(Por Helena Iono, correspondente em Buenos Aires) – No último sábado, dia 13 de dezembro, mais de 100 mil pessoas marcharam em Buenos Aires em direção à Praça de Maio, diante da Casa Rosada, manifestando alegria e decisão de luta, próprias do povo argentino, em apoio ao governo de Cristina Kirchner, comemorando os 31 anos de democracia e direitos humanos conquistados após o período ditatorial. Direitos humanos na verdadeira acepção da palavra: do direito à palavra, à recuperação da memória sobre os desaparecidos, justiça contra os crimes da ditadura, abertura político-social à luta das mães e avós da Praça de Maio, às conquistas básicas da vida do povo argentino no campo da educação (o maior nível da América Latina reconhecido pela ONU), da ciência e tecnologia, da saúde, habitação, dos transportes coletivos, ferroviários, aéreos etc… Nestor Kirchner está presente em várias faixas e bandeiras acenadas, na memória e voz deste povo manifestante, reconhecido como verdadeiro precursor da democracia e dos direitos humanos na Argentina a partir do momento em que decidiu enfrentar o FMI, e desde que na IV Cúpula das Américas, realizada em novembro de 2005 em Mar Del Plata,, junto a Hugo Chávez, Lula e vários presidentes latino-americanos, deu um empurrão no enterro da ALCA.
Veja o vídeo de nossa cobertura em Buenos Aires
Trinta e um anos de democracia, direitos humanos e soberania nacional. Para isso, cordões de movimentos sociais, vindos de várias partes do país e da província de Buenos Aires, na sua maioria jovens, mas também famílias inteiras, crianças, organizados em torno a bandeiras como “La Cámpora”, “Unidos e Organizados”, “Nuevo Encuentro”, “Kolina”, “Movimiento Evita”, “Los Descamisados”, “Partido Comunista da Argentina”, CTA, e outros, peronistas, independentes, etc… É um grande mérito desta esquerda argentina que, não obstante a separação em vários movimentos, são disciplinados, ordenados e centralizados num clamor unitário na defesa deste governo e da soberania nacional. É sua característica fundamental, a composição juvenil que a nós, brasileiros causa inveja, após termos visto milhares de jovens nas chamadas jornadas de junho de 2013, alguns com boas intenções e causas justas, mas na sua maioria, manipulados pelo apartidarismo, anti-PTismo e, outros pela direita, pelos black-blocks e fascistas. Há muito que aprender da juventude organizada e participativa que apoia e dialoga com os governos progressistas como na Venezuela ou na Argentina; e dos dirigentes destes governos que têm sabido estabelecer este diálogo, utilizando mídia própria que visibilise este diálogo para a inteira sociedade.
A TV Pública da Argentina está presente nos atos e difunde na íntegra o discurso presidencial ao vivo. O governo aprovou a Lei da Mídia, retirou o poder dos grandes grupos midiáticos como Clarin, e fortaleceu as TVs comunitárias, universitárias e sindicais. Cooperativas de áudio-visuais, como “Unidos e Organizados TV”com apoio estatal, cobrem e difundem os atos de mobilização social. Jornais populares como “O Argentino” circulam gratuitamente no metrô. “El Tiempo”, “Página 12” difundem e explicam medidas governamentais e o debate social. Tudo isso constitui a teia de medidas públicas que faz com que a juventude adquira tal nível de consciência, mesmo os que estavam ainda nascendo na época da ditadura. Não olvidemos que o orgulho deste povo ter gerado um Che Guevara, e um forte movimento nacionalista-social da época Peron/Evita, são patrimônio histórico. Alguns entrevistados, como Silvia Tules do Ateneu Popular Arturo Jauretche, de Santa Fé, demonstram como estão informados sobre o Brasil.
