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Crítica do filme O Garoto da Bicicleta

Sob a magia de verdadeiro conto de fadas moderno, com fundo moral sobre conceito de paternidade, os cineastas Jean-Pierre e Luc Dardenne mostram, em O Garoto da Bicicleta, premiado em Cannes, o comportamento rebelde e agressivo de um menino de 11 anos, deixado temporariamente num internato, que se recusa a acreditar no inacreditável, ou seja, que seu pai não quer mais saber dele.

Também autores do roteiro os Irmãos Dardenne, como são conhecidos, investem, uma vez mais, na linha da simplicidade. Dessa feita, eles acompanham o estilo de Truffaut (Os Incompreendidos) 1959, em termos de reflexo da vida, para narrar – dois anos após O Silêncio de Lorna – a história de Cyril Catou (Thomas Doret), que se desespera ao saber que seu pai, Guy Catou (Jérémie Renier), se mudou de apartamento, sem deixar o novo endereço, tendo vendido tudo, até mesmo a sua bicicleta.

Por sorte, Cyril, em suas andanças à procura do pai, conhece a cabeleireira Samantha (Cécile de France), que recompra de alguém a bicicleta mantida então sob sua posse. Samantha, ao devolver a Cyril a bicicleta, como uma fada-madrinha, aceita também atender ao pedido dele de passar, com ela, os fins de semana, ao custo de perder o namorado Gilles (Laurent Caron). É quando ambos saem, pela cidade, em busca de Guy, que, finalmente encontrado, trabalhando num restaurante, alega estar em dificuldade financeira e, por isso, sem condições de ter o filho com ele.

Outra pessoa, que se interessa por Cyril, é o traficante Wes (Ego Di Mateo), um tipo de lobo mau, que vive na floresta urbana, nas proximidades da casa de Samantha, já conhecedora de sua má fama. Apesar das advertências dela, Cyril se deixa influenciar por Wes, que o leva a cometer assalto ao dono de uma livraria (Fabrizio Rongione), de quem rouba boa soma em dinheiro. Temeroso de haver sido reconhecido durante o ato criminoso, Wes, dirigindo o carro pelas ruas da cidade, não aceita ficar com parte do dinheiro, que é levado por Cyril ao pai a fim de tirá-lo de suas dificuldades. Guy, entretanto, recusa-lhe a oferta e, de novo, lhe afirma não querer vê-lo nunca mais.

É dessa atitude dura de Guy para com Cyril no sentido de que assuma rumo na vida e responsabilidade sobre seus atos e da posterior cumplicidade do dono da livraria com o filho que, por vingança, atirara pedra em Cyril, podendo ter-lhe acarretado morte repentina, na queda da árvore, que os cineastas belgas extraem o fundamento moral de sua fábula sobre paternidade. Pela temática, fazem claras citações de De Sica, em Ladrões de Bicicletas (1948). Pela linguagem, eles sustentam a câmara fixa, criando intensa movimentação dentro do quadro, como os grandes clássicos americanos. O notável é que, de forma inédita, eles usam música (um Adagio de Beethoven) como elemento de estrutura e de pontuação da narrativa.

Dos atores, pode-se dizer que Jérémie Renier, um dos mais premiados intérpretes belgas, residente na França, é o preferido dos Irmãos Dardenne, responsáveis por sua estreia no cinema em A Promessa (1996). Mas ele se tornou conhecido em A Criança (2005), que deu aos cineastas a Palma de Ouro de Cannes. Renier, como sempre, está irrepreensível. Inquieto, durante todo o tempo, ele, na pele de Guy, evita fixar o filho, que, por sua vez, não se conforma com a separação dolorosa que o pai lhe quer impingir. Thomas Doret, como Cyril, demonstra talento promissor, numa atuação vibrante, digna de ator experiente. E Cécile de France, também de origem belga, mas que atua regularmente no cinema francês, tendo integrado o elenco de Além da Vida (2010), de Clint Eastwood, enfrenta, com desenvoltura, o papel difícil de uma pessoa boa, magnânima, como Samantha, sem deixá-la cair, em nenhum momento, na pieguice barata.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
O GAROTO DA BICICLETA
LE GAMIN AU VÉLO
Bélgica, França e Itália (2011)
Duração 87 minutos
Direção – Jean-Pierre e Luc Dardenne
Roteiro – Jean-Pierre e Luc Dardenne
Produção – Jean-Pierre e Luc Dardenne e Denis Freyd
Fotografia – Alain Marcoen
Edição – Marie-Hélène Dozot
Trilha Sonora – Jean-Pierre e Luc Dardenne
Elenco – Thomas Doret (Cyril Catou), Cécile de France (Samantha), Jérémie Renier (Guy Catou), Fabrizio Rongione (dono da livraria), Egon di Mateo (Wes), Olivier Gourmet (dono do bar), Laurent Caron (Gilles), Michèle Romus ( avó de Wes).

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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