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Crítica do filme O refúgio


O Refúgio, de François Ozon, exibido no Festival Varilux do Cinema Francês, que entrará em exibição, em seguida, em todo o país.

Por Reynaldo Domingos Ferreira

Em linguagem impressionista, marcada pela conjugação de música e de variada tonalidade dada à fotografia, o cineasta François Ozon expõe, em O Refúgio, a questão das implicações de uma gravidez indesejada para uma mulher que, tendo perdido o amante, não sabe como dar prosseguimento à própria vida. É verdade que o roteiro de Ozon, em colaboração com Mathieu Hippeau, aborda, de maneira nem sempre discreta, outros temas paralelos postos em foco nos dias atuais, como a degradação da juventude pelo envolvimento com a droga; a opção ou não pelo aborto; a homofobia e a adoção de crianças por homossexuais.

Mas é a gravidez o elemento essencial que Ozon utiliza para analisar o perfil psicológico instável de Mousse (Isabelle Carré) que, inexplicavelmente, sobreviveu a uma criminosa overdose de heroína+valium, a qual tirou a vida de seu também jovem e rico parceiro Louis ( Melvil Poupaud). Durante o velório dele, o quadro familiar se esboça rapidamente com o pai (Jean-Pierre Adréani) clamando às lágrimas aos presentes por não haver dado mais assistência ao filho pelo fato, segundo alega, de sua ex-mulher (Claire Vernet) lhe impedir o acesso a ele.

Sem dar, em nenhum momento, aparente demonstração de pesar pela perda do filho, é a mãe de Louis que propõe a Mousse, quando esta sai do hospital, e após saber de sua gravidez, praticar o aborto. Mousse, deixando-a sem resposta, parte para o País Basco, onde se aloja numa casa à beira-mar de propriedade de um velho parente. Alguns meses depois, ela recebe a inesperada visita de Paul ( Louis-Ronan Choisy), irmão de Louis, em trânsito para a Espanha.

O motivo real da ida de Paul ao encontro de Mousse é o interesse dele pela criança que vai nascer. Suas primeiras palavras são assim para expressar a ela o seu apoio pela decisão de preservar a gravidez. Mousse, entretanto, parece não estar bem consciente disso. Ao acariciar o ventre intumescido, que aflora à superfície da água da banheira, ela sente mais a presença de Louis do que do ser que dentro dela ele gerou. Era como se sua imaginação só estivesse centrada na memória dele, jamais no bebê que traz dentro de si. Mais tarde, na praia, uma desconhecida (Marie Rivière) percebe isso e a importuna lhe dizendo que deveria agir de maneira diferente para que o feto não lhe absorvesse a rejeição: A felicidade futura dessa criança vai depender da aceitação que você lhe transmitirEla precisa perceber que será benvinda. – a mulher a adverte.

A narrativa de Ozon é pausada, quase lenta, mas rica nos detalhes técnicos para dar evidência ao vazio que Louis deixou tanto na vida de Mousse como na de Paul. Este faz transparecer isso ao tocar, uma noite, ao piano a melodia que, quando crianças, ele e o irmão ouviam em casa. É essa música, composta por Choisy, que sublinha a evolução do argumento pela qual o espectador vai, aos poucos, tomando conhecimento dos demais temas focalizados na película. Ozon explora também o contraste da fotografia de Mathias Raaflaub – mais fria no País Basco e de tonalidade mais viva em Paris – para destacar o isolamento a que Mousse se entregou a fim de buscar, na reflexão, os rumos a seguir na vida.

É pena que não tenha ele conseguido compor melhor as cenas iniciais em que Louis e Mousse se entregam às drogas, que são por demais cruas e carregadas de clichês. Destoam bastante, por sinal, do estilo sóbrio com que o realizador conduz a maior parte de sua narrativa. Mas os atores Melvil Poupaud e Isabelle Carré têm, nas referidas sequências, como sempre, boas atuações. Poupaud, apesar de jovem, detém filmografia extensa, pois, além de atuar desde criança, é ator bilíngue, que trabalha na França e na Inglaterra. Carré, a estrela do filme, também de respeitável currículo, personifica Mousse com muita acuidade técnica durante toda a ação. A Louis-Ronan Choisy falta um pouco mais de experiência. E Claire Vernet, como a mãe, deixa registrada, com exatidão, a imagem de uma mulher frustrada, a quem só resta cuidar dos bens que amealhou.

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA

ROTEIRO, Brasília, Revista

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FICHA TÉCNICA

O REFÚGIO

LE REFUGE

França/2009

Duração – 90 minutos

Direção – François Ozon

Roteiro – François Ozon e Mathieu Hippeau

Produção – Chris Bolzli e Claudie Ossard

Fotografia – Mathias Raaflaub

Música Original – Louis-Ronan Choisy

Edição – Muriel Breton

Elenco – Isabelle Carré (Mousse), Melvil Poupaud (Louis), Louis-Ronan Choisy (Paul), Claire Vernet (mãe), Jean-Pierre Adréani (pai), Marie Rivière (Mulher da praia), Pierre Louis-Calixte (Serge), Maurice Antoni (O padre)

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Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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