Para complicar a situação, ele contrata um chef, Shayn Weiss (Birol Ünel), que promove radical mudança no cardápio do restaurante em direção à haute cuisine, o que causa, de imediato, a repulsa da freguesia, constituída, em sua maior parte, de caminhoneiros.
Além de tudo isso, ao remover um pesado móvel no estabelecimento, Zinos afeta a hérnia de disco e começa a sentir fortes dores no corpo e a andar meio curvado, como se tivesse a espinha torcida. Sem ter um plano de saúde, ele procura uma fisioterapeuta, Anna Mondstein (Dorka Gryllus), que, com a ajuda de um homeopata, Kemal (Ugur Yucel), lhe aplica um tratamento de técnica manual, colocando-o em forma novamente. Então ele reencontra um amigo de infância Thomas Neuman (Wotan Wilke Möhring), capitalista, que lhe quer comprar o restaurante, ou também, se houver descuido, arruiná-lo de vez.
Para narrar as peripécias em que se envolve Zinos, a linguagem de Akin é solta, livre, direta, sem preocupações formais – ele não gosta de dizer que tem um estilo de direção – e, melhor, pontilhada por uma trilha sonora composta de músicas gregas e americanas em que o tom geral é de nostalgia. Akin, nascido em Hamburgo, de pais turcos, começou a carreira como ator. Faz parte hoje de uma geração de diretores alemães independentes que, ao contrário das anteriores – particularmente a da década de sessenta -, desejam fazer cinema de comunicabilidade com o público, isto é, de respeito à bilheteria. Apesar de relativamente jovem (37 anos), já foi premiado em Locarno, Berlim, Cannes e Veneza. Seu estilo denota influência do cinema americano, principalmente de Martin Scorsese, um de seus realizadores preferidos.
Os filmes de Akin são todos inspirados em fatos do cotidiano dos imigrantes – por ele considerados como seres excluídos – residentes em Hamburgo. Em Soul Kitchen ele, segundo revela, recupera uma fase da juventude em que passava grande parte de seu tempo no restaurante de um amigo grego. Embora não seja um trabalho autobiográfico, como Solino (2002), caracteriza-se perfeitamente como de cunho pessoal. Para interpretar os irmãos Kazantsakis, escolheu seus dois atores preferidos: Adam Bousdouskos e Moritz Bleibtreu, que se parecem não só fisicamente, como também no estilo de compor as personagens. Boudouskos faz de Zinos um jovem responsável e empreendedor, paciente como Jó, mas que se descontrola ao conversar, via skype, com Nadine, alemã puro-sangue, pertencente a uma família rica e tradicionalista da cidade, que se encontra em Shanghai. Bleibtreu, um dos mais requisitados atores alemães da atualidade, personifica Illias que, ao contrário do irmão, é totalmente irresponsável, vive se metendo em encrencas, mas também quando vê um rabo de saia… O restante do elenco é muito bom também.
FICHA TÉCNICA
SOUL KITCHEN
Alemanha / Grécia / 2009
Duração – 99 minutos
Direção – Fatih Akin
Roteiro – Fatih Akin e Adam Bousdouskos
Produção – Klaus Maeck
Fotografia – Rainer Klausmann
Edição – Andrew Bird
Elenco – Adam Bousdouskos (Zinos Kazantsakis), Moritz Bleibtreu (Illias Kazantsakis), Birol Unel (Shain Weiss), Anna Bederke (Lucia Faust), Pheline Roggan (Nadine Krüger), Wotan Wilke Möhring (Tomas Neumann), Ugur Yucel (Kemal), Anna Mondstein (Dorka Gryllus)