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Entendendo o trabalhismo no comando do Brasil

Por Geniberto Paiva Campos – Brasília/DF – Janeiro, 2016(*)

“Se caminhardes à frente das ideias de vosso século, essas ideias vos acompanharão e sustentarão. / Se caminhardes atrás delas, elas vos arrastarão. / Se caminhardes contra elas, elas vos derrubarão.” (Napoleão III, 1841)

O terceiro período histórico dos governos trabalhistas no Brasil se inicia no final de 2002, com a vitória de Luis Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições presidenciais.
Os mandatos do presidente Lula (2003/2010) reconstituíram a sequência do governo democrático de Getúlio Vargas (1951/1954) e de João Goulart (1961/1964). Ambos interrompidos por intervenções militares, diretas ou indiretas, com forte apoio das classes médias, por terem cometido “erros históricos irreparáveis”:

– Getúlio Vargas, entre outros, ao criar a PETROBRÁS e a ELETROBRÁS; promulgar as LEIS DE DIREITOS TRABALHISTAS/CLT e a LEI DE REMESSA DE LUCROS; e ser o responsável pela construção da usina siderúrgica de VOLTA REDONDA. E, imperdoável! manter um diálogo franco e direto com os “TRABALHADORES DO BRASIL”. A elite patrícia, intransigente moralista, descobriu e denunciou a existência de “UM MAR DE LAMA” no Catete, sede do governo federal no Rio de Janeiro. Sob enorme pressão, Getúlio cometeu suicídio, deixando uma carta-testamento ao povo brasileiro, um dos maiores legados políticos contemporâneos.

– João Goulart deu início aos seus “erros”, ainda como Ministro do Trabalho do governo Getúlio Vargas: ao duplicar o valor do salário mínimo, foi derrubado por um “manifesto dos coronéis”, que exigiu a sua demissão. Mais tarde, como vice-presidente da República, Goulart substituiu Jânio Quadros, o qual tomou a decisão – até hoje, mal explicada- de renunciar, após sete meses de mandato. Vetado pelos militares, Jango somente pôde assumir no sistema parlamentarista. O seu governo (depois presidencialista, por decisão amplamente majoritária de eum referendo popular) foi uma sucessão de crises políticas.

Goulart pretendia fazer as “reformas de base” e ampliar os direitos trabalhistas para os homens do campo. Contra ele foi habilmente construído por segmentos da classe média, com decisivo apoio político e midiático, um forte sentimento anticomunista. “Jango pretendia cubanizar o Brasil e criar uma “REPÚBLICA SINDICALISTA”, (algo esotérico, assemelhado ao “mar de lama” do Catete). Carlos Lacerda, então governador do estado da Guanabara e outros políticos udenistas, , foram bater às portas dos quartéis em busca de apoio militar para a derrubada do governo Goulart. Esta veio a se consumar em abril de 1964. Goulart foi para o exílio, onde faleceu. Quando foi deposto, o seu governo tinha mais de 70% de aprovação do povo brasileiro. Os militares no poder governaram o Brasil por 21 anos (1964/1985)

A elite brasileira imaginava que o governo trabalhista do presidente Lula fosse apenas um incômodo passageiro, uma espécie de virose da infância, para a qual ainda não havia vacina. A possibilidade de reeleição presidencial, no entanto, criou novas condições políticas e eleitorais no país.cA reeleição foi aprovada como uma espécie de “arranjo” – até hoje muito mal explicado – visando acomodar a ausência de uma candidatura governista viável para a sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Essa norma viria a acarretar mudanças significativas no cenário político então vigente no país desde a Velha República, com o intervalo da ditadura Vargas (1930/1945).

Se o governo FHC colocou algumas “cascas de banana” no caminho futuro dos governos trabalhistas – como, por exemplo, a “Lei de Responsabilidade Fiscal” – a reeleição presidencial, de forma surpreendente, encaixou perfeitamente nas expectativas de longevidade do Partido dos Trabalhadores no poder central do país. A
chegada do PT ao governo federal não significou, nem de longe, uma revolução social plena. Sequer mudanças estruturais profundas. A área econômico-financeira permaneceu livre, intocada. E com os seus lucros garantidos.

