Por Helena Iono (*)
A eleição presidencial de sete de outubro na Venezuela, a mesma data do pleito municipal no Brasil, tem um peso fundamental não somente na continuidade das conquistas da revolução bolivariana, que transformaram aquele país num dos mais prósperos e iguatlitários,como também na afirmação da integração econômico-social dos países da América Latina, iniciada na última década e estimulada por novos governos progressistas e populares, legitimamente eleitos.
A frente eleitoral do presidente Hugo Chávez, que disputa a reeleição para um período de oito anos, integrada do “Grande Polo Patriótico”(GPP), o PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela), os partidos de esquerda e sindicatos e as missões sociais (programas de assistência médica, educação, habitação, emprego e erradicação da pobreza), tem redobrado sua energia na campanha, conscientes da sua responsabilidade histórica junto ao povo venezuelano e frente ao mundo.
A grande mídia internacional, sediada em Washington, a mesma que armou o golpe de estado de abril de 2002, de matriz comum com a rede de TV Globovision, os jornais “El Nacional” e “El Universal”, apoia o opositor conservador e representante das elites, Henrique Capriles Radonski (MUD), e instiga um novo golpe, diante da sua previsível derrota eleitoral, evidenciada pelas estatísticas de fontes confiáveis, inclusive da área privada. A empresa de pesquisa Hinterlaces, aponta Hugo Chávez como tendo 61% das preferências e Capriles, 38%, entre os 87% que declararam seu voto. Independentemente das previsões estatísticas, Chávez tem-se revelado um dos raros presidentes capazes de comover e mobilizar multidões de massas permanentemente, ou seja, antes, durante e depois da campanha eleitoral.
A explosão da Refinaria Petrolífera de Amuay
Como previsível, o posição exacerbou na trama golpista, via campanha midiática. Tentou tirar provetio da explosão da Refinaria de Amuay, com a morte de mais de 40 pessoas, o que faz aumentar a suspeita sobre sua natureza acidental. O coração da Venezuela são os 55 mil quilômetros quadrados que compõem a riquíssima faixa petrolífera do Orinoco. A águia imperial norte-americana sobrevoa para reapropriar-se do que perdeu com a PDVSA nacionalizada. Mas, o governo bolivariano, sem cair na provocação de forças denegridoras da eficiência estatal da PDVSA em prol da política de reprivatização de Capriles Radonsky, concentrou sua ação em salvar a população atingida e as famílias das vítimas da Guarda Nacional Bolivariana. 700 famílias de Amuay foram incorporadas às chamadas Missões Filhos da Venezuela (1) e “Amor Maior” (2), e o presidente Chávez decretou a construção imediata de 2.000 casas, como parte da Grande Missão Casas Venezuela (3).
A imediata mobilização social em apoio às vítimas da explosão da refinaria – brigadistas, civis, militares e milícias populares, reconstruindo as casas, acudindo feridos, restabelecendo o sistema de água e luz – é indicativa de um nível irreversível de consciência e organização construída nestes 14 anos de revolução. Exemplos a nível da emulação comunista já presenciada em Cuba. São ações que transcendem a simples solidariedade. É o povo mobilizado na defesa do Estado revolucionário venezuelano ameaçado por diferentes flancos da guerra imperialista.
Outras maquinações golpistas continuam, como a recente “denúncia” sobre um massacre de índios yanomamis no Estado de Amazonas da Venezuela. O Ministério do Poder Popular para Povos Indígenas e a Força Armada Nacional Bolivariana desmentiram, sem antes deixar de comprovar com minuciosa inspeção in loco. A oposição venezuelana se esquece que a Venezuela não é um Paraguai, onde Fernando Lugo não teve tempo histórico para construir uma organização cívico-militar que impedisse o golpe midiático e parlamentar. O PSUV e os partidos de esquerda compõem ampla maioria na Assembleia Nacional.
A reeleição e integração latino-americana
A retomada do nacionalismo na América Latina sofreu um substancial impulso com o advento da revolução bolivariana, gestada já no famoso levante de 4 de fevereiro de 1992, e inaugurada em 1998 com a eleição de Chávez. O surgimento dos vários governos progressistas na América Latina na última década, confluindo num processo integracionista com Unasul, Telesul, Banco do Sul, Alba e CELAC, contou com o exemplo e o protagonismo da Venezuela da era Chávez. Portanto, tornou-se estrategicamente urgente ao imperialismo norte-americano impedir a vitória eleitoral de Chávez, que além de conseguir levar a Venezuela no Mercosul, retirar parcialmente Manoel Santos da Colômbia da esfera do domínio de Uribe e da direita conservadora, é o articulador da aliança da América Latina com o Irã, a Síria, a Rússia e a China; sem contar que foi o defensor incondicional da Líbia de Khadafi. Em tempos de precipitosa crise capitalista europeia desaguando em guerra, a vitória de Chávez, defensor de Fernando Lugo e Rafael Correa, não obedece à estratégia de manutenção de bases ianques em território Latino-americano.
A crise da oposição
O vazio programático da oposição se expressa na entrevista dada por Capriles ao jornal Correio Brasiliense, de Brasília, na qual caia no vazio de chavões de promessas sociais para ocultar o seu projeto neo-liberal. Se dirigia a um público brasileiro, manipulado pelo terrorismo dos grandes meios de comunicação procurando vender a imagem de um “Chávez ditador”, sem mencionar os avanços econômicos e sociais na Venezuela pós-1998. Há alguns dias, um deputado da oposição, William Ojeda do UNT (Um Novo Tempo) denunciou publicamente Capriles dizendo que ele tinha um plano secreto em que ocultava um projeto neo-liberal a ser aplicado, se presidente. Ojeda disse: “Não estamos dispostos a aceitar na Venezuela atavismos neo-liberais, nem pretensões de estatismo feroz. Seria uma cegueira não reconhecer que a atual gestão governamental tem feito um enorme esforço na agenda social. Seria sério e responsável reconhecer isso. Programas e execuções sociais que podem ser melhorados e aprofundados. Mas, há que reconhecer o acento social que a gestão do presidente Chávez tem dado às políticas públicas”. Isso lhe custou a sua expulsão do MUD.
