O politólogo brasileiro Moniz Bandeira, baseado na Alemanha, denuncia que “os Estados Unidos promovem operações de guerra por meio da mídia nacional e internacional e outros métodos, através de ONG (Organizações não governamentais), como façade (fachada) para promover a política de regime change sem golpe de Estado contra os presidentes progressistas da América Latina.
Moniz, que em videoentrevista (clique aqui) anterior a este blog pelo Skype, havia reivindicado o registro e monitoramento dessas ONGs pelo ministério da Justiça do Brasil, citou nominalmente as ONGs NED (National Endowment for Democracy), e entidades civis, como Freedom House, o Open Society Institute (renomeado a USAID, Open Society Foundations [OSF] em 2011), como indutoras dessas operações de midiáticas contra os presidentes Dilma Rousseff, do Brasil, Cristina Kirchner, da Argentina, Evo Morales, da Bolívia, Rafael Correa, do Equador, José Mujica, do Uruguai, e Daniel Ortega, da Nicarágua.
Autor de 20 livros sobre a inrtervenção dos americanos em nossa política externa, Moniz Bandiera, que lançará mais dois livros nos próximos dias, na feira de Frankfurt (31/08/13) ampliando o mesmo tema, assegura que a Open Society Foundations, a NED e a USAID já financiaram alguns movimentos e certos veículos da mídia, encorajando a denúncia de fraudes reais ou não nas eleições de vários países, como Sérvia, Geórgia e Ucrânia – nos quais encorajaram “nonviolent revolutions”, levando a oposição às ruas, por meio de ativistas, muitas vezes remunerados em manifestações contra o governo.
Segundo o politólogo, o livro básico para a formação desses ativistas é From Dictatorship to Democracy, do professor do Gene Sharp, que ensina como intervir em eleições estrangeiras sob a máscara de interesse imparcial. Segundo ele explica, a luta não violenta é travada por vários meios, tais como a guerra psicológica, social, econômica e política, aplicados pela população e pelas instituições da sociedade. Tais meios são, e.g., protestos, greves, não cooperação, deslealdade, boicotes, marchas, desfiles de automóveis, procissões etc.
“É o modelo do pós-moderno coup d’etat patrocinado Estados Unidos, adaptado às condições pós-comunismo, uma forma de “cold war revolutionary”, conforme definiu o coronel David Galula as atividades subversivas desenvolvidas dentro da legalidade. Aliás, já nos anos 1980, William Colby (1920-1996), então diretor da CIA, declarou que muitas operações, antes conduzidas de forma encoberta (covert actions) pela CIA, poderiam doravante ser realizadas pelas ONGs (um terço das cem maiores estava baseado nos Estados Unidos), abertamente e sem questionamento”.
A seguir, a
Entrevista ao Portal do PT
Moniz Bandeira concedeu neste final de semana, por e-mail, uma entrevista ao Portal do PT onde ele analisa os 40 anos do golpe militar no Chile que derrubou o presidente Salvador Allende, as manifestações de junho ocorridas no Brasil e fala também sobre o seu novo livro A Segunda Guerra Fria – Geopolítica e Dimensão Estratégica dos Estados Unidos (Das rebeliões na Eurásia à África do Norte e Oriente Médio).
Confira a íntegra abaixo:
No próximo dia 11 de setembro, o golpe de Estado contra o presidente Salvador Allende completará 40 anos. Quais são, na sua opinião, as reflexões que devemos fazer nesta data, que nos sejam úteis na atual conjuntura latinoamericana e mundial?
A principal reflexão que se pode tirar da tragédia do Chile é a de que não se pode cobrar da história uma fatura que ainda não venceu. Marx expôs, no prefácio de Zur Kritik der Politschen Ökonomie, que os resultados de suas pesquisas mostraram que uma formação social nunca desmorona sem que as forças produtivas dentro dela estejam suficientemente desenvolvidas, e que as novas relações de produção superiores jamais aparecem, no lugar, antes de que as condições materiais de sua existência sejam incubadas nas entranhas da própria sociedade antiga. E essa não era a situação do Chile, um país cuja economia se baseava fundamente na exploração do cobre, que dependia do mercado mundial, sob a regência do sistema capitalista. Nem Marx nem Engels nem Lenin jamais conceberam o socialismo como via de desenvolvimento ou modelo alternativo para o capitalismo, o único modo de produção que se expandiu globalmente. Logo na primeira parte do Manifesto Comunista, de 1848, Marx e Engels salientaram que a indústria havia criado o mercado mundial, mediante o qual burguesia deu um caráter cosmopolita à produção e ao consumo de todos os países, retirando da indústria sua base nacional. As antigas indústrias nacionais – salientaram Marx e Engels- foram destruídas ou estavam sendo cotidianamente destruídas ou suplantadas por novas indústrias, cuja introdução se convertia em questão vital para as nações civilizadas, por indústrias que não mais empregavam matérias primas domésticas, e sim matérias primas oriundas de distantes regiões, e seus produtos não só eram consumidos no próprio país, porém, ao mesmo tempo, em todas as partes do mundo. Essa lição mostrava a inviabilidade projeto socialista da União Popular, ademais dentro do contexto do Conflito Leste-Oeste, em que a CIA efetuava uma terrível guerra psicológica, visando a aterrorizar o povo e fraturar ainda mais a sociedade chilena. Se o presidente João Goulart, cujas reformas pretendidas tinham apenas caráter reformista e nacional-desenvolvimentistas, os Estados Unidos não toleraram e trataram de derrubar seu governo, é evidente que fariam o mesmo ou mais contra o governo do presidente Salvador Allende, que se alinhara com Cuba e a União Soviética.
