O governo da Argentina anunciou que vai solicitar às universidades e instituições jornalísticas que analisem se o jornal La Nación e o noticiário Telenoche do Canal 13, pertencente ao grupo Clarín, incorreram em “falta grave de ética e do exercício da profissão de jornalismo”. Em comunicado oficial, assinado pelo secretário-geral da Presidência da Nação, Oscar Parrilli, e depois de vários assédios midiáticos contra a presidenta Cristina Kirchner, o vice-presidente Amado Boudou, e seus ministros, inclusive o comandante-em-chefe das Forças Armadas, general César Milani, o governo acusa esses veículos da imprensa de “mentir e difamar, com a intenção de provocar animosidade contra o governo” e “desacreditar as obras realizadas na Casa Rosada” (sede do governo).
Expedido logo depois de um despacho do secretário-geral com a presidenta Cristina na tarde desta quinta-feira, 9/01/145, o que indica seu imprimatur, o comunicado foi motivado por aquela reportagem do La Nación e reproduzida pela TV do Clarín (os dois jornais se dizem empresas independentes, mas se retroalimentam numa campanha ensandecida para desestabilizar o governo), intitulada “A Casa Rosada estará protegida dos cortes” (de eletricidade), numa alusão à crise gerada pelos cortes de luz no calor de dezembro último, que afetou alguns bairros de Buenos Aires e cidades vizinhas (Conurbano).
Segundo Raul Parrilli, na terça-feira, sete de janeiro de 2014, às 4.49 da tarde, uma das jornalistas (a reportagem é assinada por Iván Ruiz y Maia Jastreblansky ) que escreveram a matéria solicitou por email informações da obra”, mas, ” no dia seguinte, sem esperar a resposta, a matéria era publicada e, à noite, reproduzida pelo Canal 13″. Isto demonstra, segundo o secretário, que “o pedido de informação foi uma mera farsa, não lhe importando nem a resposta nem a verdade” e que “seu conteúdo tinha sido decidido com antecedência”.
Com efeito, a investida desses dois maiores aparatos de mídia, que dominam 90% da informação naquele país vizinho, vem se intensificando com insistentes notícias manipuladas, que vão, desde estas “denúncias” contra a Casa Rosada a intrigas contra a indicação do novo comandante em chefe das Forças Armadas, um tenente general (maior patente do Exército), recentemente promovido pela presidenta. César Milani, por se declarar peronista e um adepto do projeto nacional de Cristina, passou a ser hostilizado, com reportagens negativas e denúncias fajutas, que o governo desmoralizou com o simples cotejo dos fatos reais. Tais notícias, como ocorrem nas manobras desestabilizadoras de governos populares, são depois repetidas e multiplicadas ad infinitum nas centenas de canais de rádio, TVs e jornais ainda mantidas por Nación e Clarín. Esses dois também sustentam poderosas ramificações nas redes sociais da internet, sempre estimulando o ódio e a intolerância contra a mandatária, seus auxiliares e as realizações governamentais. Isto sem falar na repercussão internacional delas através dos principais veículos hegemônicos da América Latina, Estados Unidos, Europa etc.
As medidas legais, como a nova lei da mídia, editada em 2008 e referendada pela Suprema Corte, em novembro de 2013, e os recursos judiciais adotados pelo governo revelaram-se impotentes até aqui para conter o abuso midiático, devido ao envolvimento do poder judiciário na conspiração. Exemplo disso é que uma liminar desobriga há 10 anos o jornal La Nación de pagar uma dívida com o fisco federal de 330 milhões de pesos. Outro dado flagrantemente ilegal é o de que quatro dos sete ministros da Suprema Corte já terem ultrapassado a idade máxima de 75 anos para continuar no cargo, sendo que um dos quais, Carlos Fayt, vai completar 96 anos, agora no dia primeiro de fevereiro. Por se tratar de uma instância terminal, contra a qual não cabe recurso e por desfrutar d proteção mafiosa da mídia e do poder econômico, uma disposição “interna” da Corte, assinada pelos sete ministros, assegura esta anomalia. Além das universidades nacionais, muitas delas credenciadas por posições históricas contra a tortura e outros abusos da época da ditadura, o governo anunciou que pretende consultar as seguintes organizações jornalísticas: ADEPA ( Asociación de Entidades Periodísticas Argentina ), FOPEA ( Foro Periodismo Argentino), AFERA ( Asociación Federal de Editores de la República Argentina); CELS (Centro de Estudios Legales y sociales) e Facultades de Periodismo e Comunicación Social das Universidades públicas e privadas.
