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Reflexões sobre Tony Blair

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(Publicado em Seg, 15 de Dezembro de 2008 15:34)

Artigo de FC Leite Filho

Anthony Charles Lynton Blair é forçado a deixar o poder, como primeiro ministro do Reino Unido, numa idade (completou 54 anos em dois de maio) em que a maioria dos estadistas mal começa a sonhar que um dia vai chegar lá. O francês Jacques Chirac, por exemplo, também se despede agora do Elisée, aos 77, e depois de muito rodar na política francesa.

Ao contrário de Blair, no entanto, Chirac, apesar de ter feito um governo medíocre, ao longo de 12 anos ininterruptos (dois a mais que Blair), não está sendo escorraçado. Ele o faz de moto próprio, talvez motivado pela idade, a saúde frágil, ou a divisão de seu campo, que acabou permitindo a recente eleição de Nicolas Sarkozy, pois teria alguma chance de arriscar um terceiro mandato (na França, a reeleição é ilimitada). Homem bonachão, simpático (dizem que gosta de tomar cachaça com o francês comum), Chirac parece já deixar saudades entre seus patriotas, quando menos pelo jeitão desengonçado mas sempre efetivo de fazer política.

Este cotejo me leva a indagar por que Tony Blair, rapaz brilhante, oxfordiano, que fez um governo notável (pelo menos aos olhos da elite e da classe média, que, em última análise conduz a opinião), é compelido a pendurar as chuteiras, em plena juventude política. É verdade que ele ainda tem quase três anos de mandato como deputado e nada o impede que tente voltar outra vez ao 10 Downing Street (residência do Primeiro Ministro).

Afinal, Winston Churchill foi derrotado na eleição, em 1945, logo depois que ganhou a II Guerra, e voltou ao poder em 1951, já curvado pela idade, 77 anos, o whisky e o charuto e ainda lá passou quatro anos. Churchill perdeu, na verdade, por causa de seu excesso de conservadorismo e pela paranóia da guerra fria, que ele concebeu e aplicou com zelo religioso, enquanto os ingleses se empolgavam com a mensagem social dos trabalhistas (labour), então em ascensão.

Clement Atlee , que defenestrou o velho leão de guerra (não tão leão assim, pois os loiros da vitória foram na verdade para Stalin, então senhor da União Soviética, que foi ao encalço de Hitler no seu próprio bunker, na Alemanha) não fez feio. Ele criou o National Health, serviço nacional de saúde, que se tornou modelo para o mundo e inaugurou o estado do bem-estar social.
Pessoalmente, tive o prazer de desfrutar, como cidadão comum, quando era correspondente de jornal em Londres, entre 1977-78, sob o governo de outro trabalhista, James Callagham, os últimos estertores daquele serviço, posto abaixo por Margaret Thatcher, a partir de 1979. Só para se ter uma idéia, tal serviço oferecia remédios (qualquer quantidade individual) e assistência médica, por módicos 20 centavos (pence).

Agora, Tony Blair é obrigado a entregar o poder a Gordon Brown, seu companheiro e rival dentro do movimento New Labour (Novo Trabalhismo), que botou abaixo 18 anos ininterruptos de governo conservador, em 1997, numa vitória estrondosa, que lhes garantiu quase dois terços da Câmara dos Comuns.

Ambos escoceses, ambos profissionais brilhantes e políticos ambiciosos, eles não demonstram ter muita diferença em termos ideológicos, inclusive foi Gordon que, como Ministro das Finanças (Chancellor of Exequeur) quem garantiu todo o corte conservador dos 10 anos de Blair. Gordon Brown, como se sabe, foi quem deu independência ao Bank of England (o Banco Central de lá).
As diferenças estariam, além da defasagem mínima de idade (Brown é três anos mais velho que Blair), no fato de o atual ministro ser um pouquinho menos neoliberal do que o premier, e crer mais na presença do Estado na economia.

Os partidários de Brown gostam de sustentar que seu líder seria menos capacho, ou não tão “cachorrinho de Bush”, como Blair foi cruelmente apodado pela mídia e teria como determinação providenciar a retirada das tropas britânicas no Iraque. O envolvimento de Blair nesta guerra é que teria sido fatal para ele, ainda que as perdas britânicas, 130 mortes, contra 3.500 das americanas. O custo econômico, quatro bilhões de dólares teria sido outro fator determinante.

Mesmo assim , eu não sei se Gordon Brown, no cargo de Primeiro Ministro, faria diferente, pois praticamente todos os governantes trabalhistas, à exceção talvez de Clement Atlee, adotaram uma política de quase total submissão ao Estados Unidos, fossem eles Harold Wilson ou James Callangham.

Por esta razão, eu não espero grandes mudanças com a saída de Tony Blair, a não ser em questões tópicas de estilo ou de feitio. Gordon Brown, mais tímido e reservado, e nem por isso menos esperto, pode não ser tão espalhafatoso ao sentar-se no colo de Bush, mas pode fazer tudo o que exige o chamado establishment industrial-militar dos Estados Unidos e da Otan.

Seja como for, Blair vai para o olho da rua (ele entrega o poder em 27 de junho, tempo necessário para as formalidades internas de unção de Brown como Líder Trabalhista e, conseqüentemente, Primeiro Ministro). Dizem que vai trabalhar com o Bill Cinton, promovendo eventos internacionais em defesa das minorias e do meio ambiente. Ele só precisa ter cuidado para a coisa não ter um fim parecido com a Terceira Via, o movimento empalmado pelos dois governantes, que se destinava a encontrar uma alternativa entre a Social Democracia e o Neoliberalismo e que redundou em fiasco. Também com uma estreiteza dessa ordem, só poderia dar no que deu.

Em matéria de perspectivas pessoais, Blair tem uma vantagem sobre Clinton: o ex-presidente americano, eleito em dois períodos, jamais poderá voltar à Casa Branca, a não ser pelas mãos da mulher Hillary Clinton; já Blair não tem qualquer impedimento constitucional para o retorno a Downing Street, mas para se credenciar, necessita reconquistar a confiança dos ingleses, algo que hoje parece totalmente absurdo, mas que amanhã poderá ser diferente.

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