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Ahmadinejad chega a Venezuela em meio à tensão

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Por FC Leite Filho
O presidente do Irã, o controvertido Mahmoud Ahmadnejad, chega este domingo, dia 8/1/2012, à Venezuela para encontrar-se com o também polêmico presidente Hugo Chávez. Depois ele vai a Cuba de Fidel Castro, ao Equador de Rafael Corrêa, e à Nicarágua, para a posse em um novo mandato de Daniel Ortega, reeleito. Pode parecer provocação, já que os Estados Unidos e a Europa se embrenharam, recentemente, numa guerra de papel (por enquanto) com o Irã, e este ameaça reagir, fechando o estreito de Hormutz, no Golfo Pérsico, por onde passam 40% da produção mundial de petróleo (a crise já fez o barril aumentar em 4,3%).

Mas não é, porque a viagem já estava marcada há mais de seis meses e destina-se a incrementar o intercâmbio com a América Latina, justamente aquele que os americanos consideram seu “quintal indevassável”. Por ironia, no entanto, é neste imenso território dadivoso – celeiro de alimentos, energia, matéria prima e água potável – que os iranianos procuram compensar as perdas resultantes das draconianas sanções econômicas que lhe impuseram as chamadas potências ocidentais.


Vídeo de Helena Iono, da TV cidade Livre, sobre a maratona venezuelana Motores pela Paz

Na verdade, o estreitamento das relações com o até então distante país persa, começou com a eleição de Hugo Chávez, em 1999, quando ele iniciou uma política de aproximação ao mesmo tempo com os vizinhos da região e com os paises emergentes hemisfério do sul, África e Ásia, e os produtores de petróleo. Tal política já rendeu o reavivamento da OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo) e a consequente recuperação do preço do barril, que estava aviltado em 7,2 dólares, o aumento em até dez vezes do volume comercial entre a maioria dos países do sul e centro-americanos (só o intercâmbio do Brasil com a Venezuela e a Argentina, Peru e Colômbia avançou quase um século).

O Irã, segundo maior produtor do velho ouro negro, como se sabe, e a Líbia de Kadafi, outra grande produtora, exerceram papel crucial na reabilitação da OPEP. É que os aiatolás foram firmes no apoio à política de Chávez de reajuste do barril e o estabelecimento de cotas máximas para evitar o inflacionamento, uma posição combatida pela Arábia Saudita, o maior produtor, e os Emirados Árabes, por causa de sua aliança com os Estados Unidos. No final, a Arábia Saudita acabou cedendo e com ela vieram os outros membros reticentes da OPEP, que pôde reunir-se em Caracas, em setembro de 1999 e transferir a presidência da organização a Hugo Chávez.

A partir dali, o preço do petróleo disparou e os países árabes, como os seus co-irmãos emergentes do sul, inclusive de nossa América em desenvolvimento. A nova política de integração, que também incluiu a China, a Rússia (este caminhando para tornar-se o líder mundial no fornecimento de petróleo) e a Índia (estes últimos formaram com o Brasil o chamado BRICs (Brasil, Rússia,Índia e China) consolidava-se aomesmo tempo que os Estados Unidos e a Europa afundavam em crises econômicas sucessivas.

Outro resultado positivo desta integração foi o escudo que ela exerceu durante a última crise financeira mundial de 2008, com repiques até hoje, principalmente na Europa, a ponto de países como o Brasil quase não terem sido afetados, em contraste com a época das políticas neoliberais, quando havia fugas de capitais e o país foi duas vezes ao FMI, contraindo empréstimos de até 40 bilhões de dólares.

Na verdade, a Venezuela foi afetada pela queda brusca do barril de petróleo, que caiu de quase 150 para 30 dólares, mas o país manteve sua política econômica autônoma e com inclusão social, no que foi ajudada por um financiamento especial da China, recusando-se a praticar a política fiscal do FMI. O país resistiu à volta ao neoliberalismo: o governo não demitiu ninguém e manteve o padrão do salário-mínimo, o maior do sub-continente.

É neste contexto, que o presidente Mahmoud Ahmadinejad visitará quatro países nossos num périplo de cinco dias. Ele vai aproveitar para intensificar o intercâmbio com os latinos, sobretudo o Brasil, de quem já passou a ser o maior importador de carne, desbancando a Rússia, segundo informava ontem o jornal Washington Post, em matéria reproduzida pelo O Estado de S. Paulo.

“O Irã também aumentou muito suas missões diplomáticas”, diz a matéria do Post”, em todo o hemisfério, e enviou membros de sua força de elite, a Brigada Quds – unidade militar que representantes americanos associaram em outubro a um fracassado complô de assassinato em Washington -, para servirem em suas embaixadas.
“Como resultato do aumento das relações diplomáticas entre Irã e América Latina, os negócios cresceram. Recentemente, o país ultrapassou a Rússia como maior importador de carne brasileira. As exportações nacionais para Teerã cresceram sete vezes nos últimos dez anos e hoje somam US$ 2,12 bilhões. Um aumento similar aconteceu na Argentina, enquanto com o Equador o comércio bilateral subiu de US$ 6 milhões para US$ 168 milhões”.
Como se verifica, já não somos aquela ilha isolada que nada influía na política dos grandes e agora servimos até de arma contra o massacre de um país tão emergente como os nossos da América Latina. A conclusão a tirar é que, aos poucos nos transformamos num mundo multipolar, em que o poder não está mais nas mãos de uma egoísta superpotência mas gerida pelos interesses múltiplos de vários polos.

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