Na Venezuela, houve três mortos e 61 feridos. Também incendiaram e destroçaram estações do metrô, universidades, ministérios, praças, creches e postos de saúde. O quadro levou o presidente Nicolás Maduro a acusar “um golpe em marcha”.
Na Argentina, a presidenta Cristina Kirchner viu-se sob um ataque para “levar o país pelos ares”. A manobra, segundo ela, tramada na Bolsa de Nova York, partiria da desestabilização da moeda, com o fim de elevar o dólar de 12 para 40 pesos, como trombeteou o ex-ministro das privatizações Domingos Cavallo.
A persistência de manifestações violentas nas ruas venezuelanas, que se sucedem diariamente desde 12 de fevereiro, sugerem um cenário sírio ou ucraniano, pronto a desencadear uma guerra civil naquele país de nossa fronteira norte. Da mesma forma, a sucessão de arremetidas sobre o atual governo argentino dá a impressão de colapso próximo.
Mas o panorama é hoje diferente nestas plagas, graças ao esquema geopolítico e militar, armado pelo falecido presidente Hugo Chávez, há 15 anos. Ele conseguiu unir os emergentes de todo o mundo, do Irã, passando pela Rússia, China e os vizinhos latino-americanos. Tal esquema de intercâmbio e ajuda mútua, dá fôlego a Cristina Kirchner de, em menos de 10 dias, domar um dos maiores ataques cambiais da história argentina, e a Maduro de derrotar as várias conspirações que têm surgido nestes seus 11 meses de mandato.
Como das vezes anteriores, os atentados na Venezuela e na Argentina, tendem a fracassar, porque esbarram na liderança e na força da autoridade de líderes legítimos como Maduro e Cristina, forjados na luta de seus povos e não nos laboratórios de Chicago nem pelos holofotes da mídia.
Também os tempos são outros, porque ambos os presidentes contam com o respaldo da política de integração dos presidentes latino-americanos e caribenhos, que já desbaratou situações ainda mais conflitivas como o golpe contra Hugo Chávez, em 2002, e o lockout dos ruralistas que deixaram os argentinos à beira do desabastecimento, em 2008. Em outras épocas, como as de Allende (1973), no Chile, e Goulart (1964), no Brasil, os presidentes de nossos países então isolados e vivendo de costas uns para outros, os dois mandatários teriam os dias contados.
Tudo indica, porém, que os tumultos vão continuar, por serem muitos os interesses contrariados por essa estratégia de aproximação entre os países vizinhos.
Imaginem todas essas empresas transnacionais, que antes tinham o privilégio exclusivo de tocar obras de infra-estrutura, sempre molhando a mão de funcionários e associados nacionais, terem de competir com construtoras brasileiras, argentinas, além de mandar e desmandar na política e na economia, fazendo todo tipo de chantagem e de ataque especulativo. Ou alguém imagina que a grita pela reforma do Porto de Mariel, de Cuba, pela brasileira Odebrecht, deve-se a uma simples questão ideológica?
Como estas transnacionais, aqui incluídos bancos, construtoras, telefônicas, agências de fomentos, fundações e ONGs norte-americanas e europeias, são as grandes patrocinadoras da mídia, tanto nacional como internacional, elas podem distorcer os fatos e ludibriar uma parcela considerável mas nem sempre decisiva das populações. Todo dia a gente ouve no rádio ou na TV, por exemplo, que a Venezuela e a Argentina estão à beira do colapso, por praticar, segundo a versão dominante, uma política econômica e social fora da realidade ditada pelos mercados.
Mas há 15 anos que o venezuelano deixou de ser um povo faminto, analfabeto e desassistido na sua saúde. Por seu lado, a Argentina sobreviveu ao colapso neoliberal de 2001 e, durante o período dos Kirchner (Néstor e Cristina), iniciado em 2003, deu uma arrancada econômica, propiciando os melhores índices de desenvolvimento humano do continente.
Fixemo-nos em apenas dois exemplos de progresso social hoje apresentados por Maduro e Cristina: os salários são os melhores da região e seus estudantes de escola pública têm cada qual um laptop gratuito para assistir às aulas e fazer os deveres de casa, tudo via internet, coisa que até os americanos estão longe de sonhar.