Conquistas sociais iniciadas
Nos 14 anos da era Chávez, a Venezuela fez uma revolução cultural: eliminou o analfabetismo, criou Editoras e Distribuidoras estatais, uma Fundação da Imprensa Nacional, popularizou a produção e leitura de livros. E criou várias missões de ensino púbico gratuito amplamente conhecidas (Robinson, Ribas e Sucre). Além das missões mencionadas (1), (2) e (3), a classe trabalhadora conquistou uma Nova Lei Orgânica do Trabalho (4) resgatando os direitos da classe trabalhadora, da estabilidade e da família. Nem dizer dos avanços na área da saúde, onde com a ajuda de Cuba, criaram-se postos de saúde pública em várias comunidades, com mais de 10 mil médicos cubanos espalhados na Venezuela, e formou-se a “Misión Milagro”, há mais de 8 anos, com fundos da PDVSA, levando atenção oftalmológica diária e gratuita a 18 estados. Este projeto deu a visão a 1 milhão e 500 mil pacientes.
O benefício na área alimentar, via mercados populares estatais (Mercal, PDVAL, Mercado Bicentenário), proveniente de projetos agro-alimentares, de distribuição da produção da agricultura familiar e da agro-indústria de empresas socialistas, chega não só aos pobres, mas à classe média e pequena-burguesia. Por isso, até desertores do campo opositor, como este deputado da UNT, devem reconhecer que para alguns setores burgueses, é conveniente a abertura de mercado que o governo bolivariano propicia.
A resistência popular
Recentemente, a chamada “maquinária” eleitoral (estrutura) do PSUV reuniu-se sob direção de Chávez, com a participação ativa de cerca de 20 mil pessoas no grande ginásio Poliedro de Caracas para balanço e ações organizadas de luta e resistência e para assegurar o processo eleitoral democrático na Venezuela. Há uma estratégia de mobilização frente a qualquer tentativa de sabotagem elétrico, desabastecimento proposital de alimentos, água, serviços, e de ordem pública.
Não há como ignorar o alerta constante que Chávez tem feito aos opositores do progresso social, aos que dominaram a Venezuela por anos antes de 1998, aos conspiradores magnatas do petróleo, altos consumidores de whisky e aplicadores da Bolsa de Nova York, responsável da miséria social, instigadores da violência e do consumo da droga, aos que resistem à distribuição justa das riquezas e à PDVSA nacionalizada, às normativas do banco estatal, ao controle e poder popular, que: “a revolução bolivariana é pacífica, mas não desarmada”. O PSUV é relativamente novo, mas vem se provando e se afirmando; a maioria do exército ganha à causa da soberania nacional, as milícias populares armadas (que chegam aos 800 mil) e várias missões sociais organizadas nos bairros e no campo; são forças em movimento com uma vanguarda que deve aprender do 11 de setembro de 1970, do golpe contra Allende no Chile. Os meios de comunicação sim, são ainda o grande empecilho, dado que 70% estão na área do domínio privado. Mas, mesmo assim, as telas da rede pública e estatal, os jornais da cidadania como “Ciudad Caracas”, o “Correo do Orinoco”, conseguem estampar a verdade dos fatos que são os grandes avanços sociais e econômicos no curso da revolução bolivariana.
Não é impossível prever que, pelo clima político-social nestes vibrantes dias de campanha eleitoral, algo de surpreendente possa ocorrer: se não se respeitarem as urnas que estão por dar a vitória a Chávez, o povo poderá sair às ruas como em abril de 2002 para defender a democracia e a continuidade da revolução.
(1) Missão “Filhos da Venezuela “: Projeto de auxílio às mulheres em condições de extrema pobreza. 400 bolívares por criança (até 3 filhos) e 600 bolívares no caso de criança com deficiência física. Há 204.513 famílias beneficiadas. Acaba-se de destinar cerca de 1 bilhão de bolívares a governos estaduais e prefeituras.
(2) Missão “Amor Maior”: Projeto social do governo que dá uma pensão a anciãos que trabalharam toda a vida, no campo e na cidade, sem comprovação legal. Há 378.750 adultos incorporados nesse projeto.
(3) “Gran Misión Vivienda”: Parecido ao projeto brasileiro Minha Casa, Minha Vida, iniciado no início de 2011 com o objetivo de zerar o problema habitacional até 2018 (3 milhões de moradias). O objetivo é construir 350 mil casas até dezembro (75% já realizadas). Conta-se com a ajuda tecnológica do Irã e do Brasil.
(4) Nova Lei Orgânica do Trabalho. Aprovada em maio de 2012 com relutância do empresariado e da oposição, incluindo entre outras: redução a 40 horas de trabalho semanais, pagamento retroativo de benefícios previdenciários e aumentos salariais não pagos pelas empresas privadas no passado; extensão da licença maternidade a seis semanas antes do parto e 20 semanas no pós parto.
(*) Helena Iono é jornalista e apresentadora da TV Cidade Livre de Brasília, Canal 8 da NET (Só DF), e ativista internacional, com passagens pela Europa, Venezuela e Cuba.