Por Reynaldo Domingos Ferreira
Não é de fácil convencimento a abordagem, na literatura ou no cinema, da questão do altruísmo cristão, como o pretendeu o cineasta Pablo Trapero, em Elefante Branco (Elefante Blanco), selecionado para a mostra Un Certain Régard do Festival de Cannes deste ano, apesar de contar com a colaboração de dois excepcionais intérpretes: Ricardo Darín e Jérémie Renier, que estão bem, mas não em seus melhores momentos.
Seus papéis são os de dois padres, Julián e Nicolá, mergulhados no inferno de uma favela – Villa Virgen – na periferia de Buenos Aires, de 15 mil habitantes, dominada pelo narcotráfico, uma horrenda mazela social que a Argentina não faz questão de divulgar.
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A vila se formou, desde a década de trinta, em torno do esqueleto de um edifício destinado a abrigar um hospital que, segundo a idealização de seu construtor, Alfredo Palácios, deveria ser o maior da América Latina. Na atualidade, residem nele perto de 300 famílias em condições deploráveis.
Os sacerdotes, originários de famílias ricas da França, que, em outros tempos, foram colegas no seminário – um tendo sido confessor do outro -, querem atenuar os problemas da gente pobre que os cerca. Acontece, porém, que, ante a sua inábil atuação, eles contrariam não só os traficantes, como também a Igreja, cuja cúpula representativa se mostra conivente com a corrupta ação policial na localidade.
Trapero (Abutres), também um dos autores do roteiro – que são quatro ou cinco -, abarca variados temas paralelos, como: a campanha pela canonização do padre Carlos Mugica, criador da primeira capela na comunidade; um projeto imobiliário de construção de vivendas, tocado pelo bispado; o abalo da fé de Julián ante a percepção da inutilidade de sua luta e, além disso, os tormentos da carne de Nicolá, causados por uma assistente social, Luciana (Martina Gusman).O resultado previsível não poderia ser outro senão o da superficialidade com que todos os assuntos são tratados. E, pior, com certo sabor de falsidade. Do lado do roteiro, portanto, é isso o que se tem.
Mas, do lado da direção, o trabalho de Trapero é, sem dúvida, mais elogiável, principalmente pelos recursos de linguagem que ele usa com muita propriedade. Note-se, por exemplo, a constância com que ele capta, pela excelente fotografia de Guillermo Nieto, cenas em plano-sequência de eficiente efeito dramático, como a da chegada dos dois religiosos à favela, em que, pelo deslocar da embarcação, que os traz, se descortina, em impressionante quadro panorâmico, a miséria do lugar.
Ao tomar ciência, no prólogo, por exame de ressonância magnética, de ser portador de uma doença terminal, o padre Julián vai à procura de seu ex-colega Nicolá, que se encontra gravemente ferido num vilarejo, na Amazônia. Ele sobrevivera a uma chacina perpetrada por policiais contra colonos, moradores de um ajuntamento de cabanas no meio da floresta, sem que lhes pudesse prestar qualquer ajuda .
Muito debilitado, física e moralmente, Nicolá, sem saber da situação verdadeira de Julián, aceita seu convite para se integrar à vida de Villa Virgen. Na essência, portanto, o argumento do pouco convincente filme de Trapero se centraliza na tentativa do padre Nicolá de moldar a sua alma às difíceis condições locais. Os dois intérpretes dos protagonistas, como já foi dito, estão razoavelmente bem. Ao que se evidencia, contudo, Jéremie Renier se entregou mais à sua personagem do que Darín, que continuou , a todo tempo, sendo ele mesmo.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TECNICA
ELEFANTE BRANCO
ELEFANTE BLANCO
Argentina, Espanha, Bélgica – 2012
Duração – 107 minutos
Direção – Pablo Trapero
Roteiro – Pablo Trapero, Alejandro Fadel, Martin Maurequi e Santiago Mitri
Produção –Alejandro Cacetta, Pablo Trapero, Juan Pablo Galli e Juan Vera
Fotografia –Guillermo Nieto
Trilha Sonora –Michael Nyman
Edição – Andrés P.Estrada e Pablo Trapero
Elenco – Ricardo Darín (Julián), Jérémie Renier (Nicolá), Martina Gusman (Luciana), Pablo Gatti (Sandoval), Susana Varela (Carmelita), Raul Ramos (Bispo)