Ainda sobre o Chile, a experiência do governo da Unidade Popular parece ter antecipado alguns dos dilemas estratégicos enfrentados, hoje, por várias governos progressistas e de esquerda latinoamericanos. Na sua opinião, o que aquela experiência tem de atual, para os partidos de esquerda que dirigem ou participam de governos eleitos em nossa região?
A situação atual é muito diferente da que existia nos anos 1960, quando os Estados Unidos sustentaram e encorajaram o golpe militar no Brasil – e 1970-1973. Àquele tempo, quando promoviam o ignominioso golpe no Chile, estavam a perder a Guerra do Vietnã. Todo seu poderio militar não bastou para dar-lhes a vitória sobre forças que viviam no seu próprio habitat, na mais perfeita simbiose com a natureza e sobreviviam nas condições mais primitivas, combatiam extremamente bem, com eficiência e recebiam o mais amplo suporte da população, em todos os lugarejos do Vietnã do Sul. E, desde 2001-2003, os Estados Unidos estão chafurdados nas guerras no Afeganistão e no Iraque, onde os ataques e atentados terroristas mais do que se intensificaram e quadruplicaram e dos quais não conseguem retirar totalmente suas tropas. E os Estados Unidos, chafurdados ainda em profunda crise econômica, tornaram-se uma super-potência dependente. Dependem de tudo, inclusive de capitais e financiamentos, que foram possibilitados pela compra de bonus do Tesouro americano pela China, Brasil e outros países. Como bem observaram Bill Bonner e Addison Wigging, “a nação mais rica, mais poderosa do mundo, depende das poupanças dos países mais pobres”. O poderio militar dos Estados Unidos defronta-se, portanto, com severos limites econômicos e financeiros. Mas Washington, quer seja George W. Bush ou Barack Obama o presidente, jamais tolerou, videntemente os governos progressistas que emergiram na América do Sul, contra os quais promovem operações de guerra por meio da mídia nacional e internacional e outros métodos, através de ONGs, financiadas pela NED (National Endowment for Democracy), e entidades civis, como Freedom House, o Open Society Institute (renomeado a USAID, Open Society Foundations [OSF] em 2011), e outras organizações não governamentais, como façade para promover a política de regime change sem golpe de Estado. A Open Society Foundations, a NED e a USAID financiaram alguns movimentos e certos veículos da mídia, encorajando a denúncia de fraudes reais ou não nas eleições de vários países, como Sérvia, Geórgia e Ucrânia – nos quais encorajaram “nonviolent revolutions”, levando a oposição às ruas, por meio de ativistas, muitas vezes remunerados em manifestações contra o governo. O livro básico para a formação desses ativistas é From Dictatorship to Democracy, do professor do Gene Sharp, que ensina como intervir em eleições estrangeiras sob a máscara de interesse imparcial. Segundo ele explica a luta não violenta é travada por vários meios, tais como a guerra psicológica, social, econômica e política, aplicados pela população e pelas instituições da sociedade. Tais meios são, e.g., protestos, greves, não cooperação, deslealdade, boicotes, marchas, desfiles de automóveis, procissões etc. É o modelo do pós-moderno coup d’etat patrocinado Estados Unidos, adaptado às condições pós-comunismo, uma forma de “cold war revolutionary”, conforme definiu o coronel David Galula as atividades subversivas desenvolvidas dentro da legalidade. Aliás, já nos anos 1980, William Colby (1920-1996), então diretor da CIA, declarou que muitas operações, antes conduzidas de forma encoberta (covert actions) pela CIA, poderiam doravante ser realizadas pelas ONGs (um terço das cem maiores estava baseado nos Estados Unidos), abertamente e sem questionamento.
Seguindo na mesma toada, como você avaliou os eventos de junho no Brasil e em que medida isto se conecta com as dificuldades vividas, não apenas no Brasil, pelos governos progressistas e de esquerda?
