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Integração latino-americana. Esta foto diz muita coisa

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Por FC Leite Filho
Para quem duvidava do protagonismo do Brasil no cenário internacional, esta foto e a história que a motivou podem dizer muita coisa. Analisemo-la. O cenário é o salão de recepções do Palácio do Planalto e a ocasião a cerimônia de posse da presidente Dilma Rousseff. O dia é o primeiro do ano de 2011, que também marca o 52. aniversário da revolução cubana. Da esquerda para a direita, posta-se o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, que assumiu há quatro meses, tendo a seu lado, a secretária de estado norte-americana Hillary Clinton, segunda maior autoridade em seu país, depois do presidente Barak Obama. Ao lado desta vem o presidente do Chile,  Sebastián Piñera, empossado em março. Em seguida, posa o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, há 12 anos no cargo. O flagrante constata: os quatro estão descontraídos, e a secretária Hillary dá uma gargalhada, aparentemente de uma piada, ouvida ali, não resta dúvida. Nada mais à vontade.

Agora, vejamos o pano de fundo da realidade que envolve, ou antes, distancia e tensiona estes nossos personagens. A Venezuela e a Colômbia viviam, sob o governo do colombiano Álvaro Uribe, cujo mandato de oito anos expirou em sete a de agosto, um conflito que, de tão radicalizado, parecia fazer soar os tambores da guerra. Uribe foi substituído por Santos, que o apoiou na eleição, ao qual tampouco lhe faltou o respaldo decidido e tronituante de Washington. Só que Santos desvencilhou-se do que aqui poderíamos chamar de herança maldita do antecessor, e  pediu um entendimento com Chávez, no que foi atendido e, imediatamente inserido no processo de integração. Hoje vivem uma aparente de lua de mel.
O Departamento de Estado dos Estados Unidos, a seu turno, tentava até a última quarta-feira, 30 de dezembro, impor à Venezuela um embaixador (Larry Palmer) que havia insultado as autoridades e o exército daquele país. O governo venezuelano negou-lhe o agrément diplomático, instrumento internacionalmente reconhecido, que as nações utilizam para aceitar ou recusar os nomes que os países propõem para servir como embaixadores nas respectivas sedes diplomáticas.
Os norte-americanos fizeram que não entenderam a recusa venezuelana e insistiram que seu embaixador só podia ser Larry Palmer. O presidente Hugo Chávez ameaçou prender Palmer se este desembarcasse em Maiquetía, o aeroporto de Caracas. Arrufaados, os norte-americanos cancelaram o visto do atual embaixador da Venezuela em Washington, Bernardo Álvarez. Por fim, Sebastián Piñera, eleito com o apoio da turma do general Pinochet e do governo americano, depois de mais de 20 anos da coalizão progressista chamada concertación, tentou polemizar para credenciar-se como um espécie de anti-Chávez. Mas viu que não tinha clima para tal e foi comprimido a embarcar no espírito de integração sul-americana, que tem livrado nossos pobres povos não só das rusgas políticas, mas principalmente da débâcle econômica, como demonstrou a última crise financeira mundial de 2001.

Mas qual é a contribuição do Brasil nesta nova, digamos assim, primavera da região? Era aqui aonde eu queria chegar. O fato é que o Brasil, com o Governo Lula, a partir de 1. de janeiro de 2003, entrou de cabeça na política de integração, ou seja, a união dos países deste subcontinente, para, irmanados, combater e vencer o subdesenvolvimento e a pobreza. Esta política, que tem como pressuposto o desatrelamento das grandes potências (leia-se Estados Unidos e Europa), foi iniciada de fato, digamos, a bem da verdade, com os movimentos do tenente-coronel Hugo Chávez, no Palácio Miraflores desde 1999, e do líder cubano Fidel Castro, que, solitária e estoicamente, vinha tentando aquela aspiração, desde o distante primeiro de janeiro de 1959, ou seja, precisos 52 anos atrás.