Nicolás Maduro ainda se debate com os tumultos de rua comandados por provocadores que se infiltram nas manifestações de grupos isolados de estudantes, sem qualquer participação das massas populares e muito menos estudantil. Como mostram as cenas de vandalismo e crueldade, incendiando creches infantis, como os Simonzitos, postos de saúde, escolas públicas, estações do metrô, TVs estatais e outras obras inauguradas por Chávez, tais manifestantes estão isolados.
Canciller Jaua denunció injerencia directa del… por Globovision
Não contam sequer com respaldo da própria oposição, hoje dividida entra as lideranças que preferem a via institucional, aparente postura do ex-candidato presidencial Henrique CApriles, e a ala extremista pró-guerra civil, esta comandada por Leopoldo López, ligado ao ex-presidente da Colômbica, Álvaro Uribe, e sobre quem pesa um mandado de prisão, por parte do ministério público.
Igualmente, Cristina Kirchner sabe que seu governo será sacudido por outras crises fabricadas. Mas ela demonstra está no comando.Na verdade, a explosão do dólar, em meados deste mês, sugeria o desmoronamento do governo. Não para quem conhece o punho de ferro da frágil viúva de Néstor Kirchner e seus enfrentamentos anteriores com o golpismo permanente ali instalado, e suas diversas investidas, como a instituição da lei de mídia e a queda de braço com o Banco Central para o uso das reservas cambiais.Pouco mais de uma semana depois do ataque especulativo que fez o dólar subir a quase 15 pesos no mercado negro, a moeda americana já arrefecia e, na sexta-feira, 14/02/14, recuava para 11,90, no paralelo, e 7,80 no oficial.
Estados Unidos – O que tem de novo nos episódios desses dias é que o papel dos Estados Unidos, notadamente no caso venezuelano, foi mais explícito que nas arremetidas anteriores contra Chávez e o próprio Maduro. O Embaixador da Venezuela na OEA, Roy Chaderton, baseado em Washington, onde está localizada a sede do velho organismo, foi chamado ao telefone pelo subsecretário de Estado para a América do Sul, Alex Leed, com o objetivo de passar alguns recados, conforme denunciou o presidente Nicolás Maduro em rede nacional de TV.
Entre os recados estaria a ordem de não prender o líder opositor Leopoldo López, foragido desde a semana passada, libertar os manifestantes presos, que o governo venezuelano diz não ser estudantes, mas provocadores em cima de motos de alta cilindrada, portando armas e até colete à prova de bala, e uma imediata negociação – ou não seria rendição? – com os líderes dos ataques vandálicos. Os recados foram acompanhados da observação de que enfrentariam sérios problemas no caso de não serem seguidos.
Diplomatas expulsos – O presidente da Venezuela ainda denunciou o envolvimento direto da embaixada norte-americana nos atentados e por isso decidiu expulsar três diplomatas acreditados no país: Breean Marie Mc Cusker, segunda secretária que exerce as funções de vice-cônsul na Venezuela, o cidadão Jeffrey Gordon Elsen, segundo secretário da embaixada dos Estados Unidos em Caracas, que exerce igualmente como vice-cônsul, e Kristopher Lee Clark, segundo secretário.
“Hoje, o monstro decidiu atuar e mostrar o rosto. Isso é um sinal de que detrás do que vivemos está o império que quer atacar a pátria. São exigências inaceitáveis e insolentes”, disse Maduro, acrescentando que os Estados Unidos solicitaram que o pedido de prisão de López fosse retirado.
Maduro ainda informou que vai conversar com presidentes latino-americanos nesta segunda-feira (17) para fazer uma “campanha de denúncia” das ameaças do governo norte-americano. Ele disse que pedirá que a União das Nações Sul-Americanas (Unasul) interfira no caso.
Ajuda financeira e logística – Os Estados Unidos desmentiram as denúncias de Maduro, dizendo que “as acusações de que o país ajuda a organizar as manifestações na Venezuela são falsas e sem sustentação” , como declarou a porta-voz do Departamento de Estado, Jen Psaki.
Não obstante, o chanceler venezuelano Elias Jaua, ao anunciar formalmente, esta tarde, a expulsão dos três diplomatas, revelou um email, datado de 2009 e, enviado pela embaixada em Caracas ao Departamento de Estado, no qual especifica a ajuda financeira a grupos ativistas juvenis venezuelanos:
“Através da USAID”, diz o email lido pelo chanceler, “apoiamos 30 organizações civis venezuelanas, com apoio técnico, construção de capacidades, conectando-os entre si e com o o movimento internacional,e com apoio financeiro, que este ano somou 30 milhões de dólares”.