Desde o início, vi os eventos de junho com suspeita. O Brasil não está a sofrer grave crise econômica e social. As contas públicas não estão insolventes Não há risco de default, de um calote na dívida interna e externa. Pelo contrário. O balanço de pagamentos não está em crise. Entretanto, enquanto o governo passou a enfrentar enorme dificuldade para conter a ameaça inflacionária, ocorreu forte desvalorização do real frente ao dólar, provocada, em larga medida pela expectativa de mudança da política monetária americana, e pelo fato de que o real se valorizara mais do que as outras moedas em 2008. No entanto, ao mesmo tempo em que o ataque especulativo aproveitava tais circunstâncias, ocorreram, simultaneamente, manifestações de protestos, chegando até mesmo à violência, em diversas cidades, sobretudo Rio de Janeiro e São Paulo. Os motivos existem, são muito antigos; são problemas antigos, de várias décadas, gerados, em parte, durante o regime militar, e agravados com o neoliberalismo, que incentivou ainda mais a privatização como, e.g., da saúde e educação, pelos governo de Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso. Causas reais, inegavelmente, havia. Porém, foram largamente ultrapassadas pela intensidade e continuidade das manifestações, que buscaram desmoralizar as instituições, os governos e o país, prejudicando sua economia e imagem no exterior. Se possivelmente elas foram (em parte) espontâneas, não se pode desconsiderar que houve e há uma tentativa de solapar a estabilidade e a força econômica, política e militar, sem recorrer ao uso da força, provocando violentas medidas, a serem denunciadas como truculência do governo. A divulgação de informações falsas ou verdadeiras, através da mídia nacional e internacional, teve como objetivo solapar a credibilidade e a confiança não somente no governo como no Brasil.
Quem leu e conhece a doutrina que o general Collin Powel estabeleceu, em 1992, como chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (The Military Strategy of the United States. US Government, Printing Office, ISBN 0-16-036125-7, 1992, p 7), que os Estados Unidos, após o colapso da União Soviética, tratariam de preservar sua “credible capability to forestall any potential adversary from competing militarily”, impedindo a União Européia de tornar-se potência militar, fora da OTAN, a remilitarização do Japão e da Rússia, e desencorajando qualquer desafio à sua preponderância ou tentativa de reverter a ordem econômica e política internacionalmente instituída, deviam sonsistir tão somente em manter uma capacidade militar necessária para auto-defesa, combater o narco-tráfico e exercer atividades policiais. Os Estados Unidos empenham-se, naturalmente, em criar as maiores dificuldades para o Brasil na medida em que ele se encaminha para tornar-se uma potência global e forma com a China e Índia um grupo de resistência à sua full-fledged dominance.
Finalmente, voce está lançando um novo livro: A Segunda Guerra Fria – Geopolítica e Dimensão Estratégica dos Estados Unidos (Das rebeliões na Eurásia à África do Norte e Oriente Médio). Falemos dele.
Esse novo livro – A Segunda Guerra Fria – Geopolítica e Dimensão Estratégica dos Estados Unidos (Das rebeliões na Eurásia à África do Norte e Oriente Médio) – aprofunda, desdobra e atualiza minha outra obra – Formação do Império Americano – que este ano foi lançada na China e, em 2011, em Cuba. Nele, tratei de demonstrar, com documentos e informações, procedentes das mais variadas fontes, que as chamadas “revoluções coloridas”, na Sérvia, Ucrânia, Georgia e em outras repúblicas da extinta União Soviética, bem como nos países da África do Norte e Oriente Médio – comemoradas como Primavera Árabe – não foram nem espontâneas, ainda que condições domésticas houvesse para que elas ocorressem, nem democráticas. O papel dos Estados Unidos, assim como da França e da Grã-Bretanha, foi fundamental na promoção da agitação e da subversão, por meio do envio de armas e de pessoal, direta ou indiretamente, através do Qatar e da Arábia Saudita. Além das intervenções da OTAN, abertas, como no caso da Líbia, ou veladas, as organizações não governamentais (ONGs) e dissidentes ativistas treinados pela Middle East Partnership Initiative (MEPI), como parte da “freedom agenda”, constituíram uma das armas empregadas para promover a “political warfare”, mobilizando multidões, com o pretexto de fomentar o desenvolvimento da democracia, o que significava regime change, i.e., subverter governos e instalar regimes favoráveis aos investimentos e interesses estratégicos do cartel ultra-imperialista, formado pelos Estados Unidos e seus aliados da União Européia, contrapondo-se ao advento da China e à recuperação da Rússia, sob a direção do presidente Vladimir Putin. Os brasileiros devem estar atentos para que a possibilidade de que os interesses imperiais também não tentem fragmentar o Brasil como parece ser o objetivo de redesenhar o Oriente Médio e, de certo modo, fragmentar partes da China (Xinjiang) e da Rússia (Tchetchênia e outras regiões).
As ameaças existem, conquanto possam parecer remotas. Como várias vezes adverti, o perigo que representa uma grande potência, tecnologicamente superior, mas com enormes carências, sobretudo de energia, pode ser muito maior, quando ela está a perder a preeminência, e quer mantê-la, do que quando expande seu império. Ela respeita a lei internacional, senão entre as potências cujas forças se equilibram. Neste momento estou indignado com a armação que os Estados Unidos e os chamado rebeldes armaram para a intervenção na Síria. Crianças não constituem alvo militar. Crianças atacadas com gás tóxico só servem para efeito de propaganda contra o regime, através da exibição de videos pela mídia, ecoando e endossando as acusações da guerra psicológica. É preciso denunciar isto em alto e bom som. Pode usar minhas palavras. Trata-se de outra trágica encenação armada pelos salafista-al-Qa’ida-Estados Unidos e seus aliados ocidentais.
(Portal do PT, com informações do Página 13)