O governo vê-se assim impelido a recorrer à opinião pública, através de suas entidades mais credenciadas, como as universidades e as associações jornalísticas, para varar o cerco midiático, contra o qual tem ganhado algumas vitórias históricas, como a lei de mídia, os triunfos eleitorais da presidenta Cristina Fernández, que se reelegeu com 54% dos votos contra 17% do segundo colocado, em 2011, e sua atual aprovação popular de mais de 50%, além de ter conseguido emplacar, aos trancos e barrancos, seu projeto estratégico nacional e contra os monopólios, nos últimos dez anos (período que inclui os quatro anos de seu finado marido e antecesor Néstor Kirchner). O simples fato de o governo manter-se de pé, em meio a todo este tiroteio, que ainda inclui ataque especulativo contra a moeda, incitamento a greves e tentativas contra a ordem econômica, com as mesmas técnicas que derrubaram Salvador Allende, no Chile, em 1973, e fracassaram na deposição de Hugo Chávez, na Venezuela, em 2002.
Mobilizando as universidades e as entidades jornalísticas para examinar e se posicionar contra o golpismo da mídia, o governo espera, juntamente com o apoio de que já dispõe dentro dos movimentos sociais, estudantes, juventude e o velho mais ainda robusto aparato peronista, o governo espera se contrapor mais uma vez ao golpe, como o fez na crise com os ruralistas, em 2008, também incentivada por La Nación e Clarín, quando houve até ameaça de desabastecimento e paralisação da economia econômica. Esta crise, que ocorreu por causa da taxação das exportações para estimular o mercado interno, redundo na derrota nas eleições parciais para o Congresso, em 2009, na qual foi abatido o ex-presidente Néstor Kirchner, que disputava o primeiro lugar na corrida para uma cadeira na Câmara dos Deputados. Mais recentemente, em outubro de 2013, a presidenta sofreu novo revés eleitoral, embora seus partidários tenham mantido a maioria em ambas as casas do Parlamento.
Casa Rosada – Junto com o comunicado, o governo divulgou um informe técnico “que seria entregue à jornalista que enviou o email, com a verdade sobre as obras que se vêm realizando na Casa Rosada há sete anos, tanto no interior como no exterior da mesma, por expressa determinação da Presidenta, com o fim de manter, conservar, restaurar e modernizar todas as instalações, dependências, lugares históricos, serviços e anexos”. Uma das principais atrações turísticas e monumento ícone da história argentina, a Casa Rosada, como frisa o estudo, foi visitada de 2009 a 2014 por 2.679.783 pessoas, das quais 979.783 são estrangeiras.
Explica finalmente o comunicado: “Os jornalistas que cobrem a Casa se deram conta disso em várias matérias e reportagens, salvo obviamente La Nacióon e o Clarín, que parecem irritados com o fato de a República Argentina ter uma sede do Governo Nacional digna e conservada, resgatando sua história e onde todos os argentinos nos possamos sentir orgulhosos”. O comunicado também relata as obras eléctricas na Rosada desde 2008, entre as quais se encontra um projeto para aumentar a confiabilidad eléctrica, com a substituição de um gerador”. Por fim, o governo adverte que “mentir e difamar por parte destes veículos de comunicação não é “novo”, daí que a responsabilidade ética e política não recai sobre os jrnalistas… e sim, pura e exclusivamente, sobre o Sr. Bartolomé Mitre, editor responsável do jornal La Nación e sobre o Sr. Héctor Magneto, CEO do grupo de multimídia Clarín, Canal 13 y TN (canal Todo Noíticias)”
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