Fundamentos da integração – Para entender esse novo contexto, é necessário remontar no tempo, mais exatamente, em 1998, quando o tenente-coronel reformado Hugo Chávez, se dizendo hijo do libertador Simão Bolívar, elege-se presidente dos venezuelanos e inicia uma cruzada de aproximação dos povos do Sul, ou seja os países emergentes, historicamente dominados e espoliados pelos do Norte, onde se situam as grandes potências – Estados Unidos, Alemanha, França, Inglaterra. Chávez, que não era homem só de discursos, que os fazia muito bem, passou quase 14 anos no Palácio Miraflores, para percorrer aqueles países, entre os quais se incluem os maiores produtores de petróleo.
Ele tinha um plano traçado, que começou com uma aliança estratégica com a Cuba de Fidel Castro e o revigoramento da OPEP, Organização dos Países Produtores do Petróleo, que se encontrava praticamente desativada, depois da crise petrolífera de 1973. Com Fidel, lançou as bases para o derrocamento da ALCA, aliança para perpetuar o neoliberalismo, numa cúpula das Américas, em 2005, na Argentina e a contratação de professores e médicos e técnicos, para atacar o analfabetismo e a desnutrição e recuperar a infra-estrutura, inclusive militar, da depauperada Venezuela.
Na reconstrução da OPEP, Hugo Chávez procurou até Saddam Husssein, ainda presidente do Iraque, mas muito debilitado pela primeira invasão militar americana e satanizado pela potente mídia americana. Foi também ao encontro pessoal dos dirigentes do Irã, Kweit e Arábia Saudita, sem se preocupar com a ideologia e as alianças de seus governantes. Em 2001, já consegue fazer a primeira reunião de cúpula da OPEP, em Caracas, no ano 2000, da qual sai presidente. De lá para cá, o petróleo, que estava em oito dólares o barril foi avançando até chegar ao pico de quase 150 dólares, em 2008, para depois estabilizar-se no atual patamar de 100 dólares.
Paralelamente, ele procurou uma aliança com a Rússia, também grande produtora de petróleo e de armamentos, que lhe propiciou modernizar suas sucateadas forças militares até transformá-las em das maiores e mais adestradas da região. Chávez sabia que, sem um bom Exército, seria presa fácil de uma invasão dos Estados Unidos. Outro país-chave par o seu esquema foi a China, país sedento de petróleo e de alimentos, com uma população de 1,3 bilhão de habitantes, mas que também esbanjava tecnologia e poder de compra. Era seu plano diversificar as exportações de petróleo, produto do qual a Venezuela acabou se tornando detentor da maior reserva mundial, antes exclusivamente voltadas para os Estados Unidos. A China compra hoje quase a metade da produção venezuelana e em troca, ofereceu vultosos empréstimos, sem os quais, o regime chavista dificilmente sobreviveria à queda do barril, que despencou de 150 para 30 dólares, e tecnologia para construir, juntamente com empresas brasileiras, argentinas e colombianas, pontes, casas populares, sat.élites etc.
Foi, porém, no engajamento da população em seu projeto, que Hugo Chávez concentrou seus esforços. Ele dizia que nada poderia fazer sem o apoio orgânico da maioria esmagadora de seus compatriotas. Com este propósito, liderava manifestações, sobretudo quando estava diante das sabotagens patrocinadas pelos Estados Unidos, como no Golpe Midiático de 2002 e o chamado paro petrolero de 2003, além de convocar quase uma eleição nacional por ano.
Gravemente enfermo nos dois últimos anos de seus três mandatos (1999 a 2013), ele cuidou de preparar sua sucessão, primeiro indicando o chanceler e ex-maquinista de metrô Nicolás Maduro como seu sucessor e 11 militares para a governança dos Estados mais importantes do país. Qando morreu, há menos de um ano (cinco de março de 2013), Chávez já tinha deixado pronta sua obra integração, pela qual respondiam a Unasul (União das Nações Sul-Americanas) e a CELAC (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), instituições super azeitadas, inclusive contra golpes de Estado, que substituíram a carcomida OEA, dominada pelos Estados Unidos.
É por isso que tanto Maduro como Cristina, conseguem desbaratar o golpismo com medidas duras, claro, mas dentro da lei, no que demonstram estar em controle do respectivo país e da situação.