FC Leite Filho
Autor de Quem tem medo de Hugo Chávez?
Caracas, 16/03/13 -Assim como na política, Hugo Chávez conseguiu unir a família. A carta de despedida da filha Maria Gabriela – “…Tiveste que voar e ser livre… Voa, voa livre Gigante, voa alto e sopra forte como os ventos dos furacões”… – ilustra o espírito de coesão de uma família de origem humilde, que poderia estar às turras para repartir o butim. O mesmo pode-se dizer dos militares, entre os quais não se viu uma só voz dicordante com relação aos destinos a tomar para preencher o imenso vazio deixado pela morte do comandante. Outra curiosidade é que, passados onze dias do desenlace presidencial, não se registrou uma rusga sequer no comando civil, que ele escolheu a dedo, a começar pelo agora presidente encarregado.
Bonachão, orador cativante, verborrágico, brincalhão e energético, Nicolás Maduro, o sucessor designado, não poderia ser um melhor alterego de Chávez. Ele dá a impressão de que não dorme há 20 dias, porque está em todas as reuniões de cúpula e manifestações populares, que varam pela madrugada, desde que se agravou o estado de saúde do presidente. Aos 50 anos, 1,99 de altura e parecendo um pouco mais delgado do que lhe mostram as fotografias, o candidato governista não deixa dúvida quanto à continuidade da obra bolivariana, como demonstrou em várias oportunidades em que teve de agir diante de provocações e assédios do poder econômico.
Fui vê-lo, pessoalmente, na quarta-feira, 13 de março,durante a inauguração da IX Feira Internacional do Livro (Filven), um dos grandes acontecimentos culturais da América Latina, no complexo do Teatro Teresa Carreño, em Caracas. Chegou com mais de três horas de atraso, não por negligência de horário, mas porque os serviços de inteligência haviam descoberto um plano para assassinar o candidato opositor Henrique Capriles Radonski, por parte da opositores extremistas, aparentemente obedecendo a ordens emanadas de Miami. Maduro disse que havia destacado, de comum acordo com a Direção Político-Militar do país, novo órgão surgido com o desenlace presidencial, um esquema de segurança à disposição de Capriles e da equipe deste.
Quem é Maduro – Com aparência descansada, o rosto redondo escanhoado e envergando uma túnica verde musgo , Maduro ouviu pacientemente os discursos de cunho literário da presidente da feira, do ministro da Cultura, do escritor homenageado Gustavo Pereira, e uma breve dissertação sobre dois livros. Quando chegou sua vez, falou quase uma hora, em que se defendeu das acusações de homofóbico, que lhe lançara Capriles na véspera. Disse que só tinha apresentado sua mulher, Cília Flores, a Advogada Geral do Governo, fato que o candidato tinha interpretado como uma insinuação às alegações de que o respresentante oposicioista, solteiro e bonitão de 40 anos, seria gay.
Na verdade, Maduro, em alocução anterior, havia dito, na apresentação de Cília, os filhos e os netos, no lançamento de sua candidatura, que “gostava de mulheres”, uma alfinetada, quw logicamente não poderia passar despercebida. O candidato governista faz questão de lembrar sua infância pobre, numa casa de taipa e chão de barro, a mesma de Cília, que, antes de licenciar-se em Direito, teve a casa invadida várias vezes pela polícia, na busca de marginais do morro em que residia. Por fim, Capriles, que estava acompanhado da mulher, disse que Cília não será primeira dama, quando for eleito, mas a primeira combatente entre as mulheres para defender o legao de Hugo Chávez. No discurso da Filven, Nicolas Maduro ainda dialogou com vários dos presentes, que faziam questão de manifestar-se, e à saída cumprimentou e tirou fotografias.
Quanto a Henrique Capriles, este começou mal a campanha, lançando acusações aparentemente sem nexo contra a família do presidente, que teria escondido a gravidade de sua doença e mesmo sua morte, que teria ocorrido antes do regresso definitivo de Cuba à Venezuela. Ato de provocação deliberada para gerar o pânico ou desespero diante de uma situação eleitoral francamente desfavorável? O fato é que as declarações provocaram forte indignação, mesmo entre os correligionários oposicionistas e Capriles sentiu-se obrigado a retratar-se pedir desculpas. Entre as reações à postura do oposicionista, destaca-se a de Maria Gabriela Chávez, que rápida como uma leoa, saiu de sua discrição e recolhimento para dizer: “Não joguem mais com a dor de um povo e uma família, que está devastada diante desta dura realidade. Aos senhores desta oposição doente e especialmente ao Sr. Capriles, digo o seguinte: Sempre se disse que a política é suja. Senhores, pelo bem da pátria, os exorto a fazer política e a não ser tão sujos”.
Militarismo – O brasileiro que visita Caracas, a princípio, estranha a devoção que os venezuelanos tem pelos militares. Eles são aplaudidos na rua, exaltados nos dicursos e muito queridos, sobretudo por sua relativa juventude, particularmente entre os soldados, quase imberbes. Mas há uma explicação: os militares forjados por Hugo Chávez, ao longo de sua peregrinação militar, desde que entrou no Exército há 40 anos, tornaram-se homens próximos do povo, porque se distanciavam dos políticos que, na época, envolviam-se na mais desbragada corrupção, que fazia da rica Venezuela em petróleo, um país com 70% de miséria.
Junto com o tenente paraquedista, os militares venezuelanos, que antes haviam recebido, como os brasileiros, as noções castrenses de segurança nacional e guerra psicológica contra o comunismo passadas pelos Estados Unidos, construíram estradas, escolas e casas populares, tornaram-se professores e ajudaram decididamente nas calamidades, muito frequentes nessas zonas castigadas por furacões e tempestades, como as tormentas no estado de Vargas, no início do governo Chávez, quando morreram cerca de 10 mil pessoas. Por isso eles são tão queridos e objeto de muitas homenagens. Hugo Chávez, que se confessava um “humilde soldado, filho de Bolívar”, fez questão que seu corpo fosse velado, não no Miraflores, o palácio do governo, como seria normal a qualquer chefe de estado, mas na Academia Militar, onde ele diz ter feito sua opção pela vida, e enterrado no Quartel da Montanha, hoje Museu da Revolução, guarnição militar que ele quis tomar com seu frustrado levante de 4 de Fevereiro de 1992. O 4F, hoje, é simbolo de resistência e unidade paraeste país que continua sonhando alto e fazendo muito por seus cidadãos, os latino-americanos e todos os povos na luta pela libertação e soberania, como afiançou Evo Morales, o presidente da Bolívia que estava presente na última homenagem prestada ontem, 15 de fevereiro, ao comandante da Revolução Bolivariana.
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