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A origem da violência eleitoral na Venezuela

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Por Helena Iono (*)

Tudo indica que um plano golpista, querendo aproveitar-se do desaparecimento físico do falecido presidente Hugo Chávez, já estava em marcha, independentemente do resultado eleitoral de 14 de abril de 2013.  É verdade que a renhida diferença de 1,8% magnificou a ação conspiratória, com a cumplicidade dos canais privados de TV e entidades empresariais  e a utilização predatória das redes sociais da internet. Está aí a origem das ações concatenadas de violência, a partir de 15 de abril, em todo o país, que acabou ceifando a vida de nove pessoas (ontem, sucumbiu a nona vítima) e causando 63 feridos.

É imoral chamar de manifestações democráticas ou rebelião popular esses ataques a instituições públicas, entre as quais centrais elétricas, postos de saúde, hospitais (acabam de sabotar o sistema de ar condicionado e salas de cirurgia do centro cirúrgico do Hospital JM de los Rios), mercados populares de abastecimento (Mercal, PDVAL e Mercado Bicentenário), rádios comunitárias, sedes de partido (escritórios do PSUV foram queimados em Barinas, Anzoátegui e outro estados). Outras vítimas da piromania dos desordeiros são 15 Centros de Saúde  (CDIs – Centros de Diagnóstico Integrais”, construídos por Hugo Chávez e este governo, com a ajuda dos médicos cubanos, oferecendo assistência gratuita à população dos bairros humildes).

Tampouco se trata de simples ações vandálicas: são ataques terroristas, com objetivo político claro, características do nazi-fascismo. Pichações como “Morte ao chavista” apareceram nas ruas. Assassinaram dois dirigentes trabalhadores, militantes, moradores da zona de urbanização, construída por H. Chávez para as famílias de vítimas das chuvas, em Limonera (Antímano) no estado Miranda, governado por Henrique Capriles, o candidato derrotado. Atacaram residências de governadores do PSUV ameaçando familiares e crianças, da presidente do CNE (Conselho Nacional Eleitoral), Tibisay Lucena.

As autoridades dizem que está gravado e filmado o chamado de Capriles a não reconhecer o CNE, instigando ataques a várias sedes regionais do CNE, e à manifestação diante da sede nacional, no dia 17 de abril, cancelada, depois da decisão do governo nacional de proibi-la, fechando o acesso a Caracas, para impedir. O plano dos conspiradores era utilizar seus manifestantes, provocando auto-atentados, a partir de franco-atiradores, para acusá-los de chavistas e justificar um enfrentamento violento de povo contra povo, com derramamento de sangue, guerra civil. Em tal cenário, se justificaria uma posterior intervenção externa, nos mesmos moldes de Carmona no golpe de abril de 2002. O presidente alertou sobre casos de policiais (de direita) fornecendo camisetas vermelhas a provocadores de direita. A mão dura para evitar derramamento de sangue não é um ato ditatorial, mas um ato para assegurar o respeito à democracia, às instituições constitucionalmente reconhecidas como o CNE, e sobretudo, é um ato de defesa da paz e da tranquilidade social.

Evidentemente, não há nenhum interesse à paz por parte desta oposição que não se sente sequer estimulada a aproveitar o espaço democrático que lhe deu um significativo 48,9%. Porque será que é mais importante partir para a violência por ter perdido por 1,8%, do que apoiar-se na votação a seu favor para ganhar apoio no debate das medidas econômico-sociais que favoreçam à oligarquia e aos banqueiros que eles representam? Porque eles sabem que,  apesar de haver conseguido ludibriar um eleitorado indeciso, usando o nome de Bolívar (cuja foto haviam retirado das paredes de Miraflores no golpe de 2002), tocando a música revolucionária de Ali Primeira nos seus comícios, prometendo aumento do salário mínimo, ou registro de nacionalidade a médicos cubanos (quando agora os ameaçam de morte), assegurando continuar projetos sociais criados pelo governo chavista, elogiando Lula, hipocritamente, iria ter que mostrar a sua mesma cara verdadeira, desde o golpe de 2002.

