O discurso de ontem do presidente Barak Obama teve pompa e circunstância de um anúncio alvissareiro. Foi para anunciar a volta escalonada para casa, até 2014, de todos os 99 mil soldados norte-americanos em combate no Afeganistão. Na verdade, constituiu um ato de rendição, um pouco menos humilhante, digamos, daquele do presidente Richard Nixon, no caso do Vietnã.
Daqui a pouco, ele terá de fazer o mesmo com a Líbia, onde a resistência do líder Muamar Kadafi revela-se cada vez mais desafiadora, não obstante a devastação das bombas e as matanças da OTAN. Os falcões ainda ensaiam invadir a Síria e depois o Irã, mas só ensaiam, porque as rebeliões no Oriente Médio começam a escorrraçá-los da região. Já se foram da Tunísia, do Egito, do Iêmen…
Ê bom mergulhar na história, esta velha conselheira: 27 de janeiro 1973. Um presidente nervoso anuncia, sem pronunciar a palavra, é claro, a primeira derrota de seu país em todos as guerras que empreendeu ou se envolveu: “Falo hoje à noite no rádio e na televisão,” – começou o Nixon -“para anunciar que fechamos um acordo que põe fim à guerra e deve trazer a paz para o Vietnã e o Sudeste Asiático. Durante os próximos 60 dias, as tropas norte-americanas serão retiradas do Vietnã do Sul. Temos de reconhecer que o fim da guerra só pode ser um passo em direção à paz”. (Clique aqui para ver o vídeo de um dos discursos de Nixon sobre a retirada do Vietnã)
Trinta e oito anos depois, Obama usa a mesma Casa Branca, sede do governo, para anunciar a retirada, depois de quase 10 anos de invasão do Afeganistão: “Quando assumi o governo, a guerra do Afeganistão entrava no seu sétimo ano… Nossa missão vai mudar de combate para apoio. Em 2014, este processo de transição estará completado e o povo do Afeganistão será responsável pela sua própria segurança. Estamos começando esta retirada, numa posição de força”.
Enquanto Obama falava, Kadafi lançava uma mensagem em áudio, pel rádio e televisão estatais, a seu povo, que tem sua capital Trípoli bombardeada dia e noite pelas forças da OTAN, Organização do Tratado do Atlântico Norte, reunindo soldados dos Estados Unidos e da Europa. Essas bombas destruíram grande parte da infra-estrutura, penosamente construída nos últimos anos, matando, indiscriminadamente, famílias e crianças: “Os líbios vão enfrentar os bárbaros estrangeiros e cruzados até a morte. O diabo se envergonharia das mentiras dos inimigos, Vamos lutar até que eles sejam varridos”.
Pouco depois, o chanceler Francisco Frattini, da Itália, integrante da OTAN, pedia um cessar fogo, enquanto os rebeldes sustentados pelas grandes potências se queixavam de abandono de seus patrões e falta de dinheiro, não só para combater, mas inclusive sobreviver. Quando já terminava este post, o presidente da França, Nicolas Sarkozy, através do Palácio Elisée, anunciava a retirada imediata dos seus quatro mil soldados do Afeganistão. Falcão incurável e um dos governantes franceses mais submissos a Washington, Sarkozy, como se sabe, era um dos maiores defensores da invasão do Afeganistão e da Líbia. Ele dizia que a vitória sobre Kadafi, seria “um passeio de uma semana”