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Crítica do filme Melancolia

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Em tom de irônica advertência, o mais polêmico cineasta da atualidade, Lars Von Trier, mostra, em Melancolia, por meio de imagens soberbas, captadas diante de um castelo histórico sueco (Tijolöholm), as reações psicológicas de duas irmãs, de personalidades diferentes, ante a iminência do fim do universo, provocado por uma possível colisão planetária.

No prólogo, pontuado pela música de Wagner (a Abertura de Tristão e Isolda), o cineasta dinamarquês – que, em seu trabalho anterior, Anticristo, também apelara para a ópera, ( Rinaldo, de Haendel) -, já antecipa, em linguagem de ficção científica ao estilo de Stanley Kubrick, o que vai acontecer no final da película, ao focalizar a aproximação da Terra do planeta Melancolia. Ele divide, em seguida, sua narrativa em dois episódios, de natureza dramática diversa, batizados com os nomes das duas irmãs: Justine ( Kirsten Dunst) e Claire (Charlotte Gainsbourg).

O primeiro se inicia em ritmo de comédia – como foi, aliás, concebido o argumento, inspirado em Jean Genet – quando, em estreita estrada de terra, um inexperiente motorista não consegue, numa curva, fazer a manobra de uma limusine, que leva, em seu interior, um expansivo casal de noivos: Justine e Michael (Alexander Skarsgârd). Em decorrência disso, eles atrasam sua chegada ao suntuoso castelo, onde se realizará a cerimônia nupcial. Em pouquíssimas tomadas por câmera manual, digital, Von Trier define a personalidade não só dos noivos, como a de seus ansiosos e irrequietos parentes mais próximos.

Justine (o nome vem de uma personagem do Marquês de Sade) é uma publicitária, que nada tem do convencionalismo social de sua irmã, Claire, casada com o bem-sucedido executivo John (Kiefer Sutherland), dono da propriedade. Foi ele quem cobriu os altos custos da festa matrimonial. Por isso, Claire, além de censurar a irmã pelo atraso, pede-lhe que não se altere, quando Gaby (Charlotte Rampling), mãe delas, divorciada do pai, Dexter (John Hurt), que abusa do copo, dirigindo-se aos noivos, faz dura crítica à instituição do matrimônio: – Eu lhes digo: aproveitem o quanto puderem. Eu, particularmente, odeio o casamento!…

É nessa ambientação – semelhante à de Festa de Família, de Thomas Vinterberg, amigo e companheiro de Von Trier na teorização do Dogma 95 -, que se vai desenvolver o ânimo sádico e depressivo de Justine, de caráter sintomaticamente autobiográfico. Assim, em dado momento, ela deixa a festa para ir dormir com o sobrinho Leo (Cameron Spurr). Acordada pela irmã e pelo cunhado, volta ao salão de festas, mas suas outras inconvenientes posturas – até mesmo o relacionamento sexual com um dos convidados nos jardins do castelo – levam o bem intencionado, porém desiludido Michael a deixá-la, na noite de núpcias, para sempre.

No segundo episódio, de coloração dramática, Justine está de volta ao castelo para passar uma temporada com Claire. É então que se vai perceber, sob a persistência do tema lírico de Wagner, o quanto estão as duas irmãs assoberbadas, pelo conhecimento de John de astronomia, ante o perigo, que se avizinha, do choque entre os dois planetas. Ele, porém tenta, o quanto e até quando pode abrandar a preocupação da mulher e da cunhada em relação às previsões mais tétricas possíveis. A mim nada importa! – diz Claire, no desespero – O que eu preciso é encontrar lugar seguro para o meu filho Leo. Mas que lugar seria esse?…

Von Trier sustenta sua linguagem nesse diapasão, isto é, em exasperante clima de suspense, apesar de haver desvendado, de início, o final. Cria cenas de muita beleza e de sensualidade – como a do nudismo de Justine, exposta ao luar –, em que, pela significativa tonalidade (monocromática) da fotografia de Manuel Alberto Claro, as duas irmãs, nas cavalgadas feitas pelos campos, procuram se integrar à natureza. O elenco, como sempre, sob a direção dele, – como acontecia com Ingmar Bergman – apresenta desempenho de alto nível, tanto os veteranos, quanto os mais novos.

Charlotte Rampling, na breve intervenção que faz, como Gaby, está esplêndida. John Hurt, narrador de Dogville, como Dexter, que, entregue à bebida, apenas saúda, com palavras carinhosas, a filha que se casa, tem marcante atuação. Stellan Skarsgârd, como Jack, dono da empresa de publicidade, na qual trabalha Justine, também. É filho dele, Alexander, intérprete de Michael, o noivo, em promissora estreia sob a direção de Von Trier, que também lançou seu pai, em Ondas do Destino (1996). Kiefer Sutherland vive o papel de John, com expressividade excepcional, deixando transparecer, com discrição, pela voz, a ponta de reprimido desejo, que sente sua personagem pela cunhada. As atrizes Kirsten Dunst, como Justine e Charlotte Gainsbourg, como Claire, por sua vez, encontram magnífica oportunidade de demonstrar, cada uma a seu modo, como o realizador sabe modelar sedutoras personagens femininas. E ambas tiram, em igual nível, brilhante proveito disso.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
MELANCOLIA
MELANCHOLIA
Dinamarca, Alemanha, Suécia, Itália e França / 2011
Duração – 130 minutos
Direção – Lars Von Trier
Roteiro – Lars Von Trier
Produção – Meta Louise Foldager e Louise Vesth
Fotografia – Manuel Alberto Claro
Música – Richard Wagner
Edição – Molly Malene e Stensgaard
Elenco – Kirsten Dunst (Justine), Charlottte Gainsbourg (Claire), Kiefer Sutherland (John), Alexander Skasgârd (Michael), John Hurt (Dexter), Charlotte Rampling (Gaby), Stellan Skasgârd (Jack), Cameron Spurr (Leo), Brady Corbet (Tim).

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