(Publicado originalmente em Seg, 15 de Dezembro de 2008 15:05)
Artigo de FC Leite Filho
28/12/06 – 15:56 hs. – O Presidente Lula vive um drama. Ele mesmo diz que não tem dormido direito, por causa da busca penosa de tornar seu mandato, que se inicia agora em 1o. de janeiro de 2007, um pouco diferente (para melhor) do primeiro, que ele agora encerra sem marcos significativos.
Se quiser se acomodar – e grandes forças políticas e econômicas não trabalham por outra coisa -, Lula poderá justificar em seu favor os últimos 21 anos de inércia e estagnação: nenhum dos presidentes civis – Sarney, Collor, Itamar e Fernando Henrique -, nem o último general da ditadura, João Figueiredo – conseguiu romper o imobilismo dos últimos 25 anos.
Mas Lula está inquieto e quer fazer alguma coisa porque sabe que o marasmo não dura indefinidamente e na maioria das vezes propicia o caldo de cultura para os grandes temporais. Falta de crescimento, todos nós sabemos, significa desemprego em massa, queda brutal na arrecadação, falta de liquidez e conseqüente aumento da violência. Com efeito, a Argentina, não faz muito tempo, enfrentou uma borrasca que apeou do poder nada menos de três Presidentes em apenas um mês (dezembro de 2001), quando Fernando De La Rua, Adolfo Rodriguez Saá e Eduardo Camaño foram obrigados pelo povo na rua, de caçarola na mão, a desinfetar a cadeira presdiencial na Casa Rosada.
Evidentemente que o cenário hoje no Brasil é bem diferente do argentino daquela época. Mas algumas crises isoladas, como esta última dos aeroportos e os motins da marginalidade em São Paulo e agora no Rio de Janeiro, sugerem que as coisas não andam tão tranqüilas como sugerem os boletins econômicos. O tal do risco Brasil anda muito bem para os banqueiros e os grandes empresários, mas para os médios e micros e a população em geral só significa penúria.
Primeiros sintomas – Pode-se culpar o governo por algum vacilo na questão do tráfego aéreo, mas, como agora demonstra o escândalo da TAM, o problema é muito mais decorrente do modelo econômico de abertura indiscriminada e permissiva do mercado, que, para começar, provocou a quebra da Varig. Esta empresa chegou um dia a ser orgulho do Brasil no exterior, pela robustez, eficiência e modernidade com que atuava.
A nova economia bafejada pela globalização e iniciada com o governo Collor, em 1990, provocou o ingresso tumultuado no mercado aéreo, como em outros setores sacudidos pela onda das privatizações, de aventureiros sem qualquer tradição ou experiência no ramo, nem mesmo no de ganhar dinheiro.
De tão atabalhoadas e visando mais lucros do que eficiência, as novas empresas criadas por esses senhores se transformaram no maior impasse para aquilo que foi um dia o invejável sistema de transportes aéreo brasileiro. É que não há solução à vista a curto prazo para o congestionamento e a barafunda que se criou nos aeroportos, pois o problema é estrutural e não depende mais do governo, que exauriu sua capacidade de atuar.
Fator energia – Mas este é apenas um dos problemas causados pelo modelo econômico concentrador, o qual, juntamente com o político, retrógrado e corrupto, engessa e petrifica o governo e as outras instituições, principalmente o Congresso eo Judiciário.
Assim é que o problemas mais graves e de repercussão bem mais funda poderão advir em futuro não tão longínquo. É o caso da energia elétrica, por exemplo, que poderá rebentar ao mínimo esforço de crescimento da economia.
Um ou dois pontos percentuais de melhora no PIB, e estaremos condenados ao apagão, agora, apagão, literalmente, falando, aquele que fez sua primeira estréia em fins da era FHC. Por que isso ocorre? Porque, depois da privatização do sistema elétrico, as empresas responsáveis se recusaram a investir no setor, agora sucateado.
É aqui onde reside o principal calcanhar de aquiles do Presidente, que chegou a cogitar em promover um crescimento de 5% para 2007, superando os patéticos 2,7% de 2006. Lula chegou a anunciar um pacote específico mas teve de adiá-lo duas vezes por causa dos impasses que tal meta implicaria.
É do ex-ministro Delfim Netto, um de seus principais conselheiros informais a seguinte constatação: “Não adianta imaginar que os empresários vão investir se não houver segurança de oferta de energia para os próximos dez anos”. Delfim, que falava numa entrevista à Carta Capital , no. 425, de 27/12/06, ainda alertou para outros dois problemas de infraestrutrura que impede o nosso desenvolvimento: “Quando o produto sai da fábrica, cai no primeiro buraco da estrada. Quando chega no porto, espera não sei quanto tempo”. O ex-ministro dos governos militares, quando o regime se orgulhava de crescer a 7 por cento ao ano (mas sem distribuição de renda e inclusão social), ainda chama a atenção para o fato de que “o Brasil consumiu toda a infra-estrutua nos últimos 25 anos”.
Visão histórica – Calma lá, porque nem tudo está perdido, mas a saída dependerá do descortino do estadista diante das grandes crises. Para não ir mais longe, tomemos o exemplo de Juscelino Kubitsheck, que governou entre 1956 e 1961. JK, que encontrou um cenário não muito diferente do hoje enfrentado por Lula, jogou todo o engessamento para o alto e passou a governar por métodos alternativos e altamente arojados.
Foi quando ele criou a Sudene, a Novacap e outras agências de desenvolvimento (não confundir aqui com as nossas atuais e ineficazes agências reguladoras) para abrir estradas, desbravar o Brasil construindo Brasília, hidrelétricas, fábricas de automóveis, sem se importar se isso aumentaria a inflação ou se provocasse déficit em nossas contas.
Lula já deu um passo mínimo nesta direção, ao mandar pastar sua equipe econômica, que defendia um reajuste ridículo para o mínimo, e impôs um salário-mínimo de R$ 380,00 a vigorar em 1o.de abril. A decisão pode indicar um avanço para os futuros atos do Presidente, cuja política externa independente e voltada para a integração com a América Latina pode ser um fator positivo na sua meta de crescimento, na medida que o ajuda a desvencilhar-se da camisa de força do FMI. Quando menos, a construção da Refinaria de Pernambuco e do Gasoduto do Sul, partindo da Venuezuela, entrando pelo Brasil e terminando na Argentina, poderá constituir uma grande alavanca para dinamizar nossa infra-estrutura.
É claro que tal postura implica grandes resistências de setores poderosos, a começar da mídia, que abriu guerra contra ele na última eleição presidencial. E ela parece não lhe dar tréguas, a julgar pelas críticas despejadas sobre seu governo, em função da crise nos aeroportos, que a oposição muito espertamente apelidou de “apagão aéreo”. Mas JK também sofreu, e como, os ataques mais cruéis da então chamada grande imprensa e conseguiu, não só enfrentar a tempestade, como governar com brilhantimso e entrar para a hisória como um dos Presdientes mais realizadores da República. Talvez pensando a la JK é que Lula tem dito a alguns de seus interlocutores: “Quem me elegeu foi o povo, apesar de toda a campanha suja da mídia”. É preciso ir em frente, Lula, senão te trituram na primeira esquina.