Manter essa farsa por mais de um dia após as eleições foi impossível. Mesmo porque os 7,5 milhões de votos chavistas conscientes e decididos a avançar ao socialismo, a maioria parlamentar do Polo Patriótico e do PSUV, os 20 dos 23 governos do PSUV nos estados, não lhes permitiriam qualquer retrocesso, reprivatização da PDVSA e políticas neoliberais, como é o projeto real da frente eleitoral opositora (MUD) que o apoia. Para tentar impor isso, só com o fascismo, que é o que ameaçam implantar com o terrorismo que desencadearam desde 15 de abril. Seguramente, boa parte do eleitorado de Capriles, se hoje fosse convocado às urnas, votariam em Maduro.

John Kerry (novo secretário de Estado) e o governo norte-americano, apoiam a acusação de “fraude” de Capriles, desrespeitando a soberania da Venezuela, quando os EUA, que tem a mesma infalível máquina Smartmatic, faz 0% da auditoria, jamais revisaram as urnas que levaram Bush a vencer por 0,4% contra Gore. Nesta última eleição, antes de anunciar o resultado eleitoral, o CNE da Venezuela auditou 54% das urnas. A nenhum país, nem México quando Felipe Calderón venceu por 0,5%, Chile quando Piñeda venceu por 2% dos votos, se pediu auditoria. Não existe nenhuma razão para o não reconhecimento de Capriles da sua derrota eleitoral, senão o golpismo.

A Fiscal Geral da República, Luisa Ortega, explicou pela VTV que, se Carriles respeitasse o jogo democrático, deveria formalizar a auditoria das urnas, mediante instrumentos legais permitidos pela constituição, e qualquer denuncia de fraude, iniciar com elementos de prova. Mas, não o fez, no primeiro momento. Optou por partir para a violência, ameaçar de morte a presidente do CNE, atacar sedes do CNE, matar 8 trabalhadores humildes, ferir 63, gerando 170 prisões (estas, todas de  autores de delitos flagrados da oposição).

O líder do “Comando de Campanha Hugo Chávez”, Jorge Rdodríguez, desmascarou em coletiva de imprensa, a trama da acusação de Capriles. Sabe-se que em toda seção eleitoral há uma ata com o número total de votos válidos que, uma vez impressa, a máquina processa os mesmos dados no seu interior.  O ex-candidato opositor, reclamou que em uma sessão com 1066 votantes imprimiu-se uma ata de 712 votos válidos para 536 eleitores, que havia mais votos que eleitores, e que havia uma fraude. Essa ata correspondia a 2 mesas que compunham a seção. Ele não viu que esse era o total de 2 mesas (com 536 e 530 respectivamente).

Aliás, diga-se de passagem que aí ele mesmo venceu. Portanto, se houve fraude, o infrator foi o próprio. A fabricação de falsas acusações da oposição e notícias estão sendo desmontadas com uma forte atuação de todos os quadros, ministros, dirigentes populares sustentadores de Maduro, que via VTV, uma TV estatal de comunicação, tem se dirigido ao povo desmontando a mentira midiática para rebater o golpe. Uma delas é a fabricada pelo jornal chamado Novo País (provavelmente ligado a El País da Espanha): uma foto de 2012 quando se queimaram urnas velhas de eleições anteriores para liberar os depósitos do CNE, como se fossem urnas destas eleições. São notícias falsas e criminosas que deverão compor o quadro das investigações e penalidades judiciais, a que Capriles terá que responder.

