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Crítica do filme "Amor sem escalas"

(Publicado originalmente em Sex, 29 de Janeiro de 2010 11:46)

Como boa dose de cinismo, Jason Reitman mostra, num tom de comédia, em Amor Sem Escalas, como uma empresa terceirizada pode conseguir reduzir custos, na atual conjuntura de crise, se seus consultores usarem o programa de milhagem de uma companhia aérea e os benefícios de uma rede hoteleira ao viajar pelos EUA para demitir empregados. 

 O argumento – que comporta várias outras interpretações paralelas – é extraído por Reitman e Shelton Turner de uma novela, Up In The Air, de Walter Kirn, do gênero romance de viagem, que narra a história de um executivo Ryan Bigham (George Clooney), individualista, esnobe, inebriado com a vida que leva, sempre nas alturas, a fim de exercer sua difícil missão.

 Para enfrentar as reações dos demitidos, as mais inesperadas possíveis, Ryan, sempre cordial, e bem vestido, se municia de uma série de frases de efeito para convencê-los a aceitar a situação, bem como para motivá-los a partir em busca de outras oportunidades na vida: – Lembre-se de que os que construíram grandes impérios passaram por circunstâncias como essa, mas prosseguiram, foram adiante – ele afirma.

Sempre em trânsito, Ryan, que não se importuna nem com a tediosa rotina das vistorias do setor de segurança dos aeroportos, conhece Alex Goran (Vera Farmiga), bonita e elegante, que também leva vida semelhante à dele. Os dois se entendem maravilhosamente bem nos confortáveis quartos de hotéis em que hospedam, e passam a marcar encontros de acordo com sua programação de viagens.

Mas Ryan tem uma irmã mais velha, Kara Bigham (Amy Morton), que, por telefone, o incumbe de levar aonde ele for um cartaz, recortado, da fotografia ampliada de sua filha Julie (Melanie Linskey), com o noivo Jim (Danny McBride), para tirar fotos que darão aos convidados a impressão, no dia do casamento, de que eles, sem ter dinheiro para custear a viagem de lua de mel,  visitaram antes diferentes pontos dos EUA.

Enquanto isso, surge na empresa de Ryan, sediada em sua cidade, Omaha, Nebraska, uma nova funcionária, Natalie Keener (Anna Kendrick), com crista de gênio, a qual propõe a exclusão dele, para reduzir custos da empresa, que passaria a efetuar as demissões pela internet. Vendo-se sob ameaça de perder a doce vida que tem e, pior, não poder, como espera, completar o recorde de milhagens, com comemorações a bordo de uma aeronave, Ryan convence seu chefe (Jason Bateman) a mandar Natalie  acompanhá-lo, nas viagens, para conhecer de perto o seu serviço.

A linguagem de Reitman, de caráter ufanista e promocional, baseada em rica composição de planos, busca apoio na excepcional interpretação do trio de atores – Clooney, Farmiga e Kendrick – e na trilha sonora de Rolf Kent, Randal Poster e Rick Clarck , constituída de canções apropriadas, como a do início, This Land Is Your Land, de Sharon Jones e Dap Kings.
 
Poder-se-ia dizer que, com um orçamento de produção relativamente baixo (US$ 25 milhões), Reitman persegue uma aproximação de sua linha de direção com a de Billy Wilder (Se meu Apartamento Falasse, por exemplo) se, além do desencanto romântico de Ryan, este apresentasse perfil de alguém um pouco mais canalha. Mas não é evidentemente o caso.
 
George Clooney modela bem a personalidade de Ryan, sem exagerar no tom, mostrando um indivíduo apenas vaidoso – não um mau caráter -, que aprecia, antes de tudo, um palco para poder aparecer. Observe-se, por exemplo, a decepção estampada no rosto do ator ao ficar Ryan sabendo que não seria ele quem conduziria ao altar a sobrinha Julie, na solenidade do casamento religioso, mas o tio do noivo Jim.

 Vera Farmiga é suficientemente bonita, e tecnicamente bem preparada, para levar  o resistente solteirão Ryan a se envolver até soltar suspiros no seu relacionamento amoroso com Natalie, que, nesse particular, é muito mais sagaz e experiente que ele, embora não pareça. De olhos ternos, sob uma testa sem remorsos, Farmiga dá a cabal expressão de Natalie, uma mulher madura, objetiva, que sabe  bem o que faz e o que quer da vida.
 
 Anna Kendrick, egressa da medíocre saga vampiresca de Crepúsculo, apesar de ter apenas 24 anos, já é tida como uma das maiores revelações do cinema americano. Isso naturalmente se deve ao fato de haver começado cedo, aos 12 anos, no teatro, na Broadway, no musical High Society. Agora, Kendrick é uma executiva, que não só quer tirar o emprego de Ryan, como roubar a cena do veterano Clooney.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA

FICHA TÉCNICA
AMOR SEM ESCALAS
UP IN THE AIR
EUA/2009
Duração – 109 minutos
Direção – Jason Reitman
Roteiro – Jason Reitman e Shelton Turner, com base no livro Up In The Air, de Walter Kirn
Produção – Daniel Dubieck, Jeffrey Clifford, Ivan Reitman, Jason Reitman
Fotografia – Eric Steelberg
Trilha Sonora – Rolf Kent, Randal Poster, Rick Clarck
Edição –  Dana GlaubermanElenco – George Clooney (Ryan Bigham), Vera Farmiga (Alex Goran), Anna Kendrick (Natalie Keener), Amy Morton (Kara Bigham), Jason Bateman (Craig Gregory), Melanie Lynskey (Julie Bigham), Danny McBride (Jim Miller), Sam Elliot (Maynard Finch).

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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