Com o peso do Brasil, país com uma área geográfica, uma população e uma economia maiores que a metade da América do Sul, aquele sonho de Simón Bolivar, Tiradentes, José Martí, San Martín, que nunca se realizava, a balança pendeu para o outro lado. Passou a apresentar seus resultados concretos e indiscutíveis no intercâmbio comercial, industrial, social e político, que, no caso do Brasil com a Argentina e Venezuela, chegou a decuplicar nos três últimos anos. Esta blindagem possibilitou sobretudo nossos países mais integracionistas (é preciso aqui citar a Bolívia, Equador, Paraguai, Uruguai, sem deixar de mencionar a Nicarágua e Cuba, países caribenhos) a se safar da brutal crise de 2008.

Se houver dúvida quanto a isso, basta comparar a situação desses países integracionistas, com aqueles que não desatrelaram suas economias dos Estados Unidos e Europa. Veja-se apenas o caso do México, da Colômbia, Peru, e do próprio Chile, os quais, na contra-mão da história, assistem suas economias se esfacelar nos chamados tratados de livre comércio com as grandes potências. Os tempos mudaram, como se vê, porque, no passado, o gigante do norte enviava suas esquadras e, em tempos mais recentes, sua aviação, para bombardear os países ou governos recalcitrantes.

Alguém se lembra do que foi feito feito com o presidente do Panamá, Manuel Antonio Noriega, que resolveu defender a devolução do Canal do Panamá ao país, aliás, segundo termos do acordo acertado com seu antecessor e mentor político Omar Torrijos e o então presidente Jimmy Carter, em 1977? Noriega, ex-agente da Cia e então recentemente convertido (ou declarado) ao culto ancionalista, foi levado preso para os Estados Unidos, sob a acusação de “narcotraficante”, onde mofou numa cadeia de Miami até recentemente, depois de ser transferido para um presídio na França. Até aí nada de tão assustador. O problema maior foi a invasão americana, em dezembro de 1989, empreendida pelo presidente Georges Herbert Bush, o pai, uma das tantas, que matou cerca de mil pessoas e destroçou o país, só para trancafiar Noriega e estancar sua política, digamos, autonomista.
Um pouco antes do castigo panamenho, em março de 1989, Bush pai foi abordado numa outra cerimônia de posse em Brasília, no caso, do general-presidente João Batista Figueiredo, pelo então presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, que quis cumprimentá-lo e ao mesmo tempo protestar contra o massacre que os Estados Unidos promoviam contra o seu país, através dos guerrilheiros financiados chamados “contra” e que dizimou mais 50 mil vidas nicaraguenses. Ao contrário do clima de festa da foto acima, objeto deste artigo, a de Bush pai e Ortega, mostra o chefão americano passando um sabão no pobre Daniel (hoje, já não tão pobre assim, porque voltou ao poder, em 2007, pela força de seu povo, depois de derrubado pelo poder americano). Nossa foto, de hoje com essa gargalhada de Hillary Clinton e do efusivo aperto de mão com Hugo Chávez mostra como os tempos (e os modos) são outros. Segundo Chávez, se, na guerra das Malvinas, também sob o poder de Bush pai, em 1992, os latinos e sul-americanos estivessem unidos, os ingleses, que retomaram em ação de guerra aquelas ilhas argentinas, não teriam passado do Caribe. Mais recentemente, George W. Bush, o filho exigiu, e obteve, do então presidente do México, Vicente Fox, que o presidente de Cuba, Fidel Castro, se retirasse de uma reunião de chefes de estado latinos em Monterrey, em 2002. Ora, Vicente Fox, antes de ser eleito presidente, tinha presidido a Coca-Colla, naquele país. Dele, não se poderia esperar que não atendesse às ordens do patrão. Bom, viva, então os novos tempos e as novas e agora digitalizadas fotos.

Veja ainda:
Mais fotos desse encontro na posse de Dilma
Interpretação de Chávez (texto e vídeo)

1 COMMENT

  1. Apenas um detalhe, a guerra das malvinas foi em 1982 (governo Reagan/Bush vice). Mas não tinha conhecimento dessa invasão do panamá em 89.

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