(Publicado originalmente em Seg, 15 de Dezembro de 2008 16:05)
Sharing my gold, sharing the world
Compartilhando vitórias, e não mísseis
Aylê-Salassiè, de Pequim
Sete anos de fome, sete de fartura. Foi assim que há 2.000 anos o Egito saiu da miséria, e é assim que a República Popular da China conseguiu montar a maior e mais completa Olimpíada de todos os tempos. Os chineses estão há sete anos concentrados num esforço nacional para o sucesso dos Jogos.Há quem diga por aqui que a China não será a mesma depois dessas Olimpíadas. Se selecionado para sediar os Jogos de 2016, o Brasil terá a mesma chance.
É muita energia e adrenalina direcionadas para o bem estar social. Não basta ter condições de construir grandes estádios, e montar esquemas de segurança com milhares de homens equipados com armamentos modernos. O sucesso de uma Olimpíada depende do homem, do grau de mobilização nacional que se consegue. É uma oportunidade de unir um país e promover mudanças radicais nas estruturas urbanas, econômicas e políticas arcaicas.
É preciso, entretanto, considerar que, embora mobilizem uma quantidade fabulosa de recursos, os Jogos Olímpicos não são empreendimentos exclusivamente esportivos ou econômicos, com pensam muitos, na expectativa de aproveitar-se da oportunidade para tirar vantagens pessoais ou privadas.O Brasil tem essa imagem por aqui. Uma Olimpíada expoe países e povos. Como uma expressão do esforço nacional e da dedicação pessoal, os jogos apresentam significados distintos. Os ricos querem demonstrar, com o número de medalhas nacionais a sua supremacia, embora os atletas em si desejem apenas verem-se recompensados ludicamente pelos seus esforços, e alguns estão felizes em somente competir . Para países pobres ou em desenvolvimento como o Brasil, sediar um evento mundial dessa magnitude è uma oportunidade impar de promover mudanças profundas nas estruturas da sociedade, como vem fazendo a China. Quanta coisa o Brasil poderia aprender com os chineses, e não necessariamente apenas com os norte-americanos.
Não tem uma cidade no Brasil que possa ser comparada hoje com a estrutura urbana de Pequim. A construção civil e as tecnologias em uso aqui revelam-se em obras aqui que pasmariam a criatividade de Oscar Niemeyer e seus seguidores . Nas Olimpíadas, o importante, entretanto, não è isso. É admirável a dedicação dos chineses, nesses últimos sete anos, à preparação para os Jogos. Durante todo esse período as academias, escolas, universidades e fábricas foram formando sistematicamente uma geração de atletas de primeira linha para competir na Beijing 2008.Um disciplina incomparável. É impressionante como o ouro cai fácil nas mãos dos chineses.
A concentração deles dá para ser observada nas coisas mais simples do cotidiano: nos hotéis, restaurantes nas lojas e nos próprios estádios, cujo atendimento è feito voluntariamente por estudantes. São 300 mil deles espalhados por todos os lugares. Sem serem atletas, eles vêm se preparando pessoalmenre durante anos, estudando diferentes línguas, sobretudo o inglês, procurando adaptar-se a novos hábitos e costumes, e mudando a própria rotina para dedicarem-se à preparação para os Jogos. E não hà compulsoriedade nenhuma nisso, como se pensa no Brasil , onde se vê “Pequim cercada por mísseis”. Hà uma adesão natural e uma alegria individual de cada um em dizer que está dando a sua contribuição. É uma solidariedade que há muito não se vê no Brasil.
Sem promessas de “bichos” ou de “salários” , junto com os atletas , eles formam um corpo único perseguindo o espaço mais alto do pódio para o seu paìs. I’m very excited now because al my efforts have finally been rewarded today: I,ve done it (“ Eu consegui”), gritava de alegria para suas colegas a jovem Li Shanshan, medalhista da ginástica. O prazer pessoal, não sobrepuja o orgulho de ter contribuído para que a China chegasse onde pretendeu.Nao se trata de política, mas de uma total adesão da população, sobretudo a mais jovem,a idéia da realização dos Jogos no país. Relata Li Shanshan que há muito tempo estivera total e pessoalmente concentrada junto com as colegas de equipe para as Olimpíadas, mas que agora, depois de cumprida a sua obrigação, vai retornar para casa, comemorar com sua família e amigos, e viver a sua vida de estudante.
O gigante Yao Ming, herói nacional no basquetebol, tirou US$ 2 milhóes de dólares da sua poupança pessoal – construída na NBA, dos Estados Unidos – para ajudar os desabrigados. Zou Khai, o jovem integrante da equipe de ginástica masculina da China, causou uma profunda comoção entre seus compatriotas, quando, ao falar emocionado, numa entrevista coletiva, sobre a experiência da vitória da equipe, disse que a compartilhava com os cidadãos da província de Sichuan, ocupados, dia e noite, na reconstuçao de suas casas, derrubadas pelos tremores de terra que, no dia 12 de setembro, e que deixaram milhares- sempre milhares – de pessoas sem teto na sua cidade de origem. Pararam para vê-lo competir.
Por essas razoes – e não outras – hà quem diga que a China não será a mesma depois dessas Olimpíadas. Eles estão em plena revolução cultural. Os Jogos trouxeram isso. Comentando a questão, um jornalista indiano, credenciado pelo Centro de Mìdia,dizia que “ A Índia não precisa de medalha olímpica”. Seu paìs conquistara a medalha no tiro, com Abhinav Bindra. Apesar da sua opinião aqui, Abhinay Bindra, único ouro da Índia atè então, estava naquele mesmo momento sendo ovacionado pelas ruas de Delhi como herói nacional: “ As long as the Sun” ( Que seja eterno como o sol) . Este é espìrito olímpico que mobiliza “mentes e corações”, e que nós brasileiros ainda precisamos captar, se quisermos ter sucesso em 2016.
*Projeto UCB Beijing 2008