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Maneira de ser (do PMDB)

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(Publicado originalmente em Seg, 15 de Dezembro de 2008 15:18)

Por Paulo Timm
A abrupta saída de Nelson Jobim da disputa pela Presidência do PMDB um dia depois de afirmar à imprensa que esta possibilidade era zero ou até “abaixo de zero” sugere algumas reflexões.
O que significa esta saída e, mais do que isto, o gesto com que se reveste?
A saída não significa nada. Tudo continuará com dantes no quartel de Abrantes. Tem uma correspondência com aquelas coisas para as quais não encontramos nenhuma explicação plausível e , mesmo assim, o mundo continua como está. Neste caso, a política nacional, a conjuntura de alianças em torno do Presidente Lula, O PMDB. Esse Partido , apesar dos gauchos que nele militam desde sua fundação, nos idos da ditadura, é o que sempre foi: um artifício ( pós-moderno?) de articulação de interesses pessoais transformado em instrumento de confecção da política. Nem por isso desimportante, vez que a política no mundo pós-moderno é isso mesmo: um “como se…”, um reino do simulacro.
É como se ela realmente organizasse os interesses coletivos com o objetivo de conferir ao Estado seu caráter impessoal e objetivo; é como se ela se constituisse num canal de efetiva defesa dos direitos consagrados na legislação; é como se ela se constituisse num verdadeiro estuário de confluência de verdadeiras vocações públicas; é como se ela fosse um canal para o descortínio de um possível melhor do que o traçado pelo destino manifesto.
Dou apenas um exemplo: Por que só os Partidos Políticos detêm o poder de representação dos eleitores? Aliás, seu monopólio. Houve tempo – e o há para tudo – em que o processo de democratização da sociedade e do Estado dependeu, realmente, dos Partidos Políticos, que por isso mesmo criaram verdadeiras clivagens ideológicas e de representação social. Hoje, entretanto, a democratização ultrapassou os limites do Estado e da Política e enveredou para o campo da intersubjevidade. Tanto que já se diz que o se ganha em cidadania estatizada se perde em subjetividade realizada ( Boaventura de Souza Santos) Mesmo quando o assunto é “organização do povo” , o universo das entidades sem fins lucrativos ultrapassa em quilômetros o papel desempenhado por Partidos Políticos. E , finalmente, no campo da formação política, a abertura das Universidades e sua extensão sobre a sociedade fazem, igualmente, muito mais do que as infundadas Fundações associadas aos Partidos com o fim de proceder a divulgação de idéias e programas. Também as rígidas fronteiras entre Estado e Sociedade Civil ,tão ao gosto dos clássicos dos Séculos XVIII e XIX, esvairam-se , em razão mesmo das tranformações no interior de um e de outro,a tal ponto, que já carece de sentido prático conceber Políticos- e os Partidos que a monopolizam- como único mecanismo de acesso da sociedade ao Estado.
A discussão, portanto, sobre Reforma Política em curso no Brasil de hoje está tão ultrapassada quanto os protagonistas que a encenam. A verdadeira Reforma Política ansiada pelas sociedades contemporâneas visa a , justamente, colocar o monopólio da Política pelos Partidos sob severa revisão , ao tempo em que procura dar ao cidadão comum maior acesso e vivência sobre as coisas públicas. A Política é cada vez mais um mercado potencial com direitos disponíveis para o consumo de pessoas capacitadas para tanto. Os gregos, na origem da democracia, faziam isso recorrendo a educação das disciplinas que fortaleciam a capacidade de argumentação – oratória, retórica – e ao sorteio de vagas para a função pública , de forma a evitar a profissionalização da política pelos mesmos de sempre..Como se não bastasse ainda instituiram o ostracismo , do qual nem o Grande Péricles escapou. Nós mesmos, embora recorrendo a uma inspiração própria- e talvez inadequada – da época, já elegemos, na Constituinte de 34, representantes “classistas”, os quais, aliás, foram decisivos para o maior arejamento daquela Carta Magna. A Reforma Política tampouco poderá estar , hoje, desvinculada da Reforma do Estado, mediante a qual a sociedade, sem os Partidos e sem os políticos, venha a se assenhorear cada vez mais dos instrumentos estatais para a regulação da vida social. E como pensar em Reforma do Estado e Reforma Política sem avançar a discussão sobre o caráter republicano do Estado e o caráter democrático do Poder Legislativo, ambos caixas pretas de poderes tão desconhecidos quanto brutais sobre o cidadão comum. Para quê um Senado? Para quê três Senadores? Para quê , mesmo com tais mecanismos de equilíbrio, cotas mínimas e máximas no Congresso Nacional? Para quê tanta suntuosidade na Camara e no Senado num país de mortos de fome e desemprego. A questão decisiva, ainda, diz respeito ao conceito de cidadania neste país. Como estender a cidadania se a cidadania sempre foi uma espécie de vilania correspondente ao acesso (privilégios!)de alguns poucos às graças de Sua Majestade de turno. Cidadania e mercado, conceitos e experiências decisivas para a construção da verdadeira modernidade, nunca existiram, a rigor, no Brasil, ou, se existiram o foram à brasileira, com forte intervenção do estado na sua constituição.
Enfim , a saída do Ex-Ministro Jobim do páreo da Direção Nacional do PMDB não afetará estas questões mas seu gesto , uma vez mais, reitera a distância do Rio Grande do Sul do que é o verdadeiro Brasil. Na última eleição para Presidente o então Governador Rigotto encenou o mesmo espetáculo. Fez que foi mas não foi… E o Senador Simon não faz mais do que indignar-se há vários e cansativos mandatos. O ser é com o ser, já dizia Parmênides, na origem do filosofar. E o Brasil é com o Brasi, sendo o Rio Grande do Sul, com suas percepções, valores e destinamentos, já que falamos em filosofia, outra coisa. Por acaso falamos todos o belo português, como aliás, também o falam os portugueses, angolanos, timorenses e outros povos. Mas cada um com sua maneira de ser. Os gauchos insistem em não entender isto restando-lhes a grandioloquência , não do gesto , mas dos gestos…
Paulo Timm – 6 de março de 2007- Torres, RS

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