As eleições são democráticas não propriamente pelo que produzem, mas pelo que revelam. Examinemos o caso deste político mineiro ungido como rapaz maravilha e defensor da moralidade e da ética, e o da líder ecológica paladina da nova política. Apenas alguns dias de debates na TV, de horário eleitoral e de interação nas redes sociais foram suficientes para que eles mesmos se desnudassem diante de um eleitorado estarrecido e indignado.
O primeiro admitiu ter sido funcionário fantasma desde quando mal tinha saído da adolescência e, já como governador de seu Estado, ter construído aeroportos nas terras de parentes, onde costuma passar férias. A segunda, que costuma alardear sua origem sofrida no Acre, não conseguiu explicar porque não declarou ao Imposto de Renda os financiamentos internacionais que recebeu para as suas ONGs e sua conta bancária, nem que tipo de neopolítica é essa que a levou a fazer acordos com o que há de mais retrógrado na política brasileira.
E dizer que nossos filhos costumam surfar nessas ondas midiáticas. Pequena dose de reflexão é suficiente para entender a gênese desses fenômenos que surgem a cada eleição presidencial. Beneficiados com gordos espaços nos meios de comunicação, sobretudo de TV, esses tipos se infiltram no imaginário popular como portadores de poderes mágicos capazes de acabar com a corrupção, a criminalidade e a inflação, males crônicos que todos abominamos.
Ninguém até há pouco podia questioná-los, porque todas as TVs, rádios e jornais, proclamam em uníssono suas qualidades, enquanto desmontam eventuais adversários com doses cavalares de denúncias de corrupção, mal feitos e até de falta de honradez pessoal. Como esses adversários jamais conseguiriam espaços para projetar-se defender-se da ubíqua mídia, eles logo tendem a cair na descrença e na má vontade da grande maioria das pessoas. Já os elegidos pelos deuses se arvoram em líderes impolutos, com assento garantido nos primeiros lugares das pesquisas de opinião, outro aparato midiático de igual característica manipulatória.
Aécio Neves e Marina Silva tendiam a repetir com êxito o papel de seus antecessores na nossa história política. Antigamente, o monopólio da informação exercido pelos grandes veículos conseguia derrubar presidentes em pleno exercício do mandato constitucional (casos de Getúlio, em 1954, e de Jango, em 1964), pelo golpe armado, ou ou por manobras legais e eleitorais, impingindo a bel prazer seus candidatos. Getúlio foi levado ao suicídio, no último ano de governo, em 1954, devido a uma campanha de desmoralização liderada pelo jornalista Carlos Lacerda, tendo como sustentáculo as grandes cadeias de comunicação da época – Diários Associados, O Globo e O Estado de S. Paulo. O mesmo Lacerda, os mesmos veículos de comunicação e a mesma mensagem reacionária depuseram João Goulart, no meio do governo, e instauraram uma ditadura cívico-militar de 22 anos.
Mais recentemente, tivemos os golpes eleitorais que propulsionaram Fernando Collor (1989) e Fernando Henrique Cardoso, o FHC, este último ganhando duas vezes a presidência de virada a eleição de primeiro turno, em 1994 e 1998. Na rabeira ficavam os candidatos autênticos de movimentos populares e nacionalistas Leonel Brizola e Luís Inácio Lula da Silva.
Nesta eleição de 2014, contudo, as novas ferramentas de comunicação tiveram um papel mais decisivo. Elas propiciaram o revigoramento do horário eleitoral em cadeia nacional de rádio e televisão, com os partidos políticos recebendo espaço proporcional às suas forças no Congresso, e o desenvolvimento das redes sociais na internet. Dessa forma, os candidatos não bafejados pela mídia tiveram algum espaço de comunicação para, não só apresentar seus programas alternativos de governo, como mostrar a face verdadeira de seus adversários. E também forçaram as grandes redes de TV, pelo receio de perder audiência, a fazer debates mais equitativos.
Tudo dentro das regras da transparência, com o saudável confronto de ideias, currículos e vida pregressa, cada lado tendo igual espaço e tempo para defender-se. A mídia hegemônica, por ter perdido seu poder absoluto de monopólio da verdade e da opinião, tenta agora rotular de “baixaria” e “jogo de vale-tudo” a saudável prática, quando viu de repente desmontadas suas manobras de desinformação e de manipulação, no seu afã de continuar mandando e ditando regras para os três poderes da República.
Se a verdade eleitoral prevalecer e não for vítima da reedição de um escândalo Proconsult, como ocorreu em 1982, poderemos ter as primeiras eleições verdadeiramente democráticas no Brasil, desde 1950. Mas o perigo da fraude da urna eletrônica ainda persiste, sobretudo porque conhecemos a história de eleições roubadas com o maior descaramento no México e mesmo nos Estados Unidos. De qualquer maneira, valeu a experiência de fazer prevalecer a verdade sobre os novos fariseus.
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