A televisão do estado, a VTV, os jornais populares, Correio de Orinoco e Ciudad Caracas, a Rádio Nacional, as rádios comunitárias, o SBCI (Sistema Bolivariano de Comunicação e Informação), e a Telesul, conquistas da revolução bolivariana, tem sido uma arma fundamental de resistência ao golpe.  Por isso, foram alvos de ataques e ameaças dos chamados “motorizados”, que são terroristas utilizando bombas de coquetel molotov, explosivos que estilhaçam pregos e fragmentos de perfuração para ferir e intimidar manifestantes defensores de Maduro e das instituições públicas.

Não obstante, a surpreendente coragem e consciência dos trabalhadores, ocupando as entradas de locais, das portas aos telhados, como nos vários centros de PDVSA, ameaçados pelos terroristas opositores no país. Magníficas intervenções de operários e técnicos ganhos pela revolução, que garantem que “eles não passarão”, que PDVSA jamais será reprivatizada, nunca mais permitirão um novo “paro petroleiro”. A comoção popular diante do assassinato de 8 trabalhadores, entre eles algumas mulheres, aos quais Maduro declarou mártires e heróis da pátria.

Desde a morte de Hugo Chávez, o povo venezuelano amadureceu décadas e está escrevendo uma história revolucionária das mais profundas deste século. Os conselhos comunais, o PSUV, todos os partidos do Polo Patriótico se mobilizam. Formou-se uma Frente Popular pela Defesa da Revolução e pela Paz baseados em Comandos pela defesa da revolução em cada território e localidades do país.   Sem esse povo mobilizado e a direção política atual, jovem, forjada por Hugo Chávez, as Forças Armadas não teriam tido a união e a segurança para manter esta unidade cívico-militar que tem criado dificuldades para que um golpe de direita, de um setor minoritário (mas ainda existente e já detectado, segundo o governo, contra os quais já se estão tomando providências constitucionais) se deflagrasse no bojo de todas as provocações. De toda forma, as tentativas golpistas continuam, e Maduro, chama o povo a estar mobilizado, defendendo os postos de trabalho, escolas, instituições, ruas e suas moradias, e atento a não cair em provocações.

A revisão e autocrítica de possíveis erros táticos ou de insuficiência estarão na ordem do dia, mas após a superação do enorme esforço político e social que significa enfrentar agora de forma emergencial e unitária o principal inimigo que é a ameaça contrarrevolucionaria. Podemos tentar alguma interpretação aproximativa do resultado eleitoral. O não alcance dos mesmos níveis eleitorais entre esta eleição de 14 de abril e de 7 de outubro, é que Chávez não é Maduro, como este mesmo disse. A morte do presidente Hugo Chávez, ao mesmo tempo que cria um impulso, comoção de compromisso, cria uma inevitável insegurança em alguns extratos chavistas que não são ainda a ala consciente e militante, que se expressou nos 7,5 milhões de votos pelo socialismo.

Estes são os mesmos votos ao militar revolucionário que migram para o leal e bravo presidente operário. Em 10 dias de campanha, no prosseguir do luto por Chávez, Maduro se lançou competindo com Capriles, possído de uma maquinaria informativa burguesa experta de 3 campanhas anteriores, enganando o eleitorado com pontos programáticos roubados do governo chavista contra o qual sempre lutou. Não é verdade que houvesse falha na agitação de programa por parte do comando de campanha de Maduro. O seu programa era o do “Plano da Pátria”, com inumeráveis metas econômico sociais e avanços em todas as chamadas “missiones” no plano habitacional, da saúde, da educação, da agro-indústria, etc… de 2013 a 2019, o mesmo Programa que 5 meses antes defendeu Hugo Chávez, e ao qual Maduro agregou o projeto de desarmamento nas favelas e o combate à máfia do dólar paralelo. A fofoca da grande mídia sobre eventual revisão crítica emitida por Diosdado Cabello, não consegue romper a grande unidade que existe entre Maduro-Diosdado, e entre todos os jovens ministros do governo, nem a unidade cívico militar.

Helena Iono é editora das Edições  Ciências, Política e Cultura e jornalista da TV Cidade Livre de Brasília.

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