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Como acelerar o crescimento

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(Publicado originalmente em Seg, 15 de Dezembro de 2008 15:08)

THEOTONIO DOS SANTOS*
O presidente Lula tenta cumprir sua principal promessa de campanha: retomar o crescimento econômico de um país que ha 30 anos não apresenta uma taxa de crescimento significativa, condenando sua população jovem em expansão a um empobrecimento crescente. Além de manter baixos índices de crescimento, aumentou drasticamente nesse período a concentração econômica para permitir a acumulação de recursos destinados ao pagamento da dívida externa e ao consumo improdutivo das oligarquias locais. As deformações negativas produzidas pelos planos de “ajuste estrutural”, patrocinados pelo Banco Mundial nos anos oitenta, perderam somente em perversidade para as privatizações e os déficits comerciais da década de 90, sob a inspiração do Consenso de Washington.

Ao invés de corrigir essas tendências depressivas, os ajustes que se realizam nos últimos anos continuam estimulando as soluções perversas. Isso ocorre num momento no qual as pretensões privatistas dos neoliberais encontram-se totalmente desmoralizadas. Apesar disto não são tomadas com firmeza as decisões pró-desenvolvimento econômico que a conjuntura internacional permite e exige.

Essa situação ambígua está determinando a proposta de criação de um Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) que apresenta o governo brasileiro como resposta à demanda consensual do país pela retomada do crescimento. Por um lado há um claro reconhecimento de que cabe ao Estado assumir a indução direta e indireta do crescimento econômico, assumindo ao mesmo tempo os custos sociais emergentes criados pela degradação da situação social gerada pela aplicação de políticas neoliberais nos últimos anos.

É positivo ver o esforço do governo no sentido de articular os recursos estatais para privilegiar a retomada dos investimentos em infra-estrutura, em investimentos de maior impacto tecnológico, em formação de recursos humanos e em outros investimentos capazes de gerar o crescimento econômico e o emprego.

Entretanto, é dramático ver a dificuldade do governo para enfrentar os graves problemas estruturais e macroeconômicos criados pelas políticas neoliberais. Entre estes o mais imediato e definitivo é falta de rapidez e decisão na baixa da taxa de juros absurda e antieconômica que pratica o Estado brasileiro. Estas taxas de juros existem a serviço de uma minoria que vive de renda (estimada em umas 55.000 pessoas) que recebe do Estado brasileiro cerca de 175 bilhões de reais anuais em pagamentos de juros completamente injustificáveis nem moral nem economicamente. Esses recursos equivalem a aproximadamente 10% do PIB e 30% dos gastos públicos.

A situação é ainda mais grave quando se pagam mais uns 50 bilhões de dólares em serviço da dívida externa. Estes pagamentos somados aos juros internos correspondem a aproximadamente 40% do orçamento da União. É evidente que com os 60% restantes, o Estado brasileiro não dispõe de meios para investimento, reduzido a nada, e para as políticas sociais necessárias para uma população castigada pelo desemprego e a exclusão social, existente sobretudo a partir das políticas macro econômicas recessivas.

Ao mesmo tempo, a política cambial mantém uma moeda sobre-valorizada que coloca em risco as exportações. Estas dobraram nos últimos 4 anos, permitindo formar um superávit comercial enorme que elevou as reservas do pais para 75 bilhões de dólares. Sacrificar essas exportações no momento atual é extremamente perigoso na medida em que afeta regiões inteiras do país, especializadas ( correta ou incorretamente ) em atividades exportadoras.

Como resultado dessa combinação de baixo crescimento interno (devido às altíssimas taxas de juros), do aumento dos recursos em dólares (como conseqüência do superávit comercial) e da valorização da moeda nacional (devido ao aumento das reservas do país) chegamos à grave situação na qual os capitalistas nacionais aumentaram enormemente seus investimentos no exterior. Isso produziu, pela primeira vez, um superávit das saídas de capital nacional em relação à entrada de capitais em geral. Se somarmos a isto a retirada dos lucros e pagamentos de serviço da dívida externa, vemos o grau de deformação perversa à qual chegou nossa economia, na medida em que são mantidas as políticas macroeconômicas neoliberais.

É grave, por tanto, lançar um forte programa de investimentos públicos na expectativa de investimentos privados que, nessas circunstâncias, não virão a acompanhá-los como se pretende. Na realidade, poderá conseguir-se um pequeno aumento do crescimento, mas é evidente que ainda esse resultado será sabotado pela política do Banco Central. Esta instituição é comandada por um ex-deputado do partido da oposição, ex-diretor do Banco de Boston e homem de confiança daqueles que se costuma chamar de “mercado”, que não tem nada a ver com um mercado real, pois se trata de uma minoria de pessoas sustentadas pelo Estado brasileiro ( isto é, os cidadãos que pagam impostos) em nome da contenção da inflação ou da atração de capitais do exterior.

Ora, a inflação tem caído muito por debaixo das “metas” sempre equivocadas que apresentam. E isso ocorre em conseqüência da recente rebaixa da taxa de juros que, ainda que insuficiente, foi imposta a partir de um vasto movimento de opinião pública e dos interesses eleitorais do presidente. É necessário assinalar entretanto que as rebaixas efetuadas pelo Banco Central nesse período foram muito inferiores às exigências do presidente, dos partidos do governo, da oposição ( que exige rebaixas mais significativas das taxas de juros que foram elevadas em seus governos e que continuam sendo mantidas pelos seus homens no Banco Central ), das organizações empresariais ( cada vez mais contundentes em sua desqualificação da qualidade técnica dos dirigentes do Banco Central ), das associações e colégios de economistas e profissionais em geral, da igreja, dos militares, dos agricultores, dos sindicatos e dos movimentos sociais evidentemente. Contra esta massa de competências e interesses políticos 8 sujeitos da direção do Banco Central se colocam acima de Deus e do Diabo e decidem o que lhe mandam fazer os rentistas deste pais.

Por último, deve ser considerado o verdadeiro sufoco em que se encontram as contas dos estados como conseqüência dos pagamentos de colossais juros aos que são submetidos como conseqüência das políticas monetária e fiscal conduzidas pelo Banco Central. Os governadores buscam ampliar sua participação nas receitas da União quando deveriam, em primeiro lugar, negar-se a pagar esses juros absurdos.

Resumindo, podemos afirmar que o governo não encontrará o caminho do crescimento que aspira a maior parte da população brasileira se não se livrar da “independência” do Banco Central e impor ali os princípios de uma unidade nacional incontestável a favor do abandono da política recessiva e a retomada do desenvolvimento econômico. A partir desse momento o país reencontrará os debates virtuosos sobre o conteúdo do desenvolvimento e seus beneficiários. É ridículo continuar discutindo se é ou não possível o crescimento econômico. Este é um tema para ignorantes e incompetentes, por mais que se disfarcem de grandes técnicos e economistas.

*Autor da trilogia: Teoria da Dependência: Balanço e Perspectiva, Civilização Brasileira; Rio de Janeiro; Do Terror à Esperança: Auge e Declínio do Neoliberalismo, Idéias & Letras, Aparecida, S.P.; Economia Mundial e Integración Latinoamericana, Plaza y Janés, México

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