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Crítica do filme Destinos Ligados

A instabilidade da alma feminina causada pela doação ou pela adoção de criança é o tema de Destinos Ligados, escrito e dirigido pelo colombiano Rodrigo García, produzido pelo mexicano Alejandro González Iñárritu e exemplarmente interpretado por Annette Bening, Naomi Watts e Samuel L. Jackson. O filme concorreu, no ano passado, aos Festivais Sundance e de Toronto, no Canadá.

García (Nove Vidas) tece bem um roteiro esquemático em que combina histórias de pessoas que, um dia, se separaram, mas que, ao longo do tempo, voltaram a se relacionar por si próprias ou por seus herdeiros. Para que isso se concretize, como é comum acontecer, os episódios vão se sucedendo e várias personagens periféricas vão desaparecendo, sem, às vezes, justificativa, para que apenas o núcleo central permaneça.

Ao ficar grávida aos catorze anos, Karen (Annette Bening) decidiu encaminhar a filha para adoção, o que fez dela, fisioterapeuta, já cinquentona, uma mulher amarga, que cuida da mãe Nora (Eileen Ryan), moribunda, a qual também não a perdoa por isso. Com trinta e sete anos, Elizabeth (Naomi Watts) é uma advogada bem sucedida, que, vinda do interior da Califórnia, se apresenta para trabalhar num reputado escritório de Los Angeles, comandado por Paul (Samuel L. Jackson).

Por sua vez, o casal Lucy (Kerry Washington) e Joseph (David Ramsey) procura a Irmã Joana (Cherry Jones) para se inteirar dos trâmites do processo legal de adoção de uma criança, que ainda está para nascer. A doadora Cristi (Simone Lopez), que, insistindo nesse intento, contraria a vontade da mãe Melissa (Gloria Garayua), depois de recusar várias propostas, quer entrevistar o casal para saber qual será a orientação educacional e religiosa que dará ao seu filho,

A dificuldade de relacionamento com as pessoas e até certa ponta de perversidade são traços característicos das personalidades de Karen e de Elizabeth, mãe e filha. A primeira, após a morte da mãe, sente-se atraída por um colega de profissão (Bradford Alex), mas, apesar disso, trata-o mal e com desprezo. A segunda seduz Paul, seu chefe, um viúvo, preso à memória da mulher, para lhe determinar sua vontade, e ao mesmo tempo, Steven (Marc Blucas), um vizinho, para incompatibilizá-lo com a esposa Tracy (Carla Gallo).

A linguagem de García – filho do escritor Gabriel García Márquez – é naturalista e sem qualquer concessão à pieguice. Por isso, ele sabe evitar que algumas sequências – como as que ocorrem em clínicas médicas, por exemplo – resvalem para o melodramático ou para o simplório. Tem ele assim perfeita noção de como conduzir a narrativa, explorando detalhes significativos tanto para a fixação do perfil psicológico das personagens, como para a compreensão do aspecto social do tema abordado.

A qualidade da película, entretanto, está centrada na interpretação dos atores, especialmente na de Annette Bening (Beleza Americana), que, rica em nuanças, empresta uma máscara dramática impressionante a Karen. O que lhe resta na lembrança é a filha, que ela, na juventude, entregou à doação para alguém criar. Na data de seu aniversário – a criança nasceu no dia 7 de novembro de 1973 -, Karen se atormenta, indagando à mãe: – Como será ela hoje, aos trinta e sete anos?… Onde será que mora? Mas Bening prepara também, de forma magnífica, a suave mutação que se vai operando no interior da personagem depois que ela consegue se aproximar do terapeuta de quem gosta. Observe-se, a propósito, que, apesar do abrandamento de sentimento de Karen em relação a crianças, a atriz mantém, ao longo do tempo, os músculos da face contraídos como marca indelével do arrependimento da protagonista.

Naomi Watts ( Trama Internacional ) é, nas cenas de sexo, com Paul e com Steven, que ela melhor define o perfil psicológico de Elizabeth. Ao primeiro, ela determina; ao segundo, desafia. A personagem não tem mãos a medir para impor o seu autoritarismo. Desde quando é entrevistada por Paul, no escritório, Elizabeth é incisiva em suas afirmativas: – É bom saber que terei de me reportar a um homem, não a uma mulher!… Mas o melhor mesmo é maneira sutil pela qual Watts expõe o racismo de sua personagem em relação ao filho que traz no ventre, já que não sabe se ele é de Paul (negro) ou de Steven… Samuel L. Jackson e os demais integrantes do elenco estão igualmente muito bem, defendendo os seus respectivos papéis de acordo com a linha de direção imposta por García.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
DESTINOS LIGADOS
MOTHER AND CHILD
EUA/ Espanha/ 2009
Duração – 125 minutos
Direção – Rodrigo García
Roteiro – Rodrigo García
Produção – Alejandro González Iñárritu, Lisa Maria Falcone, Julie Lynn
Fotografia – Xavier Pérez Grobet
Música Original – Ed Shearmur
Edição – Steven Weisberg
Elenco – Annette Bening (Karen), Naomi Watts (Elizabeth), Samuel L. Jackson (Paul), Kerry Washington (Lucy), Marc Blucas (Steven), Carla Gallo (Tracy), Amy Brenneman (Dra. Stone), Simone Lopez (Cristi), David Ramsey (Joseph), Cherry Jones (Irmã Joana), Eileen Ryan (Nora), Gloria Garayua (Melissa).

leitefo
leitefo
Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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2 COMENTÁRIOS

  1. Eu simplesmente adorei esse filme. Sutil, inteligente e mostra como nós mulheres somos passíveis de elaborações. O diretor só podia ser filho do Gabo.

  2. Amei o filme e tambem a critica, mas nao me oassou a ideia que Elizabeth tinha preconceito em relacao o cor do filho. Me pareceu apenas preocupada em manter sua independencia sem falar na duvida de quem poderia ser o pai.

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