Discurso de Cristina
Dizem: “Aqui lutamos contra a ditadura e recuperamos os direitos humanos, como vocês no Brasil; Dilma também lutou e se emocionou perante o relatório da Comissão da Verdade sobre os mortos na ditadura no Brasil”. Vejam casos de grande consciência como a entrevista dada tempos atrás pelo menino argentino de 11 anos, Casey Wander, ao qual se referiu Cristina Kirchner no seu discurso de sábado. https://www.youtube.com/watch?v=Puog35Y2u-k . Ele não surge do nada; ele demonstra um nível de debate, de discussão nas famílias, nas escolas, e a atitude da presidenta ao divulgá-lo é um chamado a que a sociedade incorpore esta força na transformação social. O presidente uruguaio José Mujica, deixou uma emotiva mensagem na recente reunião de Unasul no Equador em que reinvidica o papel da juventude. O clamor das mães e familiares dos 43 estudantes desaparecidos em Ayotzinapa no México, “Sem os jovens, não há futuro!” é uma realidade incontornável que repercutirá em toda a América Latina e mundo.
No momento em que fizemos a cobertura desta manifestação, às 15h da tarde, havia um sol esplêndido que aquecia o entusiasmo e a decisão de luta dos manifestantes. A partir das 18h da tarde, uma chuva torrencial abateu-se sobre a praça e a inteira Buenos Aires. Isso fez com que Cristina Kirchner desse o seu esperado discurso das 19h30 no Salão das Mulheres dentro da Casa Rosada, a seu contragosto e por ordem da segurança presidencial. Além do Hino Nacional entoado com cadência de cântico pela Companhia Nacional de Charangos, quase no estilo da Missa Criolla em forma folclórica no renovado Vaticano do papa Francisco, abriu-se espaço a comemorar os Direitos Humanos com um ato emocionante onde o neto (reaparecido) de Estela de Carlotto, Ignacio Guido Montoya Carlotto no piano e o cantor Palo Pandolfo executaram a canção “Os dinossauros” (com alusão aos torturadores) de Chady Garcia.
O menino Casey Wonder e suas convicções
E a intolerância da TV do Clarín
No seu discurso, Cristina ataca novamente os Fundos Abutres e os mecanismos de pressão, golpes que antes se realizavam “com os canhões e agora se fazem com as armas do mercado”. Denuncia o poder judiciário e seus interessados ataques desestabilizadores ao poder executivo. Temos mecanismos muito similares no Brasil, nos ataques ao chamado “mensalão” e à “corrupção na Petrobrás”. Só que Cristina, sem papas nas línguas, enfrenta e denuncia o mecanismo e autores de falsas ações “anti-corrupção”. Cristina reitera que não é candidata para as próximas presidenciais e reitera que os candidatos devem ser em base a projetos e não indivíduos. Vejam o discurso no vídeo acima ou seu texto no site http://www.cfkargentina.com/discurso-de-cristina-kirchner-en-el-festejo-de-31-anos-de-democracia-en-argentina/
Não obstante a chuva torrencial da tarde, uma multidão enorme manteve a Praça de Maio repleta. Ao final, Cristina, que comemora também a entrada ao último ano do seu mandato, decidiu desobedecer as ordens da segurança, subiu ao palco externo que havia sido preparada para ela e os vários shows musicais, e em honra ao povo tenaz e à pátria soberana, mandou um outro discurso final, com uma chuva de ideias e forte emoção ovacionado pela multidão.
Vejam o vídeo produzido pela TV CIDADE LIVRE http://youtu.be/g5yaKooxptU; que sirva de estímulo para que o dia 2 de janeiro de 2015, na posse da presidenta Dilma, siga-se este exemplo e que seja também um dia de festa e de luta do povo brasileiro, na defesa do quarto governo democrático, dos direitos humanos, da estatização total da Petrobrás e da continuidade dos projetos sociais no Brasil iniciados com Lula.
H. Iono
TV Cidade Livre
16 de dezembro de 2014
Na Argentina, a população mantém viva a chama da democracia de forma também VIVA. Cidadãos vão às ruas expressar o seu apreço pelas liberdades democráticas, certamente com a lembrança viva na memória do que foram os anos de chumbo da Ditadura Militar que torturou e matou tantos… No Brasil se construiu um memorial de concreto…