Na realidade, abriram-se as possibilidades para a execução de políticas de inclusão social, através de programas governamentais, que mesmo não fazendo o enfrentamento das estruturas garantidoras da desigualdade, conseguiu reduzir as seculares injustiças econômicas e sociais, embora modestamente. Mas o suficiente para inquietar as hostes neoliberais.
(Será que um longo período de justiça social e a garantia do “direito a ter direitos” não iria acostumar mal a ampla maioria de excluídos da população brasileira, “naturalizando” esses direitos?). Os avanços obtidos na área social foram significativos, no entanto.

Alguns breves e tímidos ensaios na área econômica foram suficientes para provocar a inquietação e a ira das elites: redução das taxas de juros (há uma crença arraigada –nunca provada – na classe média, que juros altos controlam a inflação); criação de um forte mercado consumidor interno; inserção do país nos “BRICS” (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), e o mais grave, com a implantação de um Banco próprio, natural competidor do Banco Mundial, este controlado pelos Estados Unidos.

Tornou-se, então, necessária a aplicação dos velhos e confiáveis métodos para derrubar governos trabalhistas. Sobretudo quando a elite percebeu algumas características do novo presidente Lula: capacidade de negociação política, visão estratégica e um surpreendente reconhecimento internacional. E, o perigo maior, as chances reais de reeleição.

Os até então infalíveis métodos de antigamente foram, então, acionados. Vestidos com roupagem adequada ao novo século, o “mar de lama” e a “república sindicalista” de outrora assumiram, agora, apelidos como “MENSALÃO” etc. Como, o método não foi eficaz para derrubar o governo e muito menos para impedir a reeleição do presidente Lula em 2006, por algum pérfido e insuspeitado motivo, a nova estratégia escolhida foi pela demonização e criminalização do Partido dos Trabalhadores. Desta vez contando com a decisiva participação de setores do Judiciário, líderes importantes do partido foram presos e condenados, mesmo sem provas ou evidências dos crimes cometidos.

Seguiram-se o “petrolão” (a operação de desmonte da Petrobrás) e a “lava jato”, denominações vulgares, mas com forte apelo midiático que, no entanto, não foram suficientes para impedir a eleição e a reeleição da presidente Dilma Roussef. O último evento eleitoral de 2014, a eleição presidencial com a inesperada vitória da presidente Dilma – o 4º triunfo seguido da coalizão governamental – colocou as lideranças oposicionistas num tremendo impasse: acatar democraticamente o resultado das urnas e se preparar para o próximo embate eleitoral ou partir para a adoção de métodos autoritários, sempre presentes ainda vigentes na cultura política latino – americana: apelar para a truculência, desestabilizar o governo e promover a sua derrubada. Mesmo às custas da paralisação do país e do engessamento da sua economia. E da quebra da ordem democrática.
Assim, ações tresloucadas da oposição marcaram 2015 como um “ano perdido”. Na realidade, uma “marcha da insensatez” das líideranças políticas oposicionistas que se mostraram incapazes de fazer a leitura correta dos novos tempos e das suas novas ideias.

Não seria o caso de inverter a direção e o sentido da pergunta sobre os “erros” dos governos trabalhistas, e questionar, severamente, as lideranças oposicionistas neoliberais: O QUE FAZ A ELITE BRASILEIRA TÃO OBSTUSA, INCAPAZ DE ENXERGAR PARA ONDE CAMINHAM AS IDEIAS DO SÉCULO ATUAL?

Vários pensadores e acadêmicos, brasileiros e do exterior, reconhecidamente sérios e conceituados, tentam – inutilmente, até agora – demonstrar que as formas de organização social, a relação capital x trabalho, a inserção da tecnologia, da criatividade e da inovação em todos os campos das relações humanas vêm modificando conceitos estabelecidos há séculos, introduzindo mudanças na produção, no consumo, nas Comunicações e nas formas de Ensino x Aprendizado, alterando profundamente os padrões educacionais e o acesso ao saber. A inserção de novos atores no processo político mostra-se um dos caminhos seguros para o aperfeiçoamento da Democracia e da Civilização. A busca da Igualdade e da Justiça Social não pode permanecer apenas como Utopia. O respeito e o cuidado com a Natureza, as políticas de preservação do Meio Ambiente constituem temas do interesse prioritário de todos os Povos. A Luta de Classes não constitui, nos tempos atuais, o motor único da História.

As elites, cada vez mais gananciosas e intolerantes, não poderão continuar pretendendo não apenas ganhar muito, MAS GANHAR TUDO. Em detrimento de um processo natural de divisão mais justa e igualitária das riquezas produzidas pelo trabalho humano. Valendo lembrar que as formas de organização política e social garantidoras da Desigualdade serão, cada vez mais, autoritárias, violentas e fascistas. A não aceitação da Diversidade, a cumplicidade com a Intolerância e a Injustiça nos afastarão, inexoravelmente, do Estado Democrático de Direito.
A quem interessa esse tipo de instituições públicas? Colocando uma questão ainda mais ousada, pertinente e direta: o que as elites brasileiras ganharam, efetivamente, nestas últimas décadas ao promoverem a instabilidade e a insegurança política?

Como esquecer, como apagar da memória histórica das nações latino-americanas acontecimentos recentes em que prevaleceu a barbárie, como se fôssemos, todos nós, seres primitivos – ou primatas – vivendo como animais irracionais? Aprisionados pela sede de lucro e de vantagens materiais, a justificar atos de covardia, de crueldade e violência extremas contra aqueles que apenas pensam diferente e cometem a ousadia de lutar pela Solidariedade, pela Democracia e pela Justiça?

Onde, então, estariam os inúmeros “erros” cometidos apenas pelos partidos que defendem a causa trabalhista? Mais justo e correto seria, talvez, cobrar da Elite a tarefa de assumir também os seus ERROS HISTÓRICOS RECORRENTES. Fruto da sua incapacidade de refletir sobre os ensinamentos da História. (Assim falou Kierkegard: ”Deve-se viver a vida olhando para a frente, mas só se pode entendê-la olhando para trás”) E buscar adquirir uma mínima visão estratégica dos complexos fatores que envolvem atualmente as relações humanas, sociais e econômicas. Impossíveis de serem percebidas, nos dias atuais, apenas com a visão imutável e estática de um tempo distante. Tempo em que o Capitalismo se tornou hegemônico, mas não imune às suas crises cíclicas. Como a crise atual (a enésima do Sistema),, iniciada em 2007/2008 e até agora sem sinais claros de resolução.

A lembrança ainda viva do nazifascismo deveria obrigar todas as lideranças políticas brasileiras a refletir sobre o futuro do país. Afinal, onde andam os nossos Estadistas? Se ainda existem, estariam dormindo sobre os louros da conquista de uma Democracia que imaginam definitiva, perene e segura? Não se trata aqui de fazer um uma convocação. Mas um chamamento à responsabilidade. Ao respeito às regras do jogo democrático.

O país não pode assistir impassível, inerte, às ações irresponsáveis de atores políticos de segunda classe, inconformados com as suas seguidas derrotas eleitorais, agora empenhados na destruição do regime democrático. Agindo, de forma ingênua e temerária, contra os mais sagrados interesses da nação bBrasil.eira. Ou seja, a preservação de um regime de liberdades, de preservação e garantia de Direitos, da defesa da Lei e do Espírito constitucional. Da Democracia, enfim.

Nós temos, sim e ainda, condições de escolher entre a Barbárie e a Civilização. É preciso dar um basta às soturnas articulações dos que trabalham para jogar o Brasil no abismo imprevisível do autoritarismo. De onde conseguimos nos livrar, recentemente, através do entendimento e da alta negociação política promovida, inteligentemente, por líderes sérios e responsáveis. Capazes de construir uma nova esperança, que batizaram de “NOVA REPÚBLICA”.

Não se imagina criar Vencedores e Vencidos. Mas preservar a Liberdade e a Democracia. Um regime da Paz e Justiça, onde TODOS serão vencedores.
Eis o verdadeiro desafio a ser enfrentado pela Nação Brasileira.
—–

(*) Geniberto Paiva Campos é médico cardiologista, em Brasília, e membro da Comissão de Justiça e Paz da CNBB.

leitefo
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Francisco das Chagas Leite Filho, repórter e analista político, nasceu em Sobral – Ceará, em 1947. Lá fez seus primeiros estudos e começou no jornalismo, através do rádio, aos 14 anos.
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