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Não consigo engolir o Barak Obama

(Publicado originalmente em Seg, 15 de Dezembro de 2008 15:49)

Por FC Leite Filho

Não consigo me empolgar com a candidatura do Barak Obama, nem mesmo depois do apoio dos Kennedy, anunciado ontem, com grande estardalhaço. Aliás, mal vejo por que o clã de Massachussets, historicamente tão vanguardeiro, engrosse as fileiras de um candidato que tem Ronald Reagan como um de seus ídolos.

Ora, Ronald Reagan foi o antípoda da doutrina kennedyana, que defendia a integração racial, o papel do Estado na diminuição das disparidades sociais, não só dentro como fora dos Estados Unidos. John Kennedy foi também o homem da paz, que inaugurou a política de coexistência pacífica com a então União Soviética, em plena guerra fria.

Já Reagan timbrou sua marca como o presidente belicoso, que, projetou a chamada Guerra nas Estrelas, um plano para fazer crer que os EUA eram a polícia do mundo. Fez ainda muito pior: junto com Margaret Thatcher, da Inglaterra, impôs o neoliberalismo, como maior mal já feito à humanidade, com o desmantelamento das principais instituições dos Estados nacionais, inclusive do Brasil.

No seu livro de pensamentos, o senador Barak Obama, do Estado de Illinois, afirma sobre Reagan: “Ronald Reagan pode ter exagerado em suas críticas ao sistema de assistência social universal (welfare state), mas (…) uniu o país dando-lhe um senso de ideal comum que os liberais já não podiam dar.”

É certo que Obama é jovem, negro, embora não faça disso uma bandeira, e demonstrou grande coragem ao votar contra a invasão do Iraque, em 2003, enquanto Hillary Clinton, sua principal oponente, no Partido Democrata na corrida presidencial americana, votava a favor. Mas, como lembra agora a própria Clinton, Obama aprovou no Senado o recente pacote de George Bush para reforçar a ocupação americana naquele sofrido país árabe.

Seu grande trunfo é, além do carisma, que tem enfeitiçado brancos e negros numa sociedade ainda com boa dose de racismo como a americana, é sua habilidade em agradar ao mesmo tempo o chamado big business e seus companheiros negros. Na primária de Carolina do Sul, estado com quase metade da população negra, Hillary levou uma surra tremenda: ela teve apenas 15%, enquanto Obama, 81%.

E isso porque Obama não dá muita bola para a sua condição de filho de um negro nascido no Quênia, e de uma americana loira, como ele ainda diz em seus pensamentos: “Eu rejeito a política baseada apenas na identidade racial, na identidade homem-mulher ou na orientação sexual. Eu rejeito a política baseada na vitimização.”

Quem pode criticá-lo por esta posição? Mas é aqui mesmo que reside sua astúcia em tratar de questões altamente polêmicas. Uma astúcia que não vejo em Hillary Clinton, cujo carisma está há anos luz atrás de Obama Barak. Mas está evidente que Hillary tem um programa mais consistente, além de uma experiência em lidar com a questão social bem mais conseqüente do que o jogo de espertezas de Obama.

Como gerente do programa de educação e assistência médica do marido-presidente Bill Clinton (1992-2000), ela revolucionou o velho e injusto sistema, que sempre foi uma vergonha nos Estados Unidos. Antes dela, só tinha direito a ser medicado quem contribuísse para o sistema privado. Na educação, também, beneficiou as classes menos favorecidas e deu novo status à educação pública. E isso tudo porque sofreu violenta pressão dos lobbies da medicina e das escolas privadas, que podaram grande parte de seu projeto original e engavetaram muitas das propostas mais ousadas.

Talvez sejam esses lobbies poderosos que agora estejam se vingando e incensando a candidatura de Barak Obama, que, por ser negro, dificilmente obteria o apoio necessário para tornar-se presidente. Tal fato, é claro, facilitaria a vitória de um novo republicano para assumir a Casa Branca. Agora, me pergunto, por que os Kennedy entraram nessa, se têm com os Clinton muito mais